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Cronicas-->Uma rede -- 14/11/2003 - 23:14 (Athos Ronaldo Miralha da Cunha) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


Uma rede na varanda (2º lugar no 8º Concurso da Fundação Cultural de Canoas)
Athos Ronaldo Miralha da Cunha

Nas tardes distraídas e indolentes é a saudade que se aproxima de mansinho. As horas ficam lentas enquanto o dia amadurece e nos embriaga com desassossegos. O chimarrão, a cuia e a chaleira não conseguem exprimir, em sua magnitude, o tamanho do sentimento quando o sol se põe por detrás de uma coxilha.
Por muitos anos, antes de o sol anoitecer, nós saboreávamos o chimarrão e, ainda hoje, enquanto a água esquenta calmamente, sofro por matear com as ausências dos velhos.
Meu velho contava histórias com os olhos no fundo da cuia como se a infància estivesse tão presente. Histórias que, na maioria das vezes, eu já conhecia, mas sempre ouvia com atenção. Minha mãe lidava na cozinha, fazia ambrosia e chimarreava conosco.
Faz tempo que eles partiram. Foram quietos e serenos deixando um rastro de saudade.
Não cevo os mates iguais aos do velho e não anotei a receita da ambrosia. São os afazeres do dia que a vida nos impõe, a ausência nos cobra e somos tomados por sentimento de culpa.
As horas passavam inocentes e os assuntos varavam na serenidade do ambiente e no tranquilo compasso da rede. Sorvíamos o chimarrão ao sabor do tempo. O verde amargo da cuia acalentava meus sonhos utópicos e imperfeitos. Naqueles momentos sublimes eu remoia minhas modestas recordações. Naquela parceria campeira, um servia o chimarrão do outro.
- Chegó. - era a palavra que finalizava o chimarrão, a tarde e o dia.
Hoje, minha varanda se enche de incompletude e tristeza. A rede balança, valsando com o vento que vem do pomar. Esse vento acaricia as cortinas e traz desgostos envoltos em melancólicos remansos no aconchego da solidão.
E como dói a saudade quando o sol adormece com a imagem nítida de quem já se foi.
Mesmo assim sigo mateando...
No exato momento em que o sol não brilha tanto quanto as antigas horas lentas com os velhos, eu repasso meus dias e meu tempo no templo verde da cuia.
Vez por outra meu piá chimarreia comigo e uma ponta de esperança desfralda outros sentimentos, pois é nesse momento que me comovo. Sou eu o pai que brinda e celebra o sol poente com o filho. E sinto que em algum dia também serei nacos de saudade quando soprar o vento sul contando histórias de outras modernidades nos dias de outros invernos.
No silêncio dos mates quietos, silencio. Na noite que se aproxima enluarada, silencio. Diante da rústica cuia, silencio. É nesse instante que uma brisa penetra pela janela, sem pedir licença, e me derruba uma lágrima sobre a fria lajota rubra e a cuia chora por mais um pouco de água quente.
E quando a cuia, solitária, ronca o último mate, eu pressinto que outras tardes virão para sorvermos novas e minguadas reminiscências. Então percebo que é noite e adormeço na rede da varanda.



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