Meu pensamento andou
até minha juventude;
e refletiu, amiúde,
sobre um tempo que passou
mas que ficou na memória
pois foi um tempo de glória
que a mente bem guardou.
Trago na minha lembrança
coisas boas que vivi
muita emoção que senti
num mundo de confiança
foi lá em setenta e dois
nem antes e nem depois
eu não era mais criança
Sonhando com meu futuro
era hora de servir
nunca pensei em sair
mesmo sendo um páreo duro
fui recruta e soldado,
depois um cabo cursado,
dedicado, eu lhes juro.
Eu servi no R.O.
que hoje se chama GAC
não era o melhor craque
mas jogava até bozó
na Segunda Bateria
minha obrigação cumpria,
pois já sabia de cor.
Era um ambiente lindo
cheio de companheirismo
eu via com realismo
gente entrando e saindo
pelo quartel espalhado
só se via os soldados
a sua missão cumprindo.
Que saudade da alvorada
que era tocada por Braga
a memória não apaga
a melodia animada
todos correndo pro rancho
sem fazer nenhum remancho
que comida reforçada...
Depois ia prá parada
desfilar ao som da banda
pois seu toque é quem manda
na tropa ali perfilada
e o Coronel D´Aguiar
cumprimentava com o olhar
toda aquela recrutada.
Depois Capitão Munhoz
dava suas instruções
sobre Constituições
empostando sua voz
e na Sargenteação
era uma satisfação
juntávamos todos nós
De tarde, o Boletim
com ânsia era esperado
nele vinha o resultado
prá quem foi bom ou foi ruim
se alguém era injustiçado
tinha o Sargento Rinaldo
que corrigia, enfim.
Quando estava de serviço
tinha novas instruções
nas guaritas, emoções,
todos já sabiam disso.
no quarto de hora, então,
esperava a rendição
sem o menor sacrifício.
E no toque de silêncio
um sentimento profundo
das coisas puras do mundo
inda hoje nele penso
Depois o oficial
dava a senha normal
com um termo não extenso.
Teve marchas e manobras
em Punaú, Conceição,
nada era feito em vão,
nem desperdiçava sobras
assim rodei o sertão
com muita animação
junto com pessoas nobres.
Nessa feliz convivência
tinha o cabo Emiliano
parecia um franciscano
com aquela paciência
para não brincar com fogo
dizia - isso não é jogo
era muita consciência.
Sargento Robson, amigo,
tinha vindo de Olinda
sua amizade não finda
isso com razão eu digo
pois depois o encontrei
e não me decepcionei
se puder inda lhe ligo.
O gaucho Wanderley
era um cara legal
e tinha um oficial
cujo nome ainda sei
era o tenente Pinheiro
que passou o ano inteiro
botando tudo na lei
Muitos outros encontramos
naquela vida diária
eu ganhei até medalha
inda hoje não sei como
tinha muita gente boa
mas eu, num tirinho à toa,
findei ganhando a fama.
Vez por outra eu meu dia
eu canto os nossos hinos,
pois era nossos destinos
“Abram alas” – assim dizia
“que vai passando” – e cultua
no quartel ou lá na rua
“a Segunda Bateria”.
Também o hino da arma
às vezes fico a cantar
lembrando o som a rufar
algo em mim me acalma
“Poderosa Artilharia”
era assim que se dizia
com toda força da alma.
Aí lembro os companheiros
Severo e Lucimar
Nascimento, Edgar
Bezerril, Lima e Pinheiro
Airton, Campos, Trajano,
Gilberto e Luciano,
me lembro desde o primeiro.
Marcos Sardinha, Matias,
Alexandre e Batista
Neto, Araújo, Romildo,
Aguiar Freitas, Josias,
Alves e Márcio Leitão,
Gurgel, Francisco, sei não,
Foram muitas alegrias.
Hoje já faz trinta anos,
não andamos mais de Reo
nem de Dodge, Coronel,
agora somos paizanos.
Mas a lembrança feliz
liga como uma raiz
a um tempo tão bacana.
Despeço-me emocionado
pois revivi na lembrança
um tempo de esperança
onde fui um bom soldado
onde estará todo mundo?
que sentimento profundo
pois tudo agora é passado...