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Contos-->O Afago de um Estranho -- 21/03/2005 - 15:41 (Luiz Hudson) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Estava eu atravessando a rua em uma passarela ao avistar uma multidão perto de um ponto de ônibus. Vi uma senhora deitada no chão segurando a mão de um garotinho atônito com o atropelamento que ocorrera. A vítima já estava sendo socorrida, não sei se pelo próprio atropelador, mas estava consciente. O garoto é que parecia estar em estado de choque e, talvez por esse motivo, tenha saído em disparada para longe do local. Por estar em uma posição privilegiada pude constatar para onde foi o menino: para perto de um estacionamento.
Desci rapidamente pela escada, queria encontrar logo a criança e convencê-la que a senhora, talvez a sua avó, não corria perigo de morte, pois estava até conversando. Difícil seria saber para que hospital ela foi conduzida. Ao encontrar o garoto deparei-me com uma criança morena, de negros cabelos escorridos, de olhos grandes e negros, a aparência de um indiano. Ele não chorava, o ferimento que sofrera na perna não era grave, apenas o fazia andar com um pouco de dificuldade. Ele apenas olhava para os lados, sem saber o que fazer. O segurei no colo, ele não olhou para o meu rosto. E antes de eu conversar com ele aparece um rapaz, que era a cara do menino. Logo constatei que era o pai do garoto. Fiquei aliviado, poderia dividir a tarefa de encaminhar a criança a algum hospital e avisar à senhora que o menino passava bem. Gaguejando, pulando palavras, falei ao rapaz o que ocorrera. Com a criança nos braços ofereci a um pai o prazer de abraçar o filho com vida que sofrera um atropelamento.
Para minha surpresa o rapaz, também de olhos grandes, foi se esquivando como quem não queria assumir uma responsabilidade. Eu me aproximava dele e o jovem, sem nada falar, balançava negativamente a cabeça e recuava. Coloquei a criança no chão e tentei me aproximar ainda mais do rapaz. Mas, com ajuda da sua agilidade, ele rapidamente saiu de perto de mim e entrou no estacionamento. Fiquei como uma criança, olhando para os lados sem saber o que fazer. Tentei imaginar o que leva um pai a agir assim.
Ao voltar o rosto em direção ao garoto não mais o vi. Aí bateu um desespero. Eu, que tinha abraçado a causa, não poderia desistir. Mas, por sorte minha, o menino não tinha ido para longe, estava sentado em um meio-fio próximo. Era um lugar fácil de encontrá-lo, porque, na verdade, era isso o que ele queria. Sentei ao seu lado sem saber o que fazer. Não foi preciso tomar iniciativa alguma. O menino, sem olhar para mim, deitou a cabeça na minha perna e, finalmente, pude ver rolarem suas lágrimas, lágrimas de quem havia sido abandonado. Fiz um afago nos seus cabelos, mas, decerto que o carinho de um estranho não é o suficiente para um menino sem pai. Talvez em um minuto depois pára um carro diante de nós. Era um automóvel humilde. Olhei para o motorista e vi o mesmo rapaz de antes. Ele gesticulava pedindo a criança. A grande circulação de veículos não nos dava opção de diálogo. Olhares e gestos dizem tudo nesses momentos. Levantei-me e pela janela do carro coloquei o menino ao lado do pai. Foi tudo rápido, muito rápido. Mas ainda tive tempo de ter o prazer de ver o garoto abraçando fortemente o pai e exalando um grande sorriso. Um sorriso maior do que seus olhos, maior do que aquele carro, maior do que o mundo, maior do que o meu coração.
Lá se foi o menino. Não quis pegar número de placa ou cor do veículo. Num momento desses a experiência de vida é maior do que qualquer tipo de prova. Pude constatar o momento em que um homem assume mais do que o compromisso de socorrer uma vítima de atropelamento; assumiu o compromisso da paternidade e fazer uma criança ser a mais feliz do mundo.
Não vou me esquecer a data porque foi no Dia das Crianças. Decerto que a avó levara o neto para ver, ao menos ver, o seu pai. Mesmo que este não quisesse abraçá-lo, o filho teria o prazer de saber que tem um pai. Mas um acidente fez que um pai, em poucos minutos, resolvesse entre se omitir de socorrer uma vítima de atropelamento ou fazer com que um menino recebesse o maior presente que poderia no Dia das Crianças: um pai.
O menino se foi sem olhar para o meu rosto, o rosto de um coadjuvante que ajudou uma história a ter um final feliz, mas que nunca viu o rosto de seu pai.

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