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Contos-->O TREM -- 22/12/2000 - 02:03 (MAIRY SARMANHO) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
No trem em movimento, a passageira reclama. O bilheteiro, irritado, lhe devolve a caixa. O bicho enfia o nariz para fora e tenta toca-la. Ela se abraça na caixa e pergunta, com os olhos cheios de água:
- O que o senhor quer que eu faça? Que a atire pela janela? Que a coloque no vaso sanitário e puxe a descarga? – Ela olha para o homem com ar de ironia. Pura provocação, ele pensa.
- Minha senhora, animais são proibidos. Ainda mais animais deste tipo! – A mulher magra, de cabelos negros, o encara com raiva:
- Animal é o senhor, um sujeitinho insignificante que resolve se impor como autoridade. Ela fica e pronto! – Seus lábios tremem, o batom vermelho parece aumentar ainda mais a boca. Ele retruca:
- Mas, minha senhora... – Tenta argumentar. Certo é certo, foi o que aprendeu. Mas nesse mundo de ricos excêntricos...
- Fica, eu já disse! Ninguém precisa saber, a caixa fica comigo, na minha cabine. Eu a solto um pouquinho e... – O baixinho a encara horrorizado dentro do seu uniforme azul. Criaturinha ridícula, ela pensa. Imbecil.
- Soltar? Por Deus, isso não!
- Mas ela está grávida. Precisa de ar, de espaço. – Os olhos da mulher se enchem de lágrimas, comovida.
- Grávida? Grávida, como?!?
- Ué, como todo mundo. O senhor não sabe?...
- Minha senhora, eu sei muito bem, mas acho que se nascerem mais alguns desses aí, as pessoas vão entrar em pânico! – Grita o bilheteiro, imaginando os gritos que poderão vir.
- Não se ninguém soube... – Responde a mulher, acariciando o focinho gelado que toca sua mão.
- Meu Deus, se isso vem a público, eu perco meu emprego... – Ele diz, sem tirar da cabeça a esposa e os cinco filhos, magros, feios como eles só. Um pai não deve pensar assim, argumenta consigo mesmo. Sente um arrepio. O bicho da caixa lhe dá arrepios. Sempre teve medo de...
- Ninguém precisa saber. – Retruca a mulher, enquanto olha fixamente a criatura na caixa. Envia-lhe um sorriso consolador, maternal, mesmo.
O bilheteiro suspira. Devia ter aceito o emprego de guarda noturno. Agora estava ali, preso naquela caixa em movimento, cercado de um bando de gente esquisita, ouvindo desaforos o dia inteiro e tendo que passar por situações como essa... Olhou para a mulher e para os olhos presos atrás da tela. Talvez não fosse assim, tão perigoso, deixa-la solta. A mulher percebeu que ele vacilava e abriu a bolsa. Três notas dobradas foram colocadas em sua mão. Olhou-as, de relance. Daria para o rancho do mês, um vestido para a mulher, talvez um litro de vinho. Fechou a mão e colocou-as no bolso.
Encarou a caixa com um certo ar de simpatia. Não devia ser tão feia quanto imaginara. Não. Estava grávida, seria mãe em breve e não ofereceria riscos aos demais passageiros. Provavelmente.
- Tudo bem, minha senhora. Pode solta-la. Mas, por favor, mantenha a porta da cabine fechada!
A mulher sorriu, aliviada, abrindo a tampa da caixa. Ele recuou e fechou a porta rapidamente. Foi ao salão principal e pegou um jornal. Enfiou as folhas em todas as frestas possíveis da cabine e sacudiu a cabeça, aliviado.
Saiu dali andando sem pressa, permitindo que o saqualejar do trem impusesse o ritmo e sonhando, um dia, ser maquinista...
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