O MAPA
Fernando Zocca
Para Ana Maria Braga, programa + você da Rede Globo de Televisão.
Capítulo I
"Antes mesmo de ouvirdes os chiados das cigarras, no ano que vem, meus amigos e minhas amigas, vocês assistirão ao impeachment do Jarbas". (Frase atribuída ao Van Grogue em O RELÓGIO).
Todos sabiam ser o Jarbas um sujeito muito ruim. Mas ninguém pensava que ele fosse tão malvado a ponto de retirar o almoço das crianças freqüentadoras das creches de Tupinambica das Linhas.
A pobre cidade, sob a nova direção do caquético-testudo, estava mais pendurada que carne de terceira, em açougue de periferia. Devia pra um mundão de gente. Seus credores tentavam no judiciário, reaver o numerário perdido com aquela prefeitura esquisita e suas trapalhadas.
Foi num momento de crise intensa, na administração municipal, que surgiu na cidade, as irmãs Mary Belly e Mary Chubby. Vinham empenhadas em ensinar aquele povo indômito a ganhar dinheiro.
Elas pararam na sede do Esporte Clube 7,5 de Novembro e dizendo serem representantes legais do Augusto Murídeo, traçaram plenos mirabolantes.
Eram projetos incríveis que levariam o time a campeão da terceira divisão sem perder um único jogo.
Se o leitor não conhece o Augusto Murídeo, é fácil informa-lo de que se trata de um importante empresário do ramo das diversões. É o mais famoso, retumbante, supimpa e solerte proprietário do parque Pirambóia, onde apresenta inclusive shows com os touros mais ferozes.
Uma das condições impostas pelas irmãs, para aceitarem o encargo de direção do time, era de que o técnico do esquadrão deveria ser um sapateiro. Não se conhecia a causa lógica do condicionamento; mas desconfiavam ser uma simpatia.
Na verdade, o treinador era proprietário de uma loja de sapatos existente no arrabalde do município, porém possuidor de um carisma incrível.
Van Grogue lembrava-se muito bem da primeira noite em que as duas donzelas adentraram aos escritórios da agremiação. Eram finas (apesar dos ventres abaulados), bem vestidas, cheirosas, portadoras de bijuterias reluzentes e falavam macio que só vendo.
Mary Belly, sentando-se com estilo, no sofá macio da sala de espera, na sede do clube, respondendo a indagação do Van sobre um provável desejo delas em deglutir um chá disse: "Se o chá vier, veio. Se não, esperemos."
Mary Chubby notando as atitudes bruscas e meio que grotescas do Van, soprou pra irmã: "Não sou carroça ou charrete, mas me amarro, de vez em quando, num cavalo." Em resposta Mary Belly empinou o narigão.
Nesse momento entrou na sala o Jean Busanfa. Trazia numa das mãos uma ampulheta e na outra uma bandeja com duas xícaras de chá. Colocou os vasos cônicos na mesa onde ficava o Van e dizendo "Você não tem muito tempo pra explicar a demora de ontem", dirigiu-se às visitas que, atônitas, observavam a cena.
Servindo o chá para as senhoras, Busanfa dizia: "Tem gente que não se toca. Pensa que ninguém sabe de nada. Acha que todos são otários. Não se enxerga mesmo."
Jean Busanfa era uma biba alta, branquela, muito bem nutrida, devia ter uns 40 anos mais ou menos, mas vítima do T.O.C. (transtorno obsessivo compulsivo).
Quando ela se via cheia de temores e tremores ligava logo seu aspirador Wallita, percorrendo com ele ligado, a casa toda.
Se as crises atingissem níveis elevados, ela acionava o aparelho mais do que 201 vezes ao dia. Era terrível essa lagartixa.
Diziam que quando sob pressão a biba gostava de ouvir Ivete Sangallo em volume alto. A sardanita era foda.
Ela mostrava-se irada quando Van Grogue, para provocar, dizia que os pêlos do seu bumbum a deixavam um tanto quanto grosseira.
O time, e a torcida toda do clube sabiam ter o Van Grogue dito à biba que a deixaria, e não mais reataria as relações afetivas, se ela não providenciasse logo uma cirurgia transexual.
As irmãs Mary Chubby e Mary Belly olharam-se, e como que se indagassem sobre a quem eram destinadas aquelas palavras, ingeriram a infusão.
Capítulo II
As mulheres conseguiram ganhar a confiança da diretoria do esquadrão portentoso, e com muita confiança passaram a efetuar telefonemas para localidades distantes.
As irmãs tornaram-se tão íntimas do presidente, técnico e jogadores, que eles estranhavam quando não as viam nas dependências da entidade.
O tempo passou célere e o time não conseguiu das manas, mais do que engodos e enganos.
Quando fiscais da receita, em blitz no departamento de contabilidade da empresa, acharam indícios de que os dólares investidos no time tinham origem nas falcatruas cometidas contra o governo da cidade vizinha, houve a certeza de que o esquadrão iria mesmo para a quarta divisão.
Capítulo III
"Tremei ó poderosos, eis que é chegada vossa hora!" (Teria dito Van Grogue ao ver o oficial de justiça adentrar o prédio da prefeitura de Tupinambica das Linhas, com o segundo mandado de arresto das verbas do município devedor).
Sob tais novas o caquético-testudo fazia bicos e caras. Ele estava bronqueado. As duas velhotas deram uma despesa tremenda para o clube e, ainda por pura gozação, levaram 11 camisas do time, dizendo que as usariam em campanhas publicitárias.
A situação financeira do glorioso Esporte Clube 7,5 de Novembro tornou-se tão assombrosa que para aparar a grama do campo, alugaram uma vaca.
É claro que a desmoralização não foi grande o suficiente a ponto de vestirem na vacum a camisa do time. Estaria exagerando quem sugerisse, poder ela jogar na defesa, postada na frente da meia-lua.
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