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Contos-->DOLCE VITA -- 30/12/2000 - 15:32 (Marcelina M. Morschel) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

- Droga de sapato. Precisava descolar hoje que estou em cima da hora! Se tivesse mais para escolher... Mas, com esta vida apertada... Preciso trocar toda a roupa para combinar.

Nervosa, foi tirando blusas e saias do guarda-roupa. Uma estava fora de moda, outra não tinha botões. Vira e revira as gavetas, joga tudo na cama. Finalmente consegue conjugar algumas peças.

- Sempre a mesma roupa. Pobre não tem jeito. Andar nua é que seria bom. Pensando enfastiada nas agruras da vida, saiu para o trabalho. No ônibus, sua cabeça deu uma volta de cento e oitenta graus. Começou a despir as pessoas. Ria sozinha. Absorta, não percebeu os olhares espantados que disfarçadamente se afastavam achando-a louca. Uma senhora toda gorda, bem dotada de seios, pés enormes, braços musculosos e curtos. E a magricela, alta, sem quadril, sem barriga, com dois peitinhos do tamanho de limões galegos... Tinha acessos de risos que não podia conter. Via aqueles seios balançando no vaivém e nas brecadas. As gordurinhas fazendo chlap, chlap. Os ossos das magras apontados como estiletes. As pernas tatuadas com varicoses e varizes. Tudo ao natural. O sexo, ali, à vontade, exposto para o que der e vier. Foi quando lembrou-se dos homens. Soltou uma gargalhada. Cabeças levantaram-se para certificar-se. Ela abriu a bolsa. Pegou um lenço, enxugou as lágrimas. Escorriam pelas faces, provocadas pelo riso. Os demais, espantados, olhavam para ela com dó, piedade e receio. O cobrador franzia a testa. Aquilo já estava incomodando. O ônibus corria aos solavancos, parava nos pontos, mais gente entrava. Ela pôs-se a imaginar os homens pelados. Começou pelo motorista. Foi passando um por um. Barrigas enormes, pênis balançando no meio de uma floresta negra, ruiva ou grisalha. As pernas brancas até os joelhos e depois novamente os pêlos. E se acontecesse de algum ficar excitado? Como disfarçar? O coitado que se virasse, encostaria na madame ao lado. Andar seria ridículo. O melhor mesmo seria endurecer por completo. Virar estátua. Alguma senhora distraída poderia ali pendurar a bolsa, pensando ser cabide. Assim devaneando, chegou ao destino. Levantou-se. Todos os olhares em sua direção. Moça bonita e tão louca. Deceu com ar de riso e já na calçada viu cabeças que estiravam os pescoços fora das janelas.

- Idiotas - falou alto – não sou louca, estou com os pinos no lugar. Vocês não têm imaginação.

Ria a mais não poder. Chega ao trabalho, espera o elevador, abre as gavetas. Começa a rotina de sempre. O telefone toca, pessoas querem ser atendidas. O sorriso começa a murchar em seus lábios. Carta para o banco, “e-mails” para filiais, gente a chegar, chefe adentrando. Ele pede para verificar os compromissos do dia. Reuniões, almoço com representações de engenharia, assinaturas de cartas, pessoas à espera. Ela pede licença e volta para sua mesa. De novo o telefone, “boys” esperando, envelopes a ser protocolados. O chefe chama. Esquece o ônibus, os homens e as mulheres nus. Sua boca está fechada e a testa franzida. Olhos atentos, olhar triste. Passa inconsciente as mãos nos cabelos. Balbucia algumas palavras incompreensíveis. A certo momento desabafa:

- “Dolce vita”.


[Conto publicado na Antologia “Em Revista 22 Anos” - Editora do Escritor - São Paulo.]
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