Depois de um dia de trabalho, Rodrigo se dirige ao botequim do Galego para um bate-papo com os amigos, como já era o seu costume.
- ... olha, pobre é que nem mosca, não pode ver uma merda que vai pra perto! - Era Washington que falava, ele sempre ficava como o goleiro nas peladas à s quartas.
- Pó, também não é assim... - Tentou argumentar Alfredo, ele era dono de uma oficina.
- É não? Faz quanto tempo que tu não vê um acidente de trànsito?
- Nesse caso cê tem razão... Ei, olha aí o Rodrigo! Chega mais!
- Aê pessoal! Como é que vai a força? - Rodrigo olha para o lado - Galego, uma lapada!
- Voltando ao assunto - Washington falou depois de um gole de cerveja - pra mim, pobre é a origem da desgraça do mundo. Pra que serve pobre? Veja só: fome, quem é que passa fome? E ladrão? Ladrão vem de onde?
- De onde vem eu não sei, mas vai pra Brasília - interrompeu Rodrigo.
- Não, não, tou falando sério! - disse Washington, retomando a palavra - Tá certo, ladrão vai pra Brasília, mas e marginal? Maconheiro, estuprador, assassino, cheira-cola...? É tudo pobre. E tem também as doenças...
- Aí é mesmo. Vê minha irmã, tá com dengue. Pegou porque foi morar lá perto de Água Fria. Não mandei... Aquele povo não tem educação, noção de higiene. - Alfredo tentava participar da conversa.
- Washington aproveita para continuar - Tão vendo? Olha, por mim, matava era tudo. Acabava crime, fome, um monte de doença. Mas aí ia ter rolo, revolta, gente protestando pelos direitos e tal... Então, ao invés de matar, o governo devia era deixar tudo estéril. Ganhou de dois salários pra baixo? Nheco! Nunca mais filho.
- Malthus. - Carlos, que estava calado até o momento, falou com desdém.
- Quem Orelha? - Orelha era o apelido de Carlos.
- Malthus. Essa sua idéia é velha. Tem uns duzentos anos. Ninguém nunca levou a sério. Não ia funcionar. Além do que, pobre também é gente.
- Tou com o Orelha! - falou Rodrigo - além do que, se não tivesse pobre, cachaça ia ser cara.
- Agora tu viajasse! - foi o comentário de Alfredo.
- Mas não é não? Já visse barzinho em Boa Viagem? Três, quatro conto uma lapadinha. Por quê? Porque pobre não vai beber lá. Cachaça é barata pra pobre poder beber. Se não tiver mais pobre, cachaça fica cara. E aí Washington? Como é que a gente fica? Se ferra, né não?
- Rapaz, eu sempre preferi cerveja mesmo. |
