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Contos-->O Assassinato do Ipê Amarelo -- 09/03/2000 - 21:15 (Wils de Alvarenga) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
“O ASSASSINATO DO IPÊ AMARELO”



Era a primavera de l945, quando, ainda muito criança, com apenas 9 anos de idade., eu saíra em companhia de meu pai para um passeio matinal a cavalo, pelos campos e florestas de nossa fazenda. De repente, deslumbrado, mostrara ao meu pai, à nossa frente e à beira da mata, uma linda árvore coberta de flores amarelas. Apressei-me para chegar até ela, fazendo galopar o meu castanho, sob o olhar preocupado e gritos de meu pai para que tivesse cuidado em não cair do cavalo, pois ainda era inexperiente em cavalgar. Tão logo cheguei debaixo da árvore, admirado pela beleza e perfume de suas flores, gritei: “Venha papai! Corra, venha ver que coisa linda!...”. Quando papai chegou, ficou também deslumbrado e disse que realmente se tratava de um lindo ipê amarelo, uma das espécies mais nobres e cobiçadas do Brasil. Logo em seguida , emocionado como toda criança sensível à preservação da natureza, pedi ao meu pai a árvore de presente, comprometendo-me a cuidar dela com o maior carinho, fazendo em sua volta uma cerca protetora, regando-a quando faltasse chuva e jamais deixando alguém destruí-la, ainda que para isso estivesse em jogo a minha própria vida. Ansioso por uma resposta positiva, olhei para o meu pai, que estava pensativo, com a cabeça baixa, parecendo-me em dificuldade para responder. Mas, logo em seguida, disse-me: “Sim meu filho, a árvore é sua; mas infelizmente não posso lhe esconder a verdade. Veja este piquete cravado ao pé da árvore, olhe para traz e depois para a frente, no sentido norte sul e constatará a existência de uma picada, significando que, exatamente em cima desta árvore, passará uma estrada, estando ela, portanto , condenada à morte”. Papai, ponderei, esta estrada não poderia ser construída um pouco para a esquerda ou para a direita ? “Sim meu filho, mas trata-se de um projeto do governo que dificilmente será mudado, pois há por traz de tudo isso o interesse político e econômico, e as autoridades de nosso país são totalmente insensíveis à preservação da natureza. Mesmo assim, não desanimarei; vou tentar convencer as autoridades a não destruir o meu pé de ipê amarelo. Darei sugestões para modificarem o projeto, construindo a estrada 50m para a esquerda ou para a direita ou, ainda, fazendo um balão para preservá-la . Sugerirei, também, a construção de uma Estação Ecológica de Estudos Zoobotânicos, que deverá se chamar Estação Ecológica de Estudos Zoobotânicos “Ipê Amarelo”, tendo como símbolo a minha árvore de ipê amarelo. Tentei, primeiramente conversar com o encarregado da construção da estrada, que por ironia do destino, se chamava Armando Madeira, sendo, porém, mais conhecido por “Seu Madruga”, pois costumava levantar sempre de madrugada para começar, bem cedo, os trabalhos de construção da estrada. “Seu Madruga”, homem claro, alto, forte, aparentando 40 anos, rígido, mal humorado, era cumpridor de tudo que lhe fosse determinado. Meu primeiro contato com ele não foi dos mais cordiais, pois quando lhe pedi que não derrubasse o meu pé de ipê amarelo, que ficava bem no eixo da estrada, próximo à mata, até que eu falasse com o engenheiro encarregado do projeto e da obra, ele deu uma risada dizendo que seria impossível, pois, no mesmo dia ou, no máximo , no dia seguinte, derrubaria aquela árvore. Então exclamei: “Não faça isso, “Seu Madruga”; dê-me um tempo”. Respondeu ele: “Ora, seu moleque, vá pro inferno, pois jamais conseguirá falar com o Dr. José, que não tem tempo para tratar de besteiras”. Pensei comigo mesmo: Que ignorância! Como as pessoas grandes são insensíveis!...”.Tentei falar sobre o assunto diretamente com o Dr. José, mas não consegui, pois sempre respondia que estava muito ocupado e não podia atender-me. Ele era um engenheiro bastante jovem e parecia ser o rei do mundo, ou seja, seria mais difícil falar com ele do que com o Presidente da República. Não podia mais perder tempo, restando-me uma única alternativa, isto é, seguir rumo à árvore com o objetivo de impedir, de toda forma, que ela fosse derrubada. Assim, logo em seguida, lá chegara o “Seu Madruga” com a sua turma determinada a derrubar o meu pé de ipê amarelo. Logo que percebeu a minha presença em cima da árvore, disse: “Desça daí , seu menino sapeca, senão derrubaremos a árvore com você e tudo”. Respondi-lhe: “Não desço, “Seu Madruga”. Pelo amor de Deus, dê-me um tempo para que eu possa salvar o meu pé de ipê”. “Seu Madruga”, insensível a tudo, determinou ao “Sacy”, integrante da turma , que subisse na árvore e tentasse retirar-me mas, muito esperto, dei-lhe o maior cansaço, pulando de galho em galho e driblando o “Sacy”, que acabou descendo da árvore sem obter seu objetivo e dizendo: “Seu Madruga”, é melhor desistir: esse garoto é muito esperto. “Seu Madruga”, irritado e chamando-o de molão, desistiu de derrubar a árvore naquele dia.. Fiquei em cima do ipê até quase anoitecer, quando desci e fui para a casa-sede da nossa fazenda, que ficava acerca de 2km, com o firme propósito de voltar no dia seguinte e fazer a mesma coisa. No outro dia, levantei-me cedo, tomei café com queijo e fui para junto do meu pé de ipê, pois mal acabara a 2a guerra mundial e eu começava outra, de propósito bem mais nobre, ou seja, salvar a vida do meu pé de ipê amarelo. O dia estava enfumaçado e, somente quando eu estava há l00m do local, verifiquei a tragédia: Minha árvore havia sido derrubada e arrastada uns 20 metros. “Seu Madruga” , covardemente, havia feito tudo à noite, sem que eu nada pudesse opor. Cheio de indignação e revolta, eu chorava e gritava exclamando: “assassinos...assassinos...Mataram o meu pé de ipê”. Ao chegar em casa, decepcionado, contei tudo ao meu pai, que também ficou muito triste e, para consolar-me, disse que plantaria 100 pés de ipê bem pertinho da nossa casa, para substituir o meu, que fora bárbara e covardemente assassinado. Pensei, como toda criança que ama a natureza: “Quando eu crescer lutarei para que a derrubada de uma árvore seja considerada um crime tão grave quanto o de matar uma pessoa!...”

Brasília, 21 de setembro de 1989.


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