(publicado em Anedota Búlgara)
Aproveitando o clima hostil de alguns dos últimos textos publicados aqui na Anedota, antecipo certas observações que pretendia fazer – apenas mais adiante – acerca da inteligência humana e suas seqüelas. Ainda estou pesquisando o material para compor meu pensamento, e por isso não gostaria de me enveredar nessa seara agora, entretanto, meu senso de oportunidade impõe essa manifestação precipitada, à qual estabeleço como pano de fundo a literatura.
Compensando o meu desconhecimento, cito uma frase muito própria de um autor ilustre, sobre o qual, entretanto, não me atrevo a emitir opinião: Pablo Neruda.
"Escrever é fácil: você começa com uma letra maiúscula e termina com um ponto final. No meio você coloca as idéias."
Expressões simples como essas me fazem pensar a respeito da empáfia com que tratamos o nosso próprio conhecimento. É como se nos imaginássemos deuses. Como se inteligência, conhecimento e capacidade fossem conceitos siameses, e representassem, necessariamente, erudição. Ora, quantas linhas e termos rebuscados usaríamos na tentativa vã de dizer aquela mesma coisa? E quantos vocábulos hostis reservaríamos aos que discordassem da nossa conclusão sublime?
Não estou tratando, naturalmente, do conteúdo da frase em si, mas de sua simplicidade. É surpreendente. Diria até mais: é surpreendentemente burra. E por isso a acho tão perfeita. Sem nenhum enredamento, o autor consegue ser profundo e encantador. Não há como deixar de me sentir inebriado pela natureza poética dessa idéia estúpida. E é justamente aí que reside a minha inquietação.
Aqui de onde escrevo, ao pé da serra dos índios mongoiós em Vitória da Conquista, tenho a oportunidade de conviver com um tipo de inteligência à qual não estive muito exposto enquanto morava em nossa gloriosa capital Salvador. Sem o cunho das cátedras e sem a pretensão comum aos intelectualizados, vive uma gente – que mesmo aqui é rara – dotada de uma invejável capacidade de observação e síntese. São sertanejos de pés e mãos rachados, olhos miúdos, vivos, alegres e incrivelmente humildes. Pessoas cujo olhar atravessa o horizonte para enxergar o que está além. Sem esforço. Sem compromisso ou pressa.
Contemplando a sabedoria das palavras simples, ditas tão despretensiosamente por esses caboclos incultos, me deparo com o inevitável desejo de compara-las às que leio e ouço de tantos indivíduos que esbanjam cultura e soberba. Aí sinto que é impossível não invejar a alvura da estupidez.
Está posto o paradoxo. Quanto mais sábios mais ignorantes e quanto mais ignorantes mais sábios.
Seja lá como for, essa é uma questão que me inquieta e para a qual ainda não tenho sequer um indício de resposta. Sinceramente, acho até que nunca terei. Portanto, por enquanto, vou concordando com outro ilustre: Von Goethe.
"Pensar é mais interessante que saber." |