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Contos-->"A MÁSCARA JUNINA" -- 07/10/2005 - 11:59 (Hull de la Fuente) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Este conto é mais um episódio da série "A Menina da Chácara".



A MÁSCARA


Junho era um mês muito especial na chácara. Era o mês das histórias à beira das fogueiras, da batata doce assada nas brasas. Menina adorava levantar cedo pra pegar as batatas que eram deixadas sob a cinza quente. O calor cozinhava lentamente, cada uma delas, durante a noite. Era bom comê-las a qualquer hora. Menina achava que as batatas ganhavam o sabor das aventuras e lembranças da noite anterior, quando os adultos contavam “causos” e estórias para as crianças. As estórias muitas vezes eram terríveis. Falavam de piratas cruéis, às vezes, de bruxos malvados, de reis tiranos ou de diabos. Ocorria também de as histórias acontecerem ali mesmo, na chácara.

Numa noite de junho, dom Mozart reuniu os filhos na varanda, para contar a estória de um certo Nazário. Segundo a narrativa, Nazário teria morrido de dor de barriga, após comer uma feijoada cheia de pedaços de toucinho. Seu fantasma costumava aparecer pelos cantos das casas a oferecer, às pessoas, as sobras da tal feijoada. Quando a pessoa recusava o fantasma começava a se derreter como uma geléia, então tudo em volta ficava fedorento e apavorava todo mundo. As crianças ouviam a estória encolhidas de medo. Menina olhava em volta da varanda pra ter certeza de que o fantasma não estava por ali. De repente, na parte mais impressionante do relato, seus atentos olhos perceberam uma coisa que se movia com dificuldade, vindo na direção de onde estavam. A garota continuou olhando para ter certeza de que estava mesmo vendo algo. Depois de alguns segundos, cutucou sua irmã Liviva, e sem dizer palavra, apontou na direção da coisa. A pessoa continuava caminhando em direção ao casarão. Estava totalmente coberta com uma capa preta, semelhante às que usam os cavaleiros, em dias de chuva ou frio. Liviva fixou os olhos no vulto. Seus dedos seguravam com força o braço de Menina. Latide e Zico, acostumados com as interrupções das irmãs tagarelas, estranharam o silêncio das duas. Viram que elas olhavam fixamente na direção da porteira da chácara. Curiosos, eles também olharam na mesma direção. A criatura agora estava bem próxima da casa. As chamas da fogueira conferiam um aspecto lúgubre à figura, cujo rosto, escondido sob a capa, não se podia ver.

Zico gritou apavorado. Menina, como que hipnotizada e sem desviar os olhos da coisa, finalmente deixou escapar o grito preso na garganta. Os gritos foram mais fortes quando a estranha figura tirou o capuz de sobre o rosto. Diante deles estava um monstro de olhos vermelhos, de boca escancarada e cheia de enormes dentes pontudos e encardidos. Na testa havia um par de chifres. A luz da fogueira tornava a figura mais feia do que se poderia esperar de um monstro.

_ É o diabo! É o diabo! Vamos correr daqui papai! – gritou Liviva.

Menina também gritava, o pavor não permitia que ela saísse de onde estava. O mesmo acontecia com Zico. Latide seguia cada movimento da criatura sem desviar os olhos, estava muda. Liviva tremia e chorava de medo. Como para protegê-los, Dom Mozart tentava abraçar os quatro filhos ao mesmo tempo. Maria e Siá Doninha vieram correndo pra saber o que estava acontecendo. Ao vê-las, dom Mozart apontou pra estranha figura que continuava capengando em volta da fogueira. Maria gritou assustada:

_”É u coisa ruim que taí. É o chifrudo. Vamu simbora daqui, siô Mozá! ”

Então, como se não quisesse ser descoberta, a criatura começou a se afastar, indo em direção da porteira por onde entrara. Liviva, à beira de um colapso nervoso, chorava e gritava. Seu corpo magro tremia de forma assustadora. Siá Doninha tentava acalmar a neta. Mas, a maneira como falava, incutia mais medo à garota.

_ Estão vendo só? Se vocês fossem crianças obedientes, essa coisa não aparecia aqui. Isto é castigo. Ela veio pra mostrar que sabe o que vocês estão fazendo. Ou melhor, o que vocês não estão fazendo. Parem de chorar! – gritou aos netos – a coisa já foi embora.

Menina ouviu as palavras da avó e imediatamente percebeu que alguma coisa não estava certa. Aquele acontecimento não fora nada sobrenatural. Onde estaria sua mãe? Por que ela não apareceu quando todos gritavam? A calma da avó, sua preocupação em dar sermão justo num momento de perigo, era tudo muito estranho. Seu pai também devia estar conivente com a encenação. Por que ele não defendeu os filhos de uma outra maneira? Por que não pegou um pedaço de pau pra bater no intruso? E Antônio? Onde andaria? Naquela hora ele costumava participar da roda de bate papo. Por que ele e a irmã não apareceram? Era muita coisa sem resposta, pensava a garota. Abraçada a Maria, Menina perguntou:

_ Maria, você sabe por que o tio Antônio e a mamãe não estão aqui? Você viu se eles estão lá dentro?

_”Num vi não, Minina. Eu tava na cunzinha lavando os trem da janta aí escuitei os grito doceis e vim correndo pra modi ajudá.”

Latide percebeu onde a irmã queria chegar e, fugindo à regra, esqueceu o seu jeito reservado e falou com o pai:

_ A Menina tem razão, papai! Onde está a mamãe? Por que ela não veio acudir a gente? Aqui nunca havia aparecido nada de estranho. Por que agora apareceu? Responde, papai!

Dom Mozart manteve a calma:

_ Ora, filha! Sua mãe foi à casa da dona Celina. O Antônio deve ter ido namorar. E vocês não devem se preocupar com aquela pessoa que apareceu aqui. Deve ser um maluco qualquer, desses que vivem soltos pelo mundo.

_ Malucos que usam chifres? - interveio Menina.

_ Malucos usam qualquer coisa. Agora estou preocupado com a mãe de vocês. Tomara que aquela coisa não apareça pra ela.

Maria olhava de um rosto a outro, como procurando entender o que se passava e, na dúvida, perguntou:

_ “Oceis tá achano que o coisa ruim que quentava as mão no fogo da fuguera, era a mãe doceis? Cruiz Credo! Isso devi de sê pecado. Sió Mozá, num devia de dexá oceis falá uma coisa ansim, nem a sinhora, Siá Doninha.”

Sem dizer uma palavra, Siá Doninha levantou Zico e o carregou nos braços pra dentro da casa. Da soleira da porta, voltou-se e perguntou se os outros iam continuar ali na varanda. Agarrada à cintura do pai, Liviva entrou na casa. Seus olhos assustados vasculhavam cada canto. Era como se quisesse assegurar-se de que a estranha criatura não havia entrado. Maria deu-lhe água com açúcar. Dom Mozart, entretanto, mantinha a estranha calma. Sua atitude só servia para aumentar as suspeitas de Menina. Dez minutos após, Josefa chegou em casa esbaforida. Disse que havia visto uma criatura horrível perto da porteira e que ela tentara agarrá-la. Menina, que cultivava a semente da dúvida, chegou bem perto da mãe e olhou dentro dos olhos verdes da mulher. Depois, afastando-se tranqüila declarou:

_Engraçado! Nos olhos da senhora não tem nem um pouquinho do medo que a senhora sentiu. Eu também não tenho medo de mim mesma.

Os pais se entreolharam significativamente. Aquela troca de olhares não escapou à esperta garota. Imediatamente, chamou Liviva e Zico para um canto e falou de suas suspeitas:

_ Sabem o que a gente pode fazer pra descobrir essa mentira deles? Amanhã cedo, quando eles estiverem ocupados, nós podemos sair à procura da fantasia de diabo que a mamãe usou agora.

Zico ouviu a irmã e ainda duvidando de que fora a própria mãe que os assustara, protestou:

_ Moço, você não pode xingar a mamãe de cão, de capeta! É pecado xingar a mãe. É pecado xingar o pai, os tios. A vovó já falou isto muitas vezes. “Aquilo” lá fora era o capeta. A mamãe não tem chifres e os olhos dela não são vermelhos. Você...

Liviva impacientou-se com a boa fé do caçula e retrucou:

_ Se você está com medo de ir procurar a fantasia fala logo, Zico! Eu e a Menina vamos procurar sim. Eles têm que parar de assustar a gente. Além das estórias horríveis que eles contam, ainda se vestem de monstro. Vamos procurar sim!

Menina olhou para o irmão e notou que ele tinha medo. O garoto não possuía ainda a malícia necessária pra perceber que tudo aquilo que acabara de acontecer, não passava de uma farsa preparada pelos adultos da chácara. Tentando tranqüilizá-lo, disse:

_ Você não precisa ficar com medo, tá Zico! Nós só vamos procurar amanhã bem cedinho. Naquela hora já vai ter o sol, já vai estar claro. Com o sol, os fantasmas e os monstros se escondem. Eles só aparecem no escuro.

Liviva ouviu em silêncio as palavras da irmã e resolveu ser mais tolerante com o pequeno:

_ Zico, você pode ficar aqui em casa e procurar a fantasia no armário da mamãe. Procura também em baixo do colchão, por trás da penteadeira. Em todo lugar, tá bom? Eu vou com a Menina procurar nas moitas, na beira da estrada. Ela deve ter escondido no mato.


Liviva falou olhando através da janela, o campo escuro lá fora.

Assim combinados, os garotos foram para seus quartos. Naquela noite, depois das emoções vividas, os pequenos não conseguiram dormir sozinhos. Em suas mentes ainda estava presente a figura da criatura que se esquentava à beira da fogueira. Menina, apesar de saber que era uma farsa, não resistiu ao medo. Depois de alguns minutos, pegou seu cobertor e convidou o irmão pra irem dormir com os pais:

_ Moço, pega o seu cobertor! Vamos dormir na cama da mamãe.

Ao vê-los no quarto, Josefa esboçou uma reação contra. Mas, Dom Mozart, talvez movido pelo remorso, permitiu que os dois pulassem pra cama e se metessem como gatos, entre o casal.

Na manhã seguinte, ainda à mesa do café, Liviva falou baixinho com Menina:

_ Eu não dormi direito. Quase que eu fui deitar na cama com a vovó. Eu só não fui porque a mana já estava lá. Depois, quando eu dormi, eu fiz xixi na cama, acho que foi de medo...

Menina teve pena da irmã. Agora a avó ia contar pra todo mundo que chegasse na casa que Liviva fazia xixi na cama. Podia até ver a cena: - “Olhem, vocês estão vendo esta garota aqui? Ela tem nove anos, mas ainda faz xixi na cama. Parece um bebezinho”.- Pobre Liviva. O jeito era ajudá-la a levar o colchão para secar ao sol. Mesmo assim, Siá Doninha não perdoaria, sempre iria dizer alguma coisa. Era difícil contentar a avó. Mas agora elas tinham algo muito mais importante a ser feito: procurar a fantasia de diabo que estava escondida em algum lugar lá fora. Aproximando-se do irmão, Menina falou baixinho:

_ Zico, o que você quer? Ficar aqui e procurar “aquilo” ou quer ir com a gente?

Zico olhou pra Liviva, como se quisesse ver o que ela achava e respondeu:

_ Tem sol lá fora. Os fantasmas já estão deitados na casa deles. Eu vou com vocês. Eu vou levar a minha espingarda! - depois, com ar de dúvida, perguntou:

_ Moço, o sol derrete os fantasmas? Fantasma tem medo de espingarda?

A imprevista pergunta fez Menina lançar um olhar de indagação pra Liviva que aproveitou a deixa e respondeu:

_ É claro que derrete. E também eles são invisíveis e invisíveis não aparecem no sol, só de noite. Eu acho que eles também têm medo de espingarda. Todo mundo tem... - concluiu, tentando encorajá-lo.

Os dois pequenos se entreolharam. A resposta da irmã fora apropriada. Terminado o café, Zico correu para o quarto de onde voltou, trazendo a espingarda de madeira. Menina mostrou-lhe o estilingue no bolso traseiro da calça. Liviva trouxe da despensa, um cabo de vassoura, seria a sua arma. Josefa ainda dormia. A presença dos filhos na cama fez com que sua noite de sono não fosse das melhores.
Aproveitando o fato de Siá Doninha estar na horta trabalhando, os três pegaram o colchão de Liviva e o levaram para o quintal. Depois, de posse de suas “armas”, saíram em direção da porteira. O orvalho estava começando a transformar-se em gotas de água que pingavam das folhas. Menina e Zico, ainda de pijamas, meteram-se no meio das moitas de capim. Tagarelando animadamente, vasculhavam por entre os arbustos, procurando a fantasia. Menina estava convencida de que o acontecido da noite anterior, fora uma farsa. Zico, ao contrário, pensava que era real. Liviva, que se assustou mais do que ninguém, ainda não estava segura de que os pais tivessem sido capazes de assustá-los daquela maneira.

_ Menina, o que é que nós vamos procurar? Será que foi mesmo a mamãe? - perguntou enquanto revolvia uma moita de capim com o cabo de vassoura.

_ Claro que foi a mamãe, né Liviva! Eu conheço a mamãe pelos olhos. A gente tem que procurar a capa preta e a máscara com chifres, é isso que nós vamos procurar. Ela não podia chegar em casa com um pacote. Se chegasse, a gente ia perguntar o que era. Então ela deve ter escondido em algum lugar aqui perto. Vamos procurar até chegar na porteira.

Zico seguia a conversa das irmãs com muito interesse. De vez em quando ele enfiava a ponta de sua espingarda nos arbustos. Numa das vezes, duas perdizes saíram voando assustadas. O garoto também se assustou e correu gritando pra perto de Menina. Do outro lado do caminho, Liviva ficou rindo do medo do irmão. Depois de algum tempo de procura em vão, o garoto propôs que parassem com a busca e que era melhor brincar de subir em árvores. Menina não concordou e insistiu para que prosseguissem. Dali a poucos minutos, já perto da porteira, Liviva gritou animada:

_ Eu achei! Eu achei! Tá aqui detrás de um tronco! Menina! Zico! Venham ver!...

Liviva saltava, excitada pela descoberta. Os dois pequenos correram pra perto dela. Ao se aproximarem, viram a capa preta toda enrolada, parecia uma trouxa de roupas. Zico apontou a espingarda em direção ao embrulho e ordenou:

_ Sai daí! O moço tem um estilingue e eu tenho a espingarda!

Menina divertiu-se com a cena e falou com o irmão:

_ Deixa pra lá, Zico! Isso é a fantasia que a mamãe usou ontem. Não tem nada aí dentro. Vamos desenrolar a capa. A máscara também deve estar aí. – olhando pra irmã, acrescentou – Liviva, você tem coragem de pegar nessas coisas?

¬ _ Claro que eu tenho! Eu quero mostrar pra vovó que eu nunca mais vou acreditar no que ela diz. Vou mostrar pra todo mundo essa mentira... - falou agachando-se para pegar o embrulho em baixo do tronco caído. Depois, ao abri-lo, surgiu a horrível máscara de diabo. Sem hesitação, colocou-a no rosto e falou com os irmãos:

_ Vamos lá em casa acordar a mamãe. Aposto que ela não vai saber o que dizer.

Zico olhava a máscara no rosto da irmã, sem compreender nada. A voz de Liviva saía estranha, abafada; desconfiado, ele pediu:

_ Tira isso, Liviva! Eu não gosto, você está esquisita. Por que a mamãe assustou a gente com isso?

_ Ora! Eles acham que nós somos atentados - respondeu Menina. - Vamos logo pra casa! Eu também quero ver a cara delas. E você, Zico, tem que parar de ter medo de máscara. Por que você não coloca a máscara no rosto? Assim, você acaba o medo...

Zico deixou que Liviva colocasse a máscara em seu rosto e resoluto, marchou para o casarão. O garoto parecia divertir-se. Fazia ruído de monstro para assustar os animais que encontrava pelo caminho e ria contente. A primeira pessoa que encontraram foi Maria. Ao ver a máscara no rosto de Zico, benzeu-se três vezes e falou:

_”Intonce era verdade! Oceis tava cum a razão. Cumé qui pode genti grandi fazê mardade cum os fio? Inté Siá Doninha qui vevi rezano, feiz a gente pensá qui era o coisa ruim qui tava quentano a mão...”

Zico decepcionou-se porque Maria o reconheceu e reclamou:

_ Assim não vale, né, Maria! Como você descobriu que era eu?

A moça riu, mas logo ficou séria e disse:

_”Si ocê num falassi nunca qui eu ia sabê qui era ocê. Inda bein qui é ocê, eu já tava pa corrê pa dentro da casa.”

O garoto retirou a máscara e sorrindo contente, abraçou-se à empregada que passou a mão na cabeça dele e perguntou:

_”Que qui oceis vai fazê cum essa coisa feia? A mãe doceis inda tá durmino. Num vão atentá ela, tá bão? “

Liviva, abraçada à capa preta, pegou a máscara da mão do irmão e respondeu:

_ Então esconde essas coisas no seu quarto, Maria. Na hora do almoço, quando todo mundo estiver junto, nós vamos mostrar pra eles. Vamos ver o que eles vão dizer.

Por volta de meio dia dom Mozart e Antônio chegaram. Menina viu o pai pegar a jarra esmaltada e derramar água na bacia, também esmaltada, e depois lavar as mãos. A seguir foi à vez do tio Antonio. Os dois foram pra sala de refeições. Siá Doninha, na cozinha, ajudava Maria terminar o almoço. Josefa e Latide chegaram do rio onde haviam ido nadar. Liviva e os pequenos esperavam pacientemente o momento de desfazerem a farsa. Na sala de visitas, os três fingiam brincar com os bois de rabada de Zico. Poucos minutos se passaram, até o momento em que foram chamados para o almoço. Com o pretexto de lavarem as mãos, eles foram ao quarto de Maria e pegaram a fantasia. Coberto com a capa que se arrastava pelo chão, Zico deixou que Liviva pusesse de novo em seu rosto, a máscara feiosa. Depois, justo no momento que Siá Doninha estava junto à mesa do almoço, ele fez a aparição. Menina, nessa altura, já se encontrava em seu lugar. Viu a cara de espanto dos adultos. Até Latide, que não fora informada da descoberta dos pequenos, ficou assustada. Para demonstrar naturalidade, dom Mozart comentou:

_ Eu não disse que aquela pessoa de ontem era um maluco? Onde foi que vocês encontraram essas coisas? - Perguntou procurando manter a pose natural.

Menina, após olhar nos rostos de todos, respondeu:

_Ora! Foi fácil! Nós encontramos lá mesmo no lugar onde a mamãe deixou, ontem.

Josefa fingiu surpresa. Mas Latide, saindo do seu habitual silêncio, não deixou a mãe prosseguir com a encenação.

_ É claro que foi a senhora, né mamãe? A senhora nem pensou na coitada da mana - disse, referindo-se a Liviva e prosseguiu - ela quase morreu de tanto medo. O Zico também teve muito medo...

O clima na sala ficou desconfortável. Todos se olhavam como querendo encontrar uma saída, até que Antônio falou:

_ Vocês têm razão de ficarem assim desconfiados de nós. Mas realmente não foi ninguém aqui de casa que se vestiu com essas roupas. Só pode ter sido algum maluco mesmo.

Liviva, que estivera o tempo todo olhando de um rosto a outro, aproveitou-se da ocasião e disse:

_ Eu nunca mais vou acreditar em gente grande. Não sei por que vocês fazem essas coisas com a gente. Os pais dos meus colegas não fazem nada disso com eles.

Para encerrar o episódio, dom Mozart, que parecia bem encabulado, disse que tudo devia ser esquecido, que aquilo jamais voltaria a acontecer na chácara. Zico, que se desfizera da capa, mas não da máscara, tentava meter a colher de comida através da bocarra da mesma. Josefa impacientou-se e mandou que o garoto se desfizesse da máscara, pra que todos almoçassem em paz.

Menina sentiu-se vitoriosa por uns momentos, mas, logo depois refletia com seus botões: “Por que será que eu não tenho medo agora que o sol tá lá fora? De noite eu vou ficar com medo do mesmo jeito”.

Naquela noite, quando a fogueira foi acesa, queimou-se a máscara do diabo. Mas nenhum dos adultos da chácara assumiu ter usado a fantasia. Do seu posto, Menina acompanhava a cena e pensava: “Gente grande é muito complicada, nunca diz a verdade, mas exige que as crianças digam.”






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