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Contos-->SUSTO -- 21/10/2005 - 11:54 (FLAVIO DIAS SEMIM) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Era uma tarde de verão, o sol procurava, lá no infinito, o seu costumeiro lugar para dar vez à noite, quando em companhia de alguns amigos reuníamo-nos tradicionalmente naquele “boteco” de uma esquina na Capital de São Paulo. “Boteco” era uma expressão que usávamos para qualificar o bar do seu Cabral, um simpático português de Tráz-Os-Montes, que cada vez que ouvia o seu seleto estabelecimento ser chamado de boteco, imediatamente reagia, dizendo furioso que “boteco é aquele botequim que costuma ficare a vovózinha!”.
Aquela provocação era constante e já nem se fazia mais por graça, apenas pelo costume, assim como era costume o português trazer logo em seguida uma pequena dose de sua inigualável bagaceira importada da santa terrinha, acompanhada do inevitável “foi a vovózinha que mandou lá do botequim dela”, porém no mesmo tom amável da brincadeira provocativa. Por via das dúvidas, dificilmente se lembrava de cobrar a dose, talvez por medo de ter ofendido e perder o freguês. Enfim, não iria isto acontecer, pois se tratava sempre de brincadeiras entre amigos.
Entre os freqüentadores do boteco, incluía-se comerciantes, bancários, dentistas, aposentados, advogados e outros mais, todos elementos de “boa procedência e gente fina” como diziam, gente essa que ali parava por alguns momentos, sem nunca deixar de ir para casa jantar em companhia dos familiares, um pouco mais tarde, é verdade.
Naquela tarde, entrando no bar um homem desconhecido logo foi perguntando ao “seu” Cabral se ali se encontrava algum advogado, recebendo como resposta, que até aquele momento, apenas um, o Dr. Flavio e indicando na minha direção, sentado eu à uma mesa em companhia de amigos, no meio do salão.
Distraído, sem nada ter tomado ainda, ouvindo ou contando algum acontecimento do dia, nem me lembro mais, voltei-me ao ser chamado pelo nome. Não é que ali, na minha frente, eu sentado e ele de pé, um tipo jovem, de porte físico pequeno, barba por cortar, razoavelmente trajado, pálido e visivelmente nervoso, com o braço estendido e tendo à mão um revólver calibre 38 apontado para mim, pediu a confirmação:
- o senhor é advogado?.
Diante daquela situação, com uma arma apontada para o meu peito a curta distância, num bar, confesso que acreditei ter chegado a minha hora, o meu fim. Num piscar de olhos, revivi a minha vida desde a infância até as portas da terceira idade. 58 anos vividos, pensei, filhos criados, netos conhecidos, vida profissional e financeira estabilizada, não era justo que a véspera de poder desfrutar da velhice, teria chegado meu fim, passaria para o andar de cima violentamente e justamente naquela situação, estando em companhia de amigos num bar de periferia!.
Que prato cheio para meus inimigos ausentes e para a vizinhança presente no velório, podendo jurar que eu tinha morrido bêbedo e em más companhias, ignorando totalmente que se tratava de encontros entre amigos, nas “Happy hour”. Aquela cunhada invejosa estaria por várias vezes a confirmar o que sempre dizia: “É isso que dá, o “meu” (marido) não fica em bar!”. Os demais dizendo sempre “ele era tão bom”, novo ainda, que pena..., enfim a vida é essa!”. A viuva, não tendo mais lágrimas a derramar dizia “ ritorna amore mio, io te volio tanto bene”. E eu deitado naquele caixão, rígido, frio, imóvel, conclui que, sendo minha esposa brasileira, filha de descendentes de portugueses, falando exclusivamente português, somente poderia estar usando o idioma italiano por influência da novela das oito, o que aliás, eu sentia muito por não mais poder acompanhar aqui na terra e saber o fim do drama.
Tudo passou, como disse, num segundo, pois recuperado, na verdade revivendo, respondi ao meu interlocutor, com a coragem e a voz saídas do fundo nem sei de onde: “sim, sou!”
E ele, como que desmoronando, num gesto meigo entregou-me aquela arma, dizendo que após muita procura e como tinha prometido, havia acabado de assassinar sua amada que o deixara, com todos os tiros que aquele revolver pôde dar. O fato ocorrera na última casa daquela rua, bem lá no alto. Começou a chorar na frente de todos aqueles que ali estavam e que a partir de então começaram a se mover, pois estavam, como eu, imobilizados, petrificados. Chorando, o homem contou um pouco da sua história com voz embargada e pedindo-me que o acompanhasse até a Delegacia de Polícia, pois queria se entregar, pagar pelo que fez, mas não pretendia ir sozinho, e sim acompanhado de um advogado. Foi o que fiz, acompanhei o moço, até a conclusão do flagrante.
No dia seguinte, entre motivos de gozação, perguntaram-me o que aconteceu ao “assassino da cabocla Teresa” e quanto tinha ganho pelo trabalho, pois esse dinheiro merecia ser usado para pagar o consumo do dia e curar o susto coletivo na véspera, quando então respondi em alto e bom som:
- “Eu em..., jamais cobraria alguma coisa de quem não me matou!”.

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