Se
Guilherme de Almeida
Se puderes guardar o sangue frio diante de quem, fora de si,
acusa-te.;
e, no instante em que duvidem de teu ânimo e firmeza,
tu puderes ter fé na própria fortaleza,
timbrando em confundir a desconfiança alheia...
Se tu puderes não odiar a quem te odeia,
nem pagar com a calúnia a quem te calunia,
sem que tires daí motivos de ufania.;
sonhar, sem permitir que o sonho te domine.;
pensar, sem que em pensar tua ambição se confine.;
e esperar sempre e sempre, infatigavelmente...
Se, com o mesmo sereno olhar indiferente,
Puderes encarar a derrota e a vitória,
como embustes que são da fortuna ilusória.;
e estóico suportar que intrigas e mentiras
deturpem a palavra honesta que profiras...
Se puderes, ao ver em pedaços,
destruída pela sorte maldosa, a obra de tua vida,
tomar de novo a ferramenta desgastada
e, sem queixumes vãos, recomeçar do nada...
Se, tendo loucamente arriscado
e perdido tudo quanto era teu,
num só lance atrevido,
puderes voltar à faina ingrata e dura,
sem aludir jamais à sinistra aventura...
Se tu puderes coração, músculos, nervos,
reduzir da vontade à condição de servos
que, embora exaustos, obedeçam-lhe ao comando...
Se, andando a par dos reis
e com os grandes lidando,
puderes conservar a naturalidade,
e, no meio da turba, a personalidade.;
impávido, afrontar adulações, engodos,opressões.;
merecer a confiança de todos,
sem que possa contar, todavia, contigo,
incondicionalmente, o teu maior amigo...
Se de cada minuto os sessenta segundos
tu puderes tornar com o teu suor fecundos...
a terra será tua, e os bens que se não somem
e, o que é melhor, meu filho,
então serás um homem!
Nota: Esta é uma tradução do poema If de R. Kipling, feita por Guilherme de Almeida (1890-1969), em 2 de abril de 1938. |