Usina de Letras
Usina de Letras
19 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62287 )

Cartas ( 21334)

Contos (13267)

Cordel (10451)

Cronicas (22540)

Discursos (3239)

Ensaios - (10389)

Erótico (13574)

Frases (50677)

Humor (20040)

Infantil (5459)

Infanto Juvenil (4781)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140819)

Redação (3310)

Roteiro de Filme ou Novela (1064)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1961)

Textos Religiosos/Sermões (6211)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Poesias-->Em nome do pai e do filho -- 19/03/2007 - 16:11 (JOÃO FELINTO NETO) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
PREFÁCIO



São tantos questionamentos que é necessário desvirtuar-se um pouco da realidade para melhor introspecção em busca de algumas respostas.

Vale ressaltar que quase sempre não temos resultados coerentes.

O poeta norte-riograndense João Felinto Neto faz brilhar no universo literário esse ponto de luz que é Em nome do pai e do filho. Poesia crítica aos conceitos, aos preceitos e ao sentido da vida. Um extremo solavanco na intensa necessidade de criar para viver, não eternamente, mas por muito mais tempo.

Ao debruçar-se sobre estas páginas, o leitor ficará inquieto diante da presunção inconsciente com a qual o poeta destila um insidioso veneno nas mentes pacíficas e acomodadas ao pensamento convencional. O poeta digere o sofrimento, as angústias, o inquietante indagar cotidiano à sombra da enorme catedral e o pálido porque dos importunos, através de seus versos.

Em nome do pai e do filho não convenciona verdades nem sintetiza argumentos. Todavia, exaspera aos que não enxergam à luz da razão.



Humberto Gaspar













EM NOME DO PAI E DO FILHO



Ao bater na porta,

Meu corpo treme.

Então, me acorda

A dor premente.

O meu corpo sente

E desaprova.

Quem me acordaria

Àquela hora,

Seria enfim, a morte?



Luto pra ser forte,

Indiferente.

Adentra o recinto,

Descontente,

O meu filho que sofre.



- Pai, minha tia diz que sua sorte

É de Deus castigo.



- Venha cá meu filho,

Sente-se ao meu lado.

Não existe Deus ou o Diabo.

Eles não têm nada haver com isso.





- Não entendo, pai.

Qual é o motivo?

Aonde você vai,

Eu irei contigo?



- Escuta, querido.

Lembre-se do que digo.

Imagine uma velha carroça

Numa disparada sem sentido,

Numa poeirenta e triste estrada.

Quando o burro em uma guinada,

Joga a roda numa poça d’água

Que enlameia uma cerca,

Não há um motivo.



Todavia, nem todas as estacas

Seriam afetadas.

A lama seria os males do mundo.

Eu, uma das estacas atingidas.

Poderia ser a sua tia

Ou qualquer pessoa nesse mundo.



São tolas palavras,

As que a fé, dita.

Que sejam caladas,

Que sejam proscritas.

Nada determina nossa vida.

São folhas caídas

Numa enxurrada.

Quanto a estar contigo,

Será para sempre

Em suas lembranças.

Não é diferente,

Quando o corpo morre

Também morre a mente.

Eis que nossa alma

Morre com a gente.

Não chore filho,

Não fique descontente.

Há contos de fada,

Onde nossa alma

Vive para sempre

Num lindo lugar.

Basta acreditar,

Que estará presente.



- Minha tia disse que o inferno

É um lugar quente,

Onde a alma geme

Atormentada.



- Sua tia é louca e desvairada,

Foge de si mesma, assustada,

De um fanatismo incoerente.

O Diabo não passa de muita gente.

O inferno, uma vida atribulada.

Quando o cérebro pára,

Não há cético ou crente

Que veja mais nada.

Onde haveria de estar a alma,

Além de numa mente fértil e demente?

Filho, para sempre

É coisa passada.

Viva o presente.

Quanto a céu e inferno

E um viver eterno,

Não seja inocente,

É coisa sonhada.



- Pai! E se for verdade

O que a tia diz.



- Ela é infeliz,

Mesmo com saúde,

Tem medo da vida

Mais do que da morte.

Onde há verdade,

Há também coragem.

Quem vive

Não morre.

Onde estaria

O Éden perdido,

Esse paraíso

Feito de matéria,

Onde um ser pensante

Sem massa cefálica,

Caminharia um instante

Sob um chão de nada,

Numa tarde ensolarada

Quando não haveria sol?

Lá estariam as almas,

Também sem matéria.

Sentiriam elas,

Uma beatitude

Sem haver terminações nervosas?

Isso tudo é prova

Que é a imaginação,

Uma ilusão,

Quase ninguém nota.



-Pai,

Se não existe Deus

Quem criou o universo

E tudo que nele há?



- A resposta está

No fundo do cérebro.

Basta acreditar.

Não há criação,

Tudo é de fato.

Sendo Deus então,

Uma criação

Do homem fanático,

Seu próprio retrato.

-Preste muita atenção,

A razão fala mais alto.

Quando ouvir o coração,

Avalie o resultado.

-Se eu morresse agora,

Morreria satisfeito.

Pois, vivi outrora

Tudo que tive direito.

- O mundo é perfeito

Em sua imperfeição.

Imagine-o como criação,

O autor um deus

Que é em si perfeito.

Esse deus, quem fez?

E por sua vez,

Qual o criador

Que o outro deus criou?

Seria sem fim.







- Pai, diz para mim,

Como vou viver

Longe de você.;

Não será meu fim?



- Chegarei ao fim

Como um indivíduo intelectual,

Entre o bem e o mal,

Entre o bom e o ruim.

Todavia,

A minha matéria continuaria,

Ela é infinita.

Sendo assim, um dia,

Serei apenas uma lembrança.

Você é criança.

Vai crescer, sabia?

Digo isso a você,

Apesar de não saber

O que espera o futuro.

O que não aconteceu

É obscuro.

Não há jamais, como prever

Se ainda vai acontecer.

Siga seus princípios

Morais e éticos.

Seja sempre cético

Ante os artifícios.

Afinal, a vida em sociedade

Exige coragem

E respeito mútuo.



- Pai, eu devo questionar a tudo?



- Filho, na verdade não importa

Se alguém criou o mar,

Banhe-se.

Quem faz o vento soprar?

Sinta-o.

De onde vem a música?

Dance.



- Pai, até onde devo aprender?



- O saber

Não tem limite.

Nós devemos aprender

O que na verdade existe.

Porém, é apenas conhecimento.

O verdadeiro instrumento

É aquilo que criamos.

Pois, ultrapassará nossos anos.

Viveremos assim, mais tempo,

Dentro de futuros pensamentos.



- Boa noite, pai.



- Durma bem, filho.



Quando enfim, parte

A minha criança,

Vem-me a lembrança

De um livro que li.

Pura poesia no livro havia.

Em voz alta, eu repito

O seu título:

- Em nome do pai

E do filho.











SUA CASA



Não espere por Deus, nunca,

Você nunca o verá.

Sua voz será a única

Que você ouvirá.



Se quer acreditar,

Não escute o que digo.

Porém, se duvidar,

Questionar é preciso.



Entre covas dispersas,

Não há bem, não há mal,

Só há nossas conversas

De fulano de tal.



Em um golpe fatal,

Acertei sua nuca.

De uma forma geral,

Vou fundir sua cuca.









AURORA



Sou eu que choro de amargura

Enquanto a noite escura

Ainda sorri lá fora,

Ao ver surgir a lua.

Estou à espera da hora,

Perante a loucura

Da dor e da demora.

Eis que a manhã se afigura,

O sol me apavora.

É mais um dia de tortura

Por não ter ido embora

Como se fora, a pouco, a lua,

Nessa mística mistura

Que é a aurora.











POR ACASO



Eu tomo uma decisão

Entre duas opções.

Numa, eu mato um leão.

Na outra, não.

Sei que a decisão é minha,

Mas a tomei por acaso.

Nada, a ela determina.

Não é destino, é um fato.

O leão fora caçado,

Não por que devia ser.

E também foi por acaso,

Na minha frente, aparecer.

Há um leão a morrer

Por efeito do disparo.

A causa, o meu querer,

Uma disposição ao acaso.

Na verdade, leões eu não mato,

Apesar, de versos, escrever.

Não importa na vida o que faço.

Por acaso,

O que faço

É viver.











DESPEDIDA



Em cada ponto de partida,

Uma chegada.

Em cada casa

Há uma porta de saída.

Em cada sala,

Uma visita indesejada,

Que se cala

Numa ingrata

Despedida.











O ANJO E O MONSTRO



Tu és o meu lado humano,

Aquele que cuida de mim.;

As asas de um doce anjo

Que voa sobre meu jardim.;

A cura de minhas feridas.;

A cicatrização da dor.;

A emoção de minha vida.;

A realização do amor.



Eu sou meu lado desumano,

Aquele que quer ver meu fim.;

As garras de um cruel demônio

Que fere o anjo no jardim.;

A fúria que não é contida.;

O obscuro lado do terror.;

O monstro que em mim habita

Que é insensível ao teu amor.











ALIENÍGENA



Esse mundo não é meu,

Eu sou um alienígena.

No meu mundo não há Deus,

Não há castigo que fira,

Não há alma condenada,

Não há céu e nem inferno.

Lá, o que tem de eterno

É a essência herdada.

É a única morada

Que o acaso concebeu.



Já nesse mundo de adeus,

Cada um de nós perdeu

O caminho para casa.











LIVRE DA FÉ



Pai,

Não me faça odiar a teu Deus

Só por não merecê-lo.

Os castigos que devem ser meus,

Não os dê a terceiros.

Não desejo jamais conhecê-lo.



Os meus erros

São atos banais

Ante os ais

Dos que choram de medo

De um deus que é espelho

De indefesos mortais.



Pai,

Não condene meu êxito

De livrar-me tão cedo,

Dessa fé dos demais.;

De acordar desse teu pesadelo,

No qual, os meus desejos

Levar-me-ão ao degredo

Com minh’alma em paz.











UTOPIA



Sou borboleta perdida

Que no jardim bate asas.

Nasci sem ter companhia.

No casulo fui lagarta.

Arrastei-me nesta vida,

Entre árvores esfolhadas,

A procura de comida

Numa floresta devastada.

Hoje, vôo em liberdade.

Sinto a saudade de um dia

Em que eu era utopia

E não verdade.











CULPA



Eu fui a lei

Para o homem que nasceu jurado.

Fui um carrasco

Para o vassalo

Que desobedeceu ao Rei.

Eu fui talvez,

A cova para o missionário

Que ao ver o Diabo

Achou que era a sua vez.

Fui eu, vocês.

A cada um, eis meu recado:

Sou agora o pecado

Pela morte que me fez.











UM GRÃO



Sou do universo, um grão.

Ponho na mão,

Um punhado de areia.

Sou apenas isto?

Ainda dizem que eu existo!

Sei que existo

Por acreditar saber.

Porém ser,

É aquilo que acredito.

Entender,

Eis a parte mais difícil.

Se existo,

Por que não consigo ser?











CONTINUIDADE



A distância

É apenas a espera.

A espera,

Paciência.

Abra os braços,

Continue em terra.

A lembrança,

Barco a vela

Que navega em silêncio.

Não há nada de novo no tempo.

Amanhã, não importa a idade.

Somos continuidade.











MÃOS OPOSTAS



São tantas as minhas dúvidas.;

Perguntas que jamais terão respostas.

No meu campo de batalha, não há luta.

Sem pecado, não há culpa,

Só as duas mãos opostas.



Não sei ajoelhar-me e fazer súplicas,

Estas ações em mim seriam hipócritas.

A quem eu deveria tais desculpas?

Não há sensação nas luvas.

Minha prática é estóica.



A minha mão não sela minha jura.

Minha loucura é baseada em lógica.

A minha trajetória não é curva,

É retilínea sob a luz de minha óptica.











CERVEJA



Tão fria,

Porém, me deixa tão quente.

Espuma fremente

Que me alicia.



Loira que sacia

Um desejo ardente

Que me deixa ausente

Quando minha boca

O copo esvazia.











CÔMICO



Bati o pó

De minha terra.;

Estava só,

A sua espera,

Há mais de vinte anos.

Talvez, já não me reconheça.

Mas sou o mesmo,

Tão cheio de planos.

A minha porta está aberta.

A minha vida um triste espelho.

Diante de meu desespero,

Sou cômico.











O OLHAR



Espantado?

Espantado, talvez.

Espantado comigo?

Espantado pelo que sei.

É fitando o espelho que eu digo

Que não sei o que sei:

Se esse olhar tão perdido

Que é por mim tão temido,

É o meu

Que fitei.











ENTRE GOLES



Entre goles de uma bebida pura,

Pela jura de esquecer o outrora,

O que faço,

Se estou cavando, agora,

Minha sepultura?



Ao pedido de quem mais me culpa,

Pela ajuda de quem mais me olha.

Meu fracasso

Em pedir desculpa,

Já não lhe apavora.



Nem a força de toda ternura

Ante as lágrimas de quem sempre chora,

Vai mover de minha sepultura

Essa areia suja

Que o tempo sopra.

Entre goles de uma bebida escura

Que não mais consola.











ONDA ESPECTRAL



Sou, às vezes, o avesso

De um mundo que me vira.;

Uma triste utopia

Do contrário.

Sou o velho calendário

Sobre a mesa.;

A página marcada

Do esquecido aniversário.

No cenário

De uma peça teatral,

Sou o caos

De uma ordem imprevista.

Sobre a crista

De uma onda espectral,

Eu sou o mal

Que se exorciza.













SOLIDÃO DIÁRIA



Você me cobra atenção.

Sua boca em vão,

A mim, condena.

Sou eu a folha serena

Que cai no fim do verão.

Você tem sempre razão.

Em minha culpa condena.

Talvez, um dia eu aprenda

Que solidão é ofensa

Se em meio à multidão.













MÃO ALHEIA



Se não sou erro,

Apenas me engano.

A mim, acusando,

Não põe cadeia.

Pois se é feia

A minha ação,

Assim engana.

Não tenho gana

De ser mais feliz,

Por ser raiz

Daquela que me apanha,

A mão alheia.











AO ALCANCE



Onde posso lhe encontrar,

Corpo de sereia?

Que ao sair do mar

Deixou na areia

A minha vontade.

Em sua liberdade,

Voa para casa

Num lençol de asas

Como uma gaivota

Quando sobrevoa

Um moleque à toa,

Triste a caminhar.













REMÉDIO



De que me adianta o céu

Se os que amo sucumbirem ao inferno?

Não valeria a pena ser eterno,

Prefiro ser mundano.

Pois o meu pensamento é profano,

Amenizando o tédio

Como um remédio

Para esse desengano.

Não tenho medo de queimar no inferno,

Se estiverem salvos os que amo.

Não acredito que exista um plano

Ou um destino certo.

Meu futuro, no acaso, é incerto

Como fora antanho.













A CHUVA



Não tenho medo de ir para fora

Enquanto a chuva cai.

Mas, se você sai,

O meu coração chora,

E se demora,

Ele chora mais.

Sei que meus ais

Não lhe comovem, agora.

Minha senhora,

Quanta falta faz.

Não tenho paz,

A chuva não consola

E a lágrima de outrora,

Tal qual a chuva,

Cai.















VALIA



Não acredito

Que cada um mereça seu castigo.

Pois que o nosso preço

Não é nossa valia.



A uns, caber tristeza.

A outros, alegria.



Não acredito,

Nem acreditaria.

Por ver penar o certo

Em meio ao deserto

De sua teogonia.



O que não vale nada,

Seguir na mesma estrada

Em sua companhia.



No arrependimento,

Apagar pelo tempo,

Toda sua vilania.



Não acredito,

Nem acreditaria.













CALENDÁRIO



Sou uma página ao vento,

Por alguém me arrancar.

Porém, eu me contento.

Fica em meu lugar,

Uma data expressiva

Que irá à deriva

Quando o tempo passar.















ESCURIDÃO E LUZ



Clamor

De quem me fala.

Beijos

De quem me trai.

Eu sou a paz,

Quando vitória.

Reconheço

Querer mais que minha nota,

Uma ambição que me sufoca.

Não seria Jesus,

Iscariotes com a sua corda?

Árvore torta.

Sangue na cruz.

Beijo que me seduz

E me deflora.

Escuridão e luz.













TEMPORÁRIA



Nessa vida temporária,

Atribuo os meus passos,

Ao acaso.

Pois destino

É tristeza e embaraço.

Se descalço,

Um espinho me penetra.

Sou poeta

Em um mundo calejado,

Onde todos são levados

A ter pressa,

Onde a meta

É um futuro avançado.













O RINGUE



Amo sem piedade

Pelo amor que dou.

Não peço em troca

Sua lealdade.

Na minha idade,

Não esqueço quem eu sou:

Um lutador

Sem inimigo de verdade.

Meu ringue,

Um palco de vaidade.

Saudade

Por não ter opositor.









PALAVRAS



É madrugada,

O silêncio traz consigo

Versos perdidos

Por minha alma,

Que escravos da razão,

Nunca terão

Expressão em suas falas.

São palavras

Que talvez não digam nada,

Por serem versão.

Se fossem versos

Declamados ao inverso,

Dariam lágrimas.











MONOCROMÁTICA



Dedico minhas horas ao sorriso,

Como castigo

Aos que nunca dão risadas.

Monocromáticas,

Almas sem o colorido.;

Duvido

Que algo possa ajudá-las.

Poucas palavras

Que insultam meus ouvidos.

Descubro

Que sem cores, são fantasmas

Que acreditam estar vivos.











ILUSÃO DESMERECIDA



Não sou a construção

Sob medida.

Ninguém habita,

O meu triste coração.

Talvez, seja ilusão

Desmerecida,

Quem acredita no amor

E na paixão.









SÓCIOS



Não choro,

Apenas desabafo meu pesar.

Não sei se amar

É um bom negócio.

Nas pautas de um papel,

Nós somos sócios.;

A nossa meta

Era o amor não se acabar.

O nosso prejuízo foi deixar

Que houvesse intromissão da concorrência.

Inevitável a nossa falência.

Tivemos que nos separar.











OUVINTE



Sou aquele

Que sucumbe a toda hora,

Em seus tristes pensamentos.

Não espero,

Nem deleite, nem sorrisos.

O meu risco

É estar vivo.

Vou embora.

Minha história,

Mal contatada,

Sem ouvidos pra escutar.

Pela demora,

Sou agora

O ouvinte esquecido,

Que repete as palavras

Sem sentidos,

Depois chora.











O ANJO



Eu sou o anjo

Que saiu de casa

À procura de Deus

E que descobre que seus braços

Não são asas,

E que o inferno

É a favela em que nasceu.

Que sua salvação é sair ileso

Do projétil de uma bala.

Que não tenciona ir parar no céu,

Pois sua igreja é uma lei equivocada.

Sua única certeza

É que o mundo é cruel.

Que seu poder vem do calibre de uma arma.

Que carrega almas como uma missão,

Na ilusão

De que a morte irá salvá-las.

Que as feias chagas que há em suas mãos,

Foram causadas pelos cabos de suas armas.

Que o seu sermão

É um discurso na baixada.

Que enquanto fala,

Vende drogas aos irmãos.

Que o seu perdão

É uma atitude rara.

Que o seu sorriso é uma triste gargalhada

Que parece uma crise desesperada

De quem perde a razão.

Que carrega sua cruz

Tatuada em suas costas.

Que suas respostas

São parábolas em vão.

Que sua oração

São palavras indecorosas.

Que ao ser ferido pelo gume de uma faca

Cravada no peito seu,

Abre os braços enquanto seu sangue jorra,

Olha para o céu e chora

Por acreditar, outrora,

Que podia encontrar Deus.













NADA SERIA



Sou o rascunho

De uma história mal contada.

Muitas vezes, apagada

Pela mão que corrigia.

Sou a grafia

Que a mim mesmo, ocultava.

A palavra que ditada,

Escondia

Que eu me ouvia

E a caneta acompanhava.

O que há muito já sabia,

Que amassado entre páginas dobradas

Pela mão que me escrevia,

Nada seria.













NOSSA VITÓRIA



Cada detalhe do seu corpo

Nos recomeça.

Como se lentamente,

Encontrássemos nossa pressa.

Lábios tocados

Pela anuência do querer.

Eu sem saber

Que o seu caminho é que me leva.

E na hora de voltar,

Eu em você,

Você em mim.

Nossa vitória,

Chegarmos juntos ao fim.











PERFUME



Se não consigo entender-me,

Como posso avaliar o teu caráter?

De minha parte,

Quero apenas entreter-me.

Porém a solidão

Na escuridão,

Arrasta-me ao ciúme.

Eu poderia beber a noite toda,

Não sairia de minha roupa,

O teu perfume.















DUAS PARTES



Sou em dois,

Sem metades.

Sou em parte,

Um fim.

Duas partes

Em uma unidade.

Sou metade em mim.

Ruboriza uma parte,

Com vergonha de mim.

Talvez por ser humana.

A outra parte

Apenas me acompanha,

Por ser parte de mim.











COMPENETRADO



O poeta

Põe as mãos sob a cabeça

Pra pensar no mundo,

Mesmo que dele se esqueça

Por não conhecê-lo a fundo.

Em seus versos, manifesta

A expressão de sinto muito.

Por dizer: - Não me aborreça.

Por favor, vê se me deixa,

Eu não tenho mais assunto.

O poeta

Não esquece um segundo

De usar sua caneta

Para falar com o mundo.















SENSATEZ



Quero

Alimentar o meu sorriso pobre,

Com os momentos de espontânea lucidez.

Quero talvez,

Iluminar com um gesto nobre,

A amargura dessa timidez.

Não sei

Se nas idéias, sou realmente louco,

Ou falta pouco

Para morrer de vez.

Minha verdade

Convalesce por meus erros.

Os meus acertos,

Uma estranha realidade,

Sensatez.













O SELO



Sou memorável

Nesse jogo de memória.

Não há história

Num presente sem passado.

Leio ao meu lado:

“De alguém que foi embora.”

Quando eu falo, de fora,

Dentro tem alguém calado.

Não há recado

Se o bilhete, a chuva molha,

Enquanto o mensageiro chora

Sem que possa entregá-lo.

Neste cenário,

Sou o selo imaginário

Do envelope que descola

E é pisado pela sola

Do sapato

Do carteiro aposentado.













RESPOSTA



Se alguém me perguntar:

- Quem sois, agora?

Direi que fui outrora,

Quem não soube esperar.

Se insistir interpelar,

Que isso não é resposta,

Ratificarei que agora,

Não sou nada sem lembrar.















TEORIA IMAGINADA



Tenho uma idéia

Que na prática passaria

Como teoria imaginada,

Por alguém que não sabia.

Minha idéia materializada,

Pode não mostrar sabedoria.;

Mas com tinta e caneta, ela daria

Uma bela poesia

Declamada.















REFÚGIO



Vivo,

Pois respiro

Minhas horas de existência.

Onde o suor é liquido

De minha sobrevivência.

Sempre sob o risco

De sucumbir à demência,

Procuro refúgio

Nos caprichos da inocência,

De que um anjo resoluto,

Vai manter a consciência

De que vivo mais

Que luto.













CONDECORADO



Acato

Todas as ordens que me dão,

Sem nunca dizer não,

Sem desacato.

E quando chamam minha atenção

Com um sermão,

Fico calado.



De um soldado raso

A capitão,

Medalhas são

Bons resultados.



Não posso tomar uma decisão,

Será violação,

Seria rebaixado.



Se eu então pensar,

Haverá uma expulsão.

Serei um cidadão,

Jamais condecorado.













FALHO



De que me vale a culpa,

Se há perdão.

Quebro a promessa,

Ainda há jura.

Peço desculpa,

Estendo a mão.



Se cometo um pecado

É que sou falho,

Faço mais não.

Não serei condenado.

No fim, sou perdoado.

Recebo ajoelhado,

A salvação.















O ERRO



Eu cometi um erro,

Não por querer,

Mas por jamais, poder

Me conter,

Não consumar de fato.

Talvez, o meu prazer

Tenha custado caro.

O que posso fazer,

Se por amar você,

Fui condenado?

Nunca pensei de ver

Tão grande amor

Como um pecado.













AINDA É DIA



Nunca é o bastante a companhia

Dos que cercam nossa vida

Quando a saudade

Pela morte, os silencia.

São nessas horas vazias,

Que exigimos do tempo

Uma regressão de lembrança,

Na esperança

De aplacar o sofrimento.

O cotidiano incomoda

Pela falta percebida.

A agonia

É saber que não há volta

E a revolta

É saber que ainda é dia.













MINTO



O eu distinto,

Não se apraz,

Nem se conforma

Nessa dor que incomoda

O meu instinto

Que ao se sentir extinto

Se acomoda

Numa paz

Que em mim, aflora

Quando minto.











IMPREVISIBILIDADE



Num sistema tão complexo,

Não afasto

A impossibilidade do destino

Pela imprevisibilidade do acaso.

Talvez, seja um desatino.

Todavia, é o que eu acho.

A verdade não está no que eu faço.

Mas naquilo que imprimo.

Qual seria o meu caminho?

Qual o meu próximo passo?

O exemplo que eu sempre examino

É a maneira que termino

Um poema inacabado.











POR ALGUM MOMENTO



Deixo em mim,

Variar o tempo,

Quando lembro

Do que prometi.

Não acaba, todo o sofrimento.

Mas se torna ameno,

Por algum momento,

Sinto ser feliz.











LÁGRIAM TARDIA



Sou a lágrima tardia,

Do arrependimento em vão.

Não seria solução,

Por ser vazia.

Não por falta de emoção,

Mas, pelo mero perdão

Que não teria.











ENTRE AS FALHAS DO ASFALTO



O meu sorriso é forçado.

O meu gesto acanhado

Ante o mundo que me cerca.

Encontro a porteira aberta

E me dispo do roçado.

Sou um fruto descascado

Que a cidade não conserva.

Estou seco, desolado.

Entre as falhas do asfalto,

Acho terra.

Finco meus pés no passado

E me sinto ainda, cercado

Pelo mato e pela erva.













E NUNCA MAIS



Quantos sonhos já tivemos

Sem poder concretizar?

Quantos ais,

Quantos momentos?

Tantas dores, pensamentos

De que eu ia me curar.

Não importa quanto tempo,

Esta é minha despedida.

Quantas noites mal dormidas

Para ver a minha vida

Se esvair?

O mais difícil em partir,

É ter que olhar para trás

E saber que nunca mais

Vou poder vê-la sorrir.













FRAGMENTOS DE MEMÓRIA



Seu sorriso não provém de fingimento,

Sua dor não o incomoda.

A verdade

É apenas fragmento

De sua débil memória.

Sua voz,

Mantém presa no silêncio

Que seu lábio acomoda.

Está parecendo agora,

Um louco que comemora

Seu sofrimento.













EXISTENCIAL



Somos a memória de uma vida

Existencial,

O bem e o mal

Numa condição real

E reprimida.



Somos uma versão colorida

Do status social,

Padrão estético normal

De uma verdade merecida.



Somos ilusão na despedida,

Uma forma espectral

Numa visão estrutural,

Matéria orgânica apodrecida.



Somos uma lembrança dolorida

Que por ser especial

Toma âmbito universal.;

Numa criação mental,

É imortal e indefinida.











SIMPATIA



Os meus olhos

Sepultaram a timidez que em mim

Havia.

O que tenho hoje em dia

É enfim,

Só simpatia.

Olho cada intimidade

Sem escrúpulos, com vontade

E a mais explícita malícia.

Minha boca diz: Delícia!

Nada mais me envergonha.

Descobri que dessa forma é que se ganha

Simpatia.













RACIONALIDADE PERVERTIDA



Mergulhado na profundidade

Desse mar de lágrimas,

Sou uma charada

Pensativa.;

Tão ativa

Quanto um vulcão em larvas.

Desgraçadamente intuitiva,

Minha racionalidade pervertida,

Extirpou o meu direito de cuidar

De mim mesmo.

Sou sobejo do que há.











ALUCINANTE



Não foi tempo bastante

Para saber quem eu era.

Talvez, fosse quimera

Ou uma mera

História distante.

Não importa o instante,

Já sou húmus da terra.

Brota em mim uma erva

Verdejante.

Um maluco inconstante,

Masca um pouco de mim.

Sou enfim,

Alucinante.













ÚLTIMO ABRAÇO



Por que é tão curto,

Se é tamanha a intensidade?

Ainda luto

Para voltar a realidade.

Eis que o cansaço

Retém-me no chão de areia.

Preso na teia

Do seu último abraço,

Sob as estrelas,

Tenho o rosto contemplado

Pelo riso inacabado

De tua surpresa.













AMO



Amo com temor,

Sem fantasia,

Como jamais, amaria,

Esse alguém.

Amo sem arroubos de alegria

Qual a noite ama o dia

Que a tem.



Amo também,

Esse amor que não teria.;

Não por mera covardia,

Mas por sê-lo

De outrem.



Amo quem mantém

O meu segredo

De amar a quem

Por medo,

Já não ama mais ninguém.













O REFRÃO



Não consigo por os pés no chão

Pela ilusão

De que sou sonho

E que componho

Uma breve canção,

A que disponho.



Que em nota singular,

Acompanha o refrão

Numa língua que não há

Mais tradução.



Lentamente, ressuscita

Minha débil razão.

Numa mão,

A caneta ainda grifa.

E diviso na escrita,

O refrão.













AMIZADE E CARINHO



Não esqueça de olhar as estrelas,

Antes que não mais perceba

Que amar é de alma.

Ser feliz é um estado de graça,

Onde o riso é um passe de mágica

Que a vida almeja.

Não se veja

Enquanto se espelha

Na vaidade.;

Pois que amar

É honrar a humildade,

Não importa quem seja.

As pegadas que ficam na areia,

Não demarcam o caminho a seguir.

Mas, mostram que alguém por ali,

A pouco caminhava.

Dessa forma, a verdade consagra:

Nunca estará sozinho.

Ao amar,

Haverá na estrada,

Na medida exata,

Amizade e carinho.











AÇÕES VERDADEIRAS



Não velemos o nosso fracasso,

Se há espaço

Sobre nossas cabeças.

A esperança,

Talvez não prevaleça

Ao que a vida é de fato.

A miséria é mais que embaraço,

Um fiasco à nossa nobreza.

Não selemos a mente estreita

Enquanto abrimos os braços.

Sepultemos o que temos de falso

Com ações verdadeiras.

















POR NÃO MERECER



Toda noite,

Eu deito ao seu lado

E fico a esperar,

Entre um beijo, um breve abraço

E uma canção de ninar,

Você adormecer.

A janela

Ainda aberta,

Me faz perceber

Que a lua ilumina

O sorriso de quem sonha

Com o mundo que vê.

Fecho os olhos

E me ponho a pensar no porquê

De ver esse mundo mudar,

Sem poder alcançar

A inocência de ser.

Às vezes, sem nem mesmo perceber,

Temos a resposta.

Mas viramos as costas.

Talvez,

Por não merecer.











TALVEZ NÃO DÊ RESPOSTA



Não encontro forças

Para tomar a frente

Dessa dor calada.

Juventude postergada

Por um amor ausente.

Um mal-humor crescente

Que deságua em lágrimas.

Vista embaçada

De um olhar descrente,

Enquanto a carta estende

A mão que me sufoca

Numa decisão recente.

Quem não me compreende,

Talvez não dê resposta.













IGNOTO



Um incógnito

Na equação do pensamento,

Que em silêncio,

Ante o vislumbre antecipado,

Chora por dentro

E permanece em si calado

Por ser velado

Pelas dores do seu tempo.



É ignorado

Pelo descuido de momento,

Na inevitável

Propensão de ser pretenso.

Tão caroável

Ao inexorável sofrimento

De seu ser inominado.















LOUCO SORRIDENTE



As horas inerentes

Ao dia

Em que a esperaria

Longamente,

Por trás da grade fria

Onde meu corpo ardia

Por esse amor premente,

Deixaram minha mente,

Senão vazia,

Minguada à tristeza evidente.

Por esse amor demente,

Em asas imponentes,

Voaria.

Quem sabe, assim, seria

Um louco sorridente?















SEM PRIMAVERA



Com a neve que cobre o chão, a erva,

O herbívoro

Por fome, é extinto.

O carnívoro

Que segue seu instinto,

Se afasta do abrigo

Da caverna.

Já não há uma caça

E ele espera.

Porém, morre pelo frio que o congela.



Eis que o homem agoniza no silêncio,

Onde o vento

Anuncia a desgraça,

Consciente por saber que é a causa

De não ter mais primavera.

Nessa hora, olha os corpos que ainda vela,

Com as mãos sobrepostas aos ouvidos,

Ainda escuta os clamores e gemidos

Que ecoam dessa terra.











SELVAGEM



Quem pode ser

Nessa vida,

Que enquanto lambe a ferida

Tenta ao inimigo esquecer?

Na certa, não é humano,

É um selvagem insano

Que morre sem perceber.















SÓ POR VOCÊ



Não vejo uma razão para correr,

Ter tanta pressa para um fim

E mesmo assim,

Ainda esperar para morrer.

Se quer saber,

Estou falando de você

E não de mim.

Se hoje, não, tende a dizer.

Talvez, amanhã, diga sim.

Se nunca puder responder,

Seja você,

Só por você,

E não por mim.















HUMANOS II



Todos dormem,

O que fazem em seus sonhos, agora?

Quem se acorda

Faz plano

De não ir à escola.

São os lobos

Que caçam lá fora,

À procura de anjos

Que perdidos em meio à escória,

Se tornaram humanos.















ATÉ O ÚLTIMO TROCADO



Quem são os homens

Que acreditam na decência de seus mitos?

Que ficam ricos

Sobre o medo do pecado.

Os castigados,

Ainda têm o prejuízo.

Mas em seus risos,

Acreditam estar salvos.

Somos escravos

De uma fé que não é justa

E que nos custa

Até o último trocado.





POR DEMAIS



Quero debulhar minhas angústias

Na esteira da saudade de meus pais.

Não quero mais

Que reaver minha conduta,

Pois minha culpa

É herança de ancestrais.

Aos demais,

Eu deveria uma desculpa.

Quem sabe, a última

Ou apenas uma a mais?

Entre meus ais,

Há um grito de quem luta

E que sofre por demais.

















BATEAR



No batear da bateia,

Só veio ouro.

Senti-me um tolo

Por procurar.

O que esperava encontrar

Além de posse e poder?

Em troca iria perder

O meu poder de sonhar.

Melhor que ouro é viver

Sem nunca se deixar vencer

E aproveitar o prazer

Que é ao seu sonho buscar.

Devolvo o ouro ao lugar,

Sem padecer.

E volto a batear.













PRIMOGÊNITO



Foi Jesus, crucificado

Por um ato ciumento.

Posto, o Diabo

Ser de Deus, o primogênito.



Paz na terra

Entre os filhos condenados

Que por deuses venerados

Se tornaram violentos.



Filhos que estão na terra,

Perdoai as vossas ofensas.

Embora não tenham na certa,

Revogadas as vossas sentenças.















Parasita



No parasita

Que habita o meu corpo,

Sou parte morto,

Sou parte vida.

No patogênico universo,

Entre as víceras,

Leva meus dias

E a vontade de comer.

Mas, quem é esse que pra sobreviver,

Destrói a casa que habita?

Sou hospedeiro,

Em proporção ao mundo inteiro,

Sou parasita.















O ARCO-ÍRIS



Ao despontar no céu,

Entre cores, se desperta

O arco-íris.

Os raros pingos tocam o velho telhado.

Mantenho a janela aberta

E meus pensamentos livres.

Saio à calçada

Enquanto a brisa

Alicia meus cabelos.

Acaricio a cabeleira assanhada.;

Umedeço os meus dedos.

Volto à sala,

Observo ao espelho

Uma imagem solitária.

Não tenho medo.

Dentre a solidão da casa,

A companhia que me basta

É o que escrevo.















GRANDE EXEMPLO



Vejo, ouço e falo até demais.

O perfume das rosas eu exalo.

Movimento meus braços.

Sigo em paz.

Mas, jamais aos outros.

Sob a chuva, eu corro feito um louco.

Muitos acham que é pouco.

Acho coisa demais.



Mesmo que ELA me tolha os movimentos,

Estarei aqui dentro,

Vivo, em meu pensamento,

Tal a dama que em versos se desfaz,

Movimenta seus olhos e assim, traz

A certeza de ser um grande exemplo.















ARTE LITERÁRIA



Posso não ser a florescência pensativa

Nesse século que passa.

Quem sabe a vaga

Que não fora preenchida

Numa anônima academia,

Na cadeira isolada?

Minha palavra

Pode ser aborrecida.

Minha escrita,

Poesia desvairada.

Mas com certeza,

Nado contra a correnteza

Nessa arte literária.









TRISTE COMPANHIA



A solidão não me conforta.

Porém, compensa com o sossego.

Além da porta,

Está a dor e o desespero.

A violência traz o medo

Que é minha triste companhia.

Ainda é cedo,

Já vejo amanhecer o dia.

Há uma multidão lá fora,

Que a toda hora

Se digladia.

Eis que sair, não poderia.

Pois que eu seria,

Mais uma triste companhia.













ANTIGAMENTE



Cada lembrança traduzida em minha mente,

Me arrasta ao passado.

Estou fadado

A viver de antigamente.

Quando meus olhos

Tinham um brilho diferente

E o mundo à frente,

Queria ser conquistado,

Era tão mágico,

Mesmo sendo inconseqüente.

Sendo inocente,

Nada parecia errado.

Hoje, ilhado

Por recordações frementes,

Estou fadado

A viver de antigamente.













TREPADEIRA



O amor que sinto é tanto

E dessa maneira

Me mantém aprisionado

Àquela que amo

Tal qual planta trepadeira

Que a vida inteira

Permanece presa ao canto

Onde fica o jarro.

Esse amor requer cuidado

Pra não se tornar lembrança.

Como o jarro na varanda,

Tem que ser sempre regado.













IMPÉRIO



Otávio tem o título de Augusto.

De Roma, é o primeiro imperador.

Tibério continua os seus planos.

Calígula eleva o seu cavalo a cônsul

E é morto pela guarda que criou.

Cláudio assassina Messalina.

Envenenado pela Agripina,

Tem Nero como o seu sucessor,

Que inimigo público se tornou

Quando incendiou a Roma antiga.

Em meio a revoltas e intrigas,

Vêm Galba, Otão, Vitélio em um ano.

E segue-se a eles, Vespasiano

Que enfim, estabiliza a economia.

Seu filho Tito, o sucederia,

Inaugurando o Coliseu romano.

Eis que Pompéia e também Herculano

São pelo Vesúvio destruídas.

Domiciano finda a dinastia.

Dos Flávios, é o último imperador.













AMALUCADO



Sou um pássaro que voa sobre o trigo.

Em um grito,

Um esquisito espantalho.

Um retalho

Na estaca, esquecido.

O sorriso

De um menino amalucado.

Um bocado

Numa boca, mal comido.

Um gemido

De um corpo esgotado.

Sou velado

Em um corpo apodrecido

E no lixo,

Mais um resto abandonado.











OBITUÁRIO



Entre quatro paredes de uma estreita cela,

Redigi meu obituário

Numa página amarela

De um antigo calendário.

Minha idade, eu esqueço.

Sem endereço, sem nome.

Causa mortis, desconheço.

Quem sabe medo ou fome,

Solidão, ou desespero?

Afinal, o que seria?

Qual o motivo verdadeiro?

Só sei que morri primeiro

Que minha louca poesia.















TODAS AS PALAVRAS



Todas as palavras são silêncio,

Mesmo quando são pronunciadas.

São um turbilhão em pensamento.

Em pouco tempo,

De soberbas a aviltadas.

Podem ser sinceras,

Também fingimento.

E sem argumento,

São silenciadas.

Mesmo quando são pronunciadas,

Todas as palavras são silêncio.













ESSÊNCIA LITERAL



Não sou essencial.;

Mas, sou lembrança.

É minha esperança,

Ser real.

Se no material,

Ninguém me alcança,

Que eu seja,

Enfim,

Essência literal.



















AVESSO



Em meio a solidão,

Sou companhia.

Na evidente vida,

Ilusão.

Numa reflexão,

Só exagero.

O desespero,

Quando mansidão.

Em plena perfeição,

Sou o defeito.

Se sou na retidão,

O erro.;

Talvez, seja no erro,

A exatidão.

Seria eu, apenas o avesso

De minha própria imaginação?















O RISCO



Não feche os olhos ante o perigo

E serás impelido

A sobreviver.

Na vida, só há um sentido,

O de manter-se vivo,

Não importando o porquê.

As rosas de um jardim florido.;

As dobras de um papel machê.;

O abraço de alguém querido.;

Aquilo que nos dá prazer.;

A emoção de um sorriso

E a plenitude do querer.

Tenha certeza que tudo isso,

Vale correr o risco

Que é viver.















ENTRE NÓS, EU E VOCÊ



Tanta coisa

Pode se perder no tempo

Entre a vida e o pensamento,

Entre a razão e o querer,

Entre o sorriso e o lamento,

Entre nós, eu e você.



Tanta coisa

Não se pode compreender

Entre a dor e o prazer,

Entre o chão e o firmamento,

Entre o ser e o não ser,

Entre nós, eu e você.



Tanta coisa

Entre nós, eu e você.













FELICIDADE



A felicidade

É mais que um sorriso,

É um compromisso

De todos os sentidos,

Com o coração.

Mesmo em solidão,

É aquela sensação

De que estamos vivos

Em toda nossa extensão.

É manter a mão

Estendida aos amigos.

É melhor que isso,

Abraçar na escuridão.

É o menor grão

Ter valor enaltecido.

O menor motivo,

Valer sua atenção.

Felicidade, então,

É mais que devoção,

É ser o próprio mito.











O ÚLTIMO SOBREVIVENTE



Vento

Na imensidão passiva

De um lugar sem alma.

É nessa área

Que meu coração habita.

De dias quentes,

De noites frias,

É um capricho a aridez que me acalma.

Entre as montanhas do desterro,

Caminha a esmo,

O último sobrevivente.

Um oásis me separara

Em solidão perdida,

Em companhia ausente.













MEUS MORTOS



Meus mortos

Acompanham a jornada de meus dias

Com a mesma ousadia

De seus ossos

Que entre escombros e destroços

Silenciam

A oração de meus remorsos.























FONTE QUE CATIVA



Sigo a direção

Que o meu coração indica

E sigo à risca,

A doutrina do querer.;

Mesmo que a razão não possa crer,

Quando o desejo me suplica:

Venha viver!

O amor é fonte que cativa

E para sempre escraviza,

Quando há vontade de beber.





















REDEMOINHO



Minha solidão é passageira

Qual poeira em espiral

Que arrasta no redemoinho,

As mágoas que andam em meu caminho,

Para o denso matagal.

Sinto falta de ficar sozinho

Qual solitário passarinho

Que ainda pousa no varal,

Que apesar de ser mansinho,

Com a algazarra dos meninos

Voa, afinal...

















APARÊNCIAS



Apenas dissimulo

A sofreguidão

Em meu sorriso.

Enquanto isso,

Insinuo ao coração,

Que fingir é preciso.

Enganar a mim mesmo,

É o único meio

De suportar tamanha dor.

A ninguém é segredo

Que é preciso primeiro,

Recobrar seu valor.













CIPÓ



Não sei ir só,

Na ilusão de meus passos.

O meu fracasso,

Todos já sabem de cor.



Eu sinto o nó

Que ainda prende meus braços.

São seus abraços

Que tomam forma de laços

De um enorme cipó.













VELADO



Eis que em sonho

Se revela,

O meu mundo condenado.

Onde o verde do cenário

Num piscar de olhos, seca.

Vejo a terra,

Um deserto desolado.

Acordado,

Vejo um ancião velado

Por um anjo preocupado

Com a solidão que o espera.





















Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui