Tenhos dois vícios irremediáveis: o cigarro e a cerveja. O da cerveja, por sinal, se confunde com o da necessidade de jogar conversa fora no "Pub" do Carlão (na verdade, um boteco tradicional, daqueles onde se descansa o cotovelo no balcão e onde se disputam calorosas partidas de dominó). Isso sem contar as manias, como a de acomodar as notas na carteira por ordem de valor. Se bem que está difícil achar uma nota de cem, ultimamente. Outro hábito que tenho é aparar o espirro com a mão esquerda, mesmo sendo destro. Quem me ensinou essa mania foi meu tio Alberto. Dizia que, agindo assim, evitaria o desconforto de ter de apertar a mão de alguém e, de quebra, presenteá-la com uma porção de vírus. O que era uma simples lição de boas maneiras acabou se tornando um vício, de tanta repetição. E, ontem, descobri que tenho mais um, para desespero da minha mulher.
- Já não bastava esse bafo-de-onça, agora mais essa?
Um comportamento bastante comum dos viciados é gravar datas. "Parei de fumar dia tal. Fiquei abstinente tantos anos, tantos dias e tantas horas. Voltei na semana passada." Eu também sou dado a essas coisas. No dia 28/07/2000 publiquei minha primeira crónica na Internet. De lá para cá a periodicidade dos textos só foi diminuindo. Ao ponto de ficar atento a qualquer movimento ao meu redor, querendo um simples motivo para pegar a caneta e a folha em branco. Nessas horas, para bem da verdade, fico louco para ter um notebook daqueles bem levinhos, cheios de potência e recursos e com autonomia para umas oito horas. Nem sei se isso existe. Mas, de qualquer modo, a grana está curta e eu não teria mesmo como comprar. O próprio Carlão anda reclamando que eu devia trazer o material de casa, pois vivo lhe pedindo papel, caneta e opiniões. "Vai me colocar como co-autor, cretino?" Sábado foi dia em que bastou eu ouvir um nome e associá-lo a uma história meio verídica, meio inventada - característica marcante da crónica. Saiu "Vira-casaca". Outro dia vi meu filho apontando lápis e corri para o caderno espiral escrever "Lápis de cor". E os dias vão se passando, mais idéias vão brotando e a esferográfica não consegue dar conta. Até deixei de lado o romance que estava escrevendo. Simplesmente porque, no meio de um capítulo, estalava uma vontade tremenda de fazer uma crónica sobre aquela passagem. Pode?
- Abri uma cervejinha para nós, amor - convidou-me Maria Lúcia.
- Agora não posso. Estou escrevendo... o álcool tira a coordenação das idéias.
A pobre voltou para a cozinha, bandeja e tulipas nas mãos. Não disse mais nada. Mas acho que preferia meus outros vícios. |