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Contos-->O GRITO DO MAR -- 07/02/2001 - 02:49 (Julianna Granjeia Silva) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O GRITO DO MAR

Naquela época deveria contar com uns 20 anos, não me recordo ao certo, tenho certeza apenas que eu não tinha convicção de nada. Mas tudo estava calmo, o trabalho, o mar, os estudos, a brisa.
Era quarta-feira, por volta das seis e meia da tarde e resolvi não ir ao cursinho mesmo sabendo que perderia aulas importantes. Os exames se aproximavam.
Entardecia, o sol avermelhado ia se pondo tranqüilamente no horizonte do mar e eu vagava lentamente no calçadão da praia, sozinho. Aquele dia havia levantado diferente, estranho, com uma certa nostalgia que não tinha percebido até então o seu motivo.
Caminhava lentamente, observava tudo fixamente, mas ao mesmo tempo era como se não enxergasse nada. O trânsito estava como de costume, péssimo. O som das buzinas ecoavam como uma terrível sinfonia de uma orquestra desafinada, sem maestro.
A lua já estava alta, cheia, o céu estrelado, lindo. Poderia servir para de inspiração para mais um dos meus ensaios teatrais, bobagens que eu escrevia, coisas sem grande valor. Era o que eu achava, pelo menos. Mas já havia algum tempo que eu não conseguia passar nada, nenhuma idéia sequer para o papel. E as folhas em branco, molhadas somente, me sufocavam.
Passava em frente do barzinho que costumava freqüentar aos finais de semana com meus amigos, quando resolvi entrar e beber alguma coisa. Quem sabe assim não conseguiria escrever algo que colocasse fim nessa minha angústia. Foi o que pensei, não passava pela minha cabeça como este gesto foi decisivo pra mim.
Encontrei alguns amigos na mesa de fora, não muito íntimos, mas que poderia sentar-me com eles. Cumprimentei todos e preferi sentar sozinho dentro do bar. Pedi uma dose de whisky e alguns versos começaram a surgir na minha cabeça. Resolvi arriscar escrevendo-os no guardanapo mesmo. Nunca os esqueci, eram assim:
" Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e paz que mereço
Que essa tensão que me corrói por dentro
Seja um dia recompensado
Porque metade de mim é um vulcão
Que o medo da solidão se afaste
E o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável "
Mas foi só este trecho, pedi outra dose, não consegui terminar, se é que tinha começado alguma coisa. Pedi uma cerveja. Percebi que tocava Gita do Raul Seixas. Ao invés de me sentir melhor, me sentia mais angustiado. Pedi outra cerveja. Tentei imaginar que horas seriam, mas estava totalmente sem noção do tempo, talvez sem noção alguma de coisa nenhuma.
Resolvi ir embora, pedi a conta ao garçom. Levantei, estava trêmulo, sentia muito frio, mas continuei a caminhar pelo calçadão, já não sabia se meu tremor era devido a bebida ou ao frio.
Tudo girava, sentia meu estômago remoer-se. Não distingüia mais nada, só conseguia avistar o mar ao meu redor, me cercando por todos os lados, cada vez mais próximo. O barulho das ondas estourando me assustava, mas ao mesmo tempo pareciam me chamar.
Meu passado, que eu pensara ter enterrado, renasceu em minha memória subitamente. Meu pai , preso por assassinato, minha mãe prostituta em alguma dessas favelas, eu...abandonado.
Mas tinha superado tudo, era o que eu achava. Trabalhava, já tinha até me formado. Meu único problema era a recaída pelas drogas, de vez em quando. Mas hoje em dia isso é muito normal, e além disso eu me controlava.
Lembrei que ainda tinha um cigarro de maconha no meu bolso, tinha ganhado de um amigo. Não gastava mais dinheiro com isso.
E o mar avançava, queria alcançar a lua mas a cada momento ela mudava de lugar, fugia de mim, e ficava cada vez mais longe. O chão estava mole, não sei se estava na areia ou no calçadão ainda, sei que mal podia andar.
Parei em uma das frentes do mar, mas tudo continuava rodando. Percebi que ria, gargalhava, sozinho, mas também chorava, soluçava. Caí no chão, deitei, senti a água estupidamente gelada molhando meu corpo. E fiquei ali, atônito, parado, olhando para o nada.
As ondas continuavam a me chamar, mas agora elas gritavam mais alto. Resolvi levantar. Com muito custo fiquei em pé, fui caminhando ao encontro delas, senti a água cobrindo meus pés, minha barriga, meu peito. Queria desesperadamente descobrir de onde vinham aquelas vozes.
E a água cobriu todo o meu corpo.








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