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Artigos-->O medo -- 21/10/2002 - 11:24 (Don Pixote de la Pança) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
“O medo



DENIS LERRER ROSENFIELD (*)



Hobbes e Hegel ensinavam que o medo é o início da sabedoria. O corpo e a alma tremem diante de algo que surge como ameaçador, algo que pode pôr em questão aquilo que mais prezamos. E o que mais prezamos em relação a nós mesmos encontra sua condição de possibilidade na cena pública, na constituição mesma do Estado. Apesar das aparências, o medo não é somente um sentimento privado, porém público, decorrente do necessário enfrentamento pela liberdade.



Regina Duarte, durante a propaganda eleitoral, teve a coragem de expressar sua opinião e seus temores diante de uma eventual vitória de Lula. Ela só verbalizou o que muitos pensam e não têm a coragem de dizer. Exercitando um direito seu, expôs suas idéias, fundadas nas próprias incoerências e contradições dos discursos de Lula. Nos últimos meses, presenciamos que o PT ora acende uma vela para um santo, ora para outro. Num mesmo dia, o candidato se derrama em elogios à Confederação Nacional da Agricultura e ao MST. Os discursos não foram, porém, apenas diferentes, mas contraditórios.



No transcorrer de semanas ou meses, observamos, de um lado, elogios à Fiesp e à Febrabam, de outro, à CUT e ao Sindicato dos Bancários. Os propósitos também foram divergentes. Remontando no tempo, elogios às Farc e a Cuba e proposta de não-pagamento da dívida externa. Hoje, "afastamentos dos revolucionários" e defesa dos contratos. Que Lula responda que se trata de algo próprio à "evolução da espécie" não deixa de suscitar um temor: será que estamos diante de um mero jogo de palavras ou de uma transformação real?



As reações suscitadas foram, no entanto, significativas. Uma pessoa que externou uma opinião política foi imediatamente diabolizada e execrada por alguns, como se tivesse cometido um pecado irremissível. É curioso, pois, quando intelectuais e artistas apóiam o PT, eles estariam apenas emitindo uma opinião correta, boa e virtuosa. Os que se afastam dessa trilha são tidos por desviantes. O PT, ademais, deu-se ao luxo de recorrer ao Tribunal Eleitoral, procurando calar essa voz discordante. Ora, se a maioria dos artistas e intelectuais apóia o PT, por que iremos tolerar essa voz crítica?



Silêncio para ela! De preferência, que se retire da vida pública!



Infelizmente, nada disso é novo. Trata-se de um procedimento político conhecido e já posto em prática em vários lugares do Brasil. A cena é simples. Ato primeiro: desqualifica-se aquele que discorda da posição partidária, situando-o entre os que se afastaram do bom caminho. Como a ideologia petista pauta o que deve ser feito, a sua crítica é vista como perigosa. Para afastar o perigo, o alvo a ser atingido é a pessoa que emitiu uma tal opinião. Surgem assim os epítetos de "neoliberal", "direitista" e "reacionário", entre outros, que são versões tupiniquins para designar os hereges, os infiéis e todos os que professam outros credos ou, apenas, pensam diferentemente.



Ato segundo: o PT alça mão de processos judiciais em que, literalmente, o objetivo reside na criminalização da opinião. Assim, por exemplo, no Rio Grande do Sul, onde o partido está no poder, há mais de 30 processos contra jornalistas e intelectuais. Estes são, desta maneira, coagidos e intimidados, levando muitos deles a uma espécie de autocensura. Alguns ficaram com medo, sim: pararam de escrever em jornais ou se censuram cotidianamente. É esta a liberdade tão apregoada pelo PT? Foi isto o que Lula quis dizer quando afirmou que o Rio Grande do Sul é uma vitrine do Brasil?



Os que criticam e denigrem Regina Duarte podem ser as vítimas de amanhã.



Basta mudarem de opinião ou seguirem um outro caminho. O patrulhamento causa medo, o medo de imposição de um pensamento único, o temor legítimo de existência de uma sociedade livre e democrática. Para além da solidariedade a Regina Duarte, está em jogo algo bem mais fundamental, como se a solidariedade pudesse ter acima dela algo mais valioso. Há, sim, algo mais fundamental, o direito de expressar a solidariedade, pois as condições de exercício do direito de opinião, de pensamento e de imprensa se encontram dentre aqueles valores cuja abdicação pode ser fatal.





(*) Denis Lerrer Rosenfield, professor de Filosofia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, com Doutorado de Estado em Filosofia pela Universidade de Paris, é autor, entre outras obras, de Hegel (Jorge Zahar Editor, Coleção Passo a Passo) e editor da revista Filosofia Política, da mesma editora E-mail: denisrosenfield@terra.com.br”





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