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Contos-->Solicitude -- 09/11/2006 - 12:21 (Ed Carlos Bezerra da Silveira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Solicitude

Envolvi-me na plenitude do surrealismo. Afundei-me em minhas dores, meus pensamentos dispersos, solitários e indecisos. Mergulhei na ilusão.
Eu vi uma rosa balançar em seu interior. Tão desenxabida e amarga... Sua lucidez infinita era a saída de um medo em que eu estava metido. Eu estava à procura da liberdade.
A rosa encontrava-se desenxabida; achava-se amarga. Balouçava para o nada; uma coisa nula, cheia de esperança inexistente. Acenava como se alguém lhe saudasse a uma distância tanto longa como irreal; uma saudade sinuosa, elegante, onde vários sorrisos caminhavam como caminha a maioria de nós: na estepe obscurecida, onde não há porta alguma a ser aberta. Achava que alguém estivesse dizendo coisas lindas sobre suas imaginárias pétalas. Estas exalavam um aroma inebriante, envolvente. Mas na verdade era um aceno de saudades perdidas, de lembranças chorosas, faltosas; daquelas que arrancam lágrimas gordinhas e salgadas dos nossos úmidos olhos, que nem sempre sabem o que enxergar.
A volição de aprender e descobrir o que existe no mundo, nas coisas.
O pior é que acreditei em tudo. Eu lá, olhando-a tão vitimada por causa do “erro’’ de ser feliz.
Acordei com a barba chicoteando meu velho e esfalfado peito, que batia tão faltoso, em ritos, quase parando, devagar; tão mansinho o meu peito batia, que quase eu não ouvia o tiquetaque de um coração que me dava dó. Este caminhava tão lento, tão fraco, quase pausando...Muitas vezes acreditei que ele não viveria o tanto que eu ansiava viver. Eu não consigo entender muitas das ocasiões em que me encontrava em demasiada saudade; uma depressão que eu sentia. Acho que na verdade era a saudade-melancólica de algumas pessoas que nunca conheci, que jamais toquei e, muito menos, pude amar. Uma urticante lembrança. Queria vê-los. Alvitre que me tomava por completo às vezes. Eu me embriagava numa dor um tanto incômoda e surreal, pois eu não parecia estar vivendo esta angústia, mas ao mesmo tempo, fazia sofrerem em mim saudades vazias. Eu queria sair correndo, gritar por socorro. As minhas lágrimas já não me serviam mais como uma fuga. Elas grulham comigo agora. Eu me atirava nos meus rios lacrimais e salgados, para tentar me confortar, me entender; fugir de mim. Era incrível como tudo me causava um vigor-sufocante e tenebroso. Tenho vasto medo de tudo que faço. Estou morrendo. Sei muito bem quando nada já me faz bem. Nem as folhas que outrora me fizeram ter pensamentos filosóficos. Nem os pássaros que não brincam mais rente aos meus olhos. Pássaros lindos e enxeridos.
Eu me deslumbrava com a ligeireza de suas pequeninas asas, cortantes e frágeis. Eles nem me cantam mais. Talvez pela falta de tudo em mim. Quem sabe deixaram de uma vez de me convidar para as suas atraentes poesias que tantas vezes me envolveram e transcendiam meus pensamentos já sufocados e mortos? Todos os meus aforismos estavam enterrados na minha mais profunda interiorização, que eu mesmo criei. Vivendo sempre uma outra pessoa em todo amanhecer.
A cada dia em que mudávamos eu e o espaço que eu absorvia, me preocupava muito em saber quem eu era. E hoje já falecendo, com olhos tão encovados e sumidos, com uma pele tão enrugada e inútil, de pernas hoje que não mais obedecem como antigamente, subindo, descendo, fazendo traquinagens tento me entender; achar-me lá no fundo. Não sei se importa muito.
Minhas poesias soam velhas, enfastiadas; esgotadas mesmo, por causa da minha falta de personalidade. Às vezes acho que morri em excesso; demasiado tempo perdido e, com o tempo confuso, eu matei o meu amor; um amor que assumia uma superioridade gostosa em mim. Um versar poético e deslumbrante, onde eu arrancava sem piedade, sorrisos dos lábios gostosos da mulher. Extraía sorrisos de muitas. Amo-as todas! De um amor simples e não carnal; um amor platônico, quase um amor de filho e mãe, quase. Sempre acreditei na emancipação da mulher. Sempre as apoiei em tudo. Mesmo quando sabia que elas estavam “erradas’’! Hoje eu as vejo, muitas, perdidas na própria liberdade que tanto lutaram para conseguir.
Uma alegria eu possuía no meu cantar; nos meus versos de amor eloqüente, sem complexo de nada, sem medo de viver, extasiando-me com vontades adolescentes, de uma criança peralta, traquinas, nos mares flamejantes do amor, da vida; deliciava-me na exultação supina que existia em mim. Recitava tão ardorosamente minhas letras, que até as crianças entendiam o meu amor infante. A afabilidade que se encontra tão cansada e sufocada agora em mim, eu a vivi gostosamente outrora, quando ainda era uma criança crescida.
A cadeira onde estou sentado balança sossegada, branda, gostosa. O fogo da lâmpada ilumina-me feroz, sinto-me bem.
Ao meu lado, deitado, respirando serenamente, meu cachorro.
A velhice me tomou de uma vez e só agora tento debater comigo o que a vida significou.
Vagarosamente eu ouço a respiração do meu cão. Está todo encolhido. Pretendo acender um cigarro, mas não acendo. Sinto-me prostrado. Não quero causar-me intranqüilidades. Meu corpo está quieto, acalmado.
Acordei em susto. Os meus globos oculares estão estabanados e percebo a profundidade em que eles estão envolvidos. Almejo muito saber o que são os sonhos. São tão irreais, mas tão reais que me perco dentro deles, sempre!
A rosa desfila. Ela desfila muito bem. Desperta em mim todo dia. Apenas porque ela é imortal. Eu quero sentir a imortalidade. A vida é viver sempre e mudar de personalidade todos os dias, até eu encontrar o sentido do nascimento. Ninguém tem personalidade. Somos todos estranhos, não nos conhecemos.
Quando eu descobrir o porquê de eu ter nascido, poderei morrer de verdade; antes disso, morro um bocado a cada dia, lento, ermo, acre.
Faltou luz. Chove. Uma copiosa dor líquida banha-me de alguma coisa. Sinto-me atemorizado. Meu coração bate impaciente. Terei que acender um lampião que herdei de mamãe. Está velho e funciona à base de alguns cutucões com as pontas dos dedos. Ele causa sombras estranhas que quase não se mexem; sombras a minha frente. Projetos da minha imaginação talvez.
Eu balanço minha cadeira de balanço, de lá para cá, consecutivamente.
Está tudo quieto. Enfim, acendo meu cigarro. Nem vejo os vapores que soltos no ar, riem de mim.
Meu cachorro resmungou. E voltou a dormir. Vou sair. Tenho que me levantar para isso, mas desejo ficar sentado.
O prelúdio dos primeiros raios solferinos anunciou uma manhã de brisas brandas. Os pássaros voltaram a versar suas letras para mim.
Descobri que adormeci pra valer. A noite toda. E durante alguns minutos de meu sono, no prelúdio que anunciei, meu cachorro me lambia a mão. Ela estava pendida e reclamava uma dormência.
Tudo que perfura meu coração perfura minha dor. Se vejo algo que dói em mim, eu choro. Se eu tento entender a vida, acabo morrendo.


Ed Carlos Bezerra.
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