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Contos-->O Encontro -- 13/12/2006 - 10:10 (anderson jose de aguilar) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O Encontro


- Adeus !
Foi com essa simples palavra que o homem de cabelos grisalhos se despediu dos poucos amigos, ajeitou a pequena mochila nos ombros, e partiu em direção a uma terra desconhecida.
O homem de semblante duro, olhar sereno, que revelava por trás de algumas rugas que riscavam a face contemplativa, a força de quem acreditava que havia algo mais na vida que a simples rotina de trabalho da maioria dos homens, começou a caminhar lentamente, com os pensamentos ainda um pouco confusos, em direção à colina que deveria marcar o ponto final da busca que empreendera desde muito cedo.
Estava, é verdade, um pouco ansioso. Lembrou-se do velho que encontrara numa taberna em uma distante vila. Na conversa regada a goles da bebida quente, ficou sabendo que a resposta que buscava, poderia ser encontrada no alto daquela distante colina.
Apesar da bebida consumida em goles no balcão de uma taberna, e da aparência de louco do velho, acreditou em suas palavras e partiu.
Depois de vários dias de caminhada, chegou no lugar que reconheceu ser a colina de que o velho falara.
Do alto da colina olhou em volta e sentou-se numa pedra para esperar aquele que acreditava ter sua resposta. A colina tinha um aspecto mágico, pairava um ar místico.
Enquanto esperava, pensou em toda a jornada que havia feito, nos lugares em que passou, e nas pessoas que conheceu ao longo dos anos. Imagens flutuavam em sua mente como filmes, quando sentiu um leve estremecimento no corpo.
Virou lentamente o rosto e o viu.
Ele surgiu do nada, silencioso, como se fosse parte daquele ambiente misterioso.
Vestia um manto escuro que lhe cobria todo o corpo, e que terminava no capuz que escondia o rosto quase por completo. A face encoberta dava-lhe um aspecto sinistro que causava arrepios, os olhos, de brilho indefinido, tinham uma expressão dura, apesar da estranha serenidade que transmitia.
Na mão esquerda trazia o instrumento que lhe dera fama ao longo dos séculos. Visão que aumentava a sensação de medo, no entanto, era essa a visão que embora assustadora, confirmava o encontro.
Estava ali, diante dele, sem um movimento sequer. Parecia não respirar, apenas o fitava.
Num misto de medo e coragem tentou iniciar a conversa.
- Que queres comigo? - Perguntou.
- Nada.
- Viestes para dar a resposta que procuro?
- Pode ser.
O diálogo começara seco, distante. Não lhe causou surpresa. Teria que estreitar a distancia e fazer corretamente as perguntas, caso contrário, poderia sair daquele encontro como chegou, com perguntas não respondidas.
- Por quê viestes então?
Não houve resposta.
As perguntas não poderiam seguir os caprichos da curiosidade, pensou.
- Viestes para levar-me?
- Não. Vim para guiá-lo por um caminho que não conheces e não podes andar sozinho.
- Por quê escondes teu rosto?
- Não escondo. Apenas não consegue vê-lo.
- Usas um manto que vela tua face e me dizes que não consigo vê-lo? Não compreendo.
- Não me olhas com os olhos que deveria.
Ficou por um instante mudo e pensativo. Naquele jogo de palavras percebeu que ganhava tempo.
Em verdade, seu interlocutor lhe dava esse tempo como se fosse uma chance, antes de cumprir a sentença já escrita. Precisava continuar.
- Com que olhos devo olhar-te?
- Com os olhos do coração. Os olhos da vida.
- Embora não possa ver tua face, eu te conheço.
- Não. Não conheces. Tu sabes meu nome mas não sabes o que significa nem o que sou.
- Tu és a Morte. Aquele que anda envolto pelas sombras do inferno e que ceifa a vida.
Chegas sorrateiro, sem hora, sem minuto, sem aviso. Cavalgas invisível, acompanhado de tua ferramenta horrenda e fatal. Viajas pelo terrível vento do norte escolhendo tuas vítimas, aparentemente sem nenhum critério, a não ser tua insensibilidade para com a vida. Simplesmente chega e ceifa a vida, interrompendo-a.
- Não. Eu não a interrompo. Eu a transformo fazendo cumprir a Lei. Tu me conheces como Morte, mas eu sou a Vida.
Embora não compreendas, sou uma de suas faces.
- Tens razão. Não compreendo. Como explicas a vida interrompida de uma criança que parte no primeiro suspiro,
antes mesmo de ter chegado?
E a morte de um homem que passa toda sua vida praticando o bem, enquanto outro, que passa toda a vida sustentada pela maldade permanece vivo e cheio de regalias, rodeado de subalternos e temido? Existe critério nisso?
- O que chamas de vida é interrompido para que o ciclo possa prosseguir.
- O que chamo de vida é Vida. O sorriso de uma criança, a expressão sublime da mulher que acabou de dar a luz.
O orgulho do velho ao transmitir a sabedoria adquirida ao longo dos anos aos mais novos. O olhar de profunda expressão do rapaz ao ofertar a delicada flor para a moça.
O canto melodioso do pequeno pássaro pousado no galho da árvore. Isso é que entendo como Vida. E é essa a Vida que interrompes cruelmente.
- O que chamas apaixonado de vida, não poderia existir se eu não perpetuasse o Ciclo Sagrado.
- Entendo que Vida é movimento que objetiva ascender a um nível de espiritualidade mais puro, enquanto que a
Morte é o fim, o momento que interrompe esse movimento. Um castigo imposto. É assim que entendo.
- Entendes a Vida com a visão de um mortal no plano de vida material. Quando fazes isso, cometes um erro. A Vida
não se justifica no plano material.
- Como posso ver de outra maneira, sendo matéria e vivendo pela matéria? O que respiro, o que como, minhas emo
ções e sentimentos, minhas ambições, minhas alegrias e tristezas, meus amores e desamores, enfim, tudo que me norteia é matéria. Vim do pó, e para o pó hei de retornar.
Como posso ver de outro modo?
- Teu corpo é matéria, mas não a Vida. Enganas quando pensas viver para a matéria. Teu corpo feito matéria serve
apenas para abrigar teu Espírito. Tua função é permitir a evolução, o que deves entender como purificação, ou elevação. O sopro da Vida não veio do pó. Apenas o corpo físico veio. O sopro da Vida veio da essência do Criador, e é para ele que tu vives. É ele o sentido da Vida.
- Falaste-me de sentimentos e emoções, da criança, do velho sábio, e da moça. – continuou.
Dizei-me:
- Qual o sentido de tais sentimentos, sendo eles passageiros?
O amor que juras pela mulher termina, de uma forma ou outra, quando essa mulher não corresponde ao teu sentimento, ou quando conheces outra mais atraente.
A alegria da mulher no parto termina quando o filho deixa de ser criança, e até mesmo a pureza dessa criança acaba quando se torna adulto ...
- Me deixas confuso.
- À matéria pertence o que é matéria, e ao Espírito o que é Espírito. Está escrito no livro que foi deixado que o joio
não se mistura ao trigo. Entenda que a Vida pertence ao Espírito e não à matéria. Esta, tem uma existência limitada, enquanto o Espírito segue seu ciclo até o Criador.
Ouvindo o que lhe era dito, começou a perceber que a resposta que tanto procurava nascera antes do primeiro suspiro. Nascera junto com ele, ainda no ventre.
Percebeu que ao longo da existência material, esse conhecimento é encoberto por aspirações desenvolvidas pelas emoções e por anseios materiais.
Não respondeu. Não era preciso.
- É chegado o momento. É preciso fazer com que o Ciclo prossiga.
Esta frase ecoou no seu cérebro de um modo estranho, como se estivesse em outro plano. Viu cenas desfilarem
diante de seus olhos numa rapidez que não podia conceber.
Um manto de névoa com um colorido turvo, porém suave, cobriu sua visão, e não teve certeza de onde estava. As lembranças dos últimos momentos começaram a dissipar em sua mente.
Suspirou profundamente, e não reconheceu onde estava. Também não viu mais seu interlocutor.


01/10/2004 Anderson Aguilar
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