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cronicas-->É HORA DE DETONAR O EGOCENTRISMO -- 10/09/2004 - 12:24 (Salomão Sousa) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Após as conclusões do relatório de índice de Desenvolvimento Humano (IDH), da ONU, e de sair da leitura de Os sete saberes necessários à educação do futuro, de Edgar Morin - livro preparado para atender recomendação da Unesco -, fica clara a necessidade de políticas e de investimentos bem direcionados para combater o crescente egocentrismo disseminado no seio da sociedade.
O relatório da ONU reconhece que os resultados das políticas culturais, no Brasil, ajudaram no melhor posicionamento do País no atendimento às questões sociais. Esta cons-tatação complementa as recomendações do filósofo francês para a prática da educação con-temporànea, que tem de estar fundada em quatro pilares: aprender a ser, a fazer, a viver juntos e a conhecer. No desenvolvimento de sua tese, Edgar Morin aponta que estes pilares são efetivados pela consolidação da cultura, que deve ser alcançada com incentivo, plurali-dade e liberdade.
Vivemos num corolário explosivo. O indivíduo, ao pregar excessivamente a impor-tància do "só eu", transferiu para a cultura a obrigação de seguir a política de incentivo ao egocentrismo. Assim, fica impossível saber onde está a fonte da arrogància do ego, se no indivíduo, se nos artistas ou na mídia. Sem se esquecer que, ao apregoar com arrogància o egocentrismo, a cultura deixou de ser cultura para ser uma ferramenta de desagregação social. Basta lembrar que a arte sempre se perde quando pretende ser ferramenta de uma causa. Assim como está em desaparecimento a literatura engajada - e esta ainda defendia a coesão entre os homens! -, é de se prever que vão virar fumaça as correntes musicais que vêm apregoando apenas a existência do eu. Principalmente do eu com direito à prática da violência, à abolição do outro.
Em 1980, Zizi Possi já cantava numa letra de Xixi Motta - alguém com um nome desses não é um compositor, mas um escretor, um egositor - versos de escrescente arro-gància: Agora entre nós dois/Eu sou mais eu. Pode-se observar que a pregação do egocen-trismo nem sempre implica em zelo pelo próprio nome, pois o egocêntrico acaba esconden-do a própria pele, seja atrás de um nome falso, de um disfarce, ou de um laranja.
Em qualquer pesquisa aleatória, fica constatada que a maioria das composições atuais acaba transitando pelas veredas da arrogància do egocentrismo. Nas muitas pérolas de Ana Carolina, sobressai a seguinte recomendação: Vai vê se me esquece/Tira meu nome da lista de telefone, pois o ego pode flutuar sozinho desligado do outro. O Rappa desfia pé-rola ainda merecedora de maior destaque: Hoje eu desafio o mundo sem sair da minha ca-sa/Hoje sou um homem mais sincero e mais justo comigo. O indivíduo pós-revoluções, pelo que se apregoa e canta, quer ficar ilhado, sem compreender que a solução está no confron-to, face to face.
Numa sociedade que está preocupada só com o individual, podendo a qualquer instante detonar o outro, não podemos exigir, a curto-prazo, que a arte volte a trilhar a tra-vessia do humanismo. Fica o saudosismo das canções de Chico Buarque, num momento em que a juventude pregava a união, o sincronismo com a nacionalidade (Quero ficar no teu corpo feito tatuagem). Numa composição para Milton Nascimento, Fernando Brant apre-sentou um hino para toda uma geração que ainda não pensava em pulverizar o outro (Ami-go é coisa pra se guardar/Debaixo de sete chaves/Dentro do coração).
Edgar Morin lembra que o poder imperativo dos paradigmas, das crenças oficiais, ou estúpidas e não-contestadas, das verdades estabelecidas, dos absurdos triunfantes, faz reinar em toda parte os conformismos cognitivos e intelectuais. Assim, na mídia, na música, nos ritos religiosos, assistimos só a validação do eu. Ninguém se revolta ou se rebela em nome da sociedade solidária. Os próprios pais incentivam a validação do eu, a eliminação do outro, pois vivem recomendando aos filhos para não trazer desaforo para casa, para bater na outra face. Os índios sabem muito bem inscrever o humanismo na própria pele. Para tornar-se homem, o jovem índio tem de mostrar algum valor, tem de sofrer alguma dor na própria pele.
Os pais deixaram de inscrever qualquer humanismo na pele dos filhos. E como po-derá fazê-lo se é o primeiro a retornar da rua com sua carga de corrupção, com seu desco-nhecimento do semelhante? Se a generosidade está esfacelada, reina esse corolário de indi-ferença, pois não há mais identificação e empatia com o outro. O egocentrismo não quer ter antagonismos, pois é muito mais fácil - para quem não tem idéias para o confronto - in-vestir-se de valentias carregadas de mentiras, de pólvora, de finas làminas que desapareçam com o outro. É um niilismo futurista. Não se trata mais de eliminar o eu, mas de desapare-cer com o outro.
Mas há o acervo cultural construído pelos antepassados, que não deixará prevale-cer eternamente o egocentrismo - este gesto totalitário de uma humanidade sem ideais. Fica para a parcela da sociedade que não se corrompe a tarefa de reconstrução do huma-nismo. Recorramos à última fala que aparece em Manhattan, filme de Woody Allen, do final da década de 70, período em que a generosidade reconhecia os valores produzidos pelo homem e acreditava no futuro: - Nem todos se corrompem.
Quem não tiver assistido só o final do filme, terá visto que são muitos aqueles que fizeram cultura para o humanismo do futuro. Woody Allen, ali no sofá, lembra as coisas pe-las quais vale a pena viver. E grava para nós os nomes de alguns que fizeram cultura de forma solidária, que, no futuro, estabelecerão nova postura social capaz de levar as pessoas a acreditar umas nas outras. Mahler, Gershwin, Van Gogh, Flaubert...
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