Há muitos anos, conhecido jornalista e conhecido psiquiatra dialogavam em um programa radiofônico. A conversa, correndo solta, enveredou pelas questões religiosas, levando o jornalista a se declarar reencarnacionista e o psiquiatra a professar seu ateísmo.
Até aí nada de mais. Embora crer em Deus seja mais racional do que não crer - pela simples razão de que é mais fácil explicar a existência de tudo a partir da idéia de Deus do que a partir de um Nada criador de tudo – tal crença não é indicativa de suficiente religiosidade. A maior parte das pessoas crê em Deus, mas vive como se Ele não existisse.
Interessou-me, naquela conversa, o argumento “filosófico” trazido pelo psiquiatra: “Deus, se existe, é todo-poderoso. Se é todo-poderoso, pode criar uma pedra; e pode, portanto, criar uma pedra tão grande que nem Deus possa levantar. Ora, se Ele não puder levantar essa pedra, não será todo-poderoso, assim como tampouco o será se não a puder criar. Numa e noutra hipótese, não será Deus.” E, aparentemente, o Senhor tropeçou numa pedra...
A concepção de tais paradoxos era bastante comum entre os filósofos gregos e não sei se esse provém da mesma origem. Mas pareceu-me conveniente analisá-lo em virtude da noção de Deus que nele se contém: um Deus à disposição das tolices humanas. De certo modo, é a idéia presente no ateísmo dos que se recusam a admitir a existência de Deus em virtude de sua aparente passividade perante a perversão dos homens.
Quando afirmamos que Deus é todo-poderoso, estamos dizendo que Ele tudo pode, mas isso não significa que Ele possa fazer coisas tolas, falsas ou maléficas, porque em Sua natureza estão o inteiro bem, a inteira sabedoria e o inteiro amor, incompatíveis com a maldade, a tolice e o ódio. Portanto, não podemos especular sobre a existência e a natureza de Deus com base em premissas erradas a propósito do que Ele seja ou com base no conceito que atribuímos a uma das palavras que possamos usar para O definir.
É fato, porém, que ao longo dos tempos sempre houve intelectuais cujo orgulho tentou reduzir Deus aos limites da sua própria racionalidade. Isso, aliás, é outra coisa que Deus não pode fazer: uma pedra do tamanho do orgulho de certas pessoas. Os orgulhosos jamais encontrarão a Deus, que só se revela aos humildes e, explicitamente, se oculta aos que se julgam sábios.
Obs.: Eu parto do pressuposto de que Deus existe porque, se existe a criatura, existe o criador. O cínico, porém, perguntará: e quem criou Deus? (F. Maier)