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Artigos-->Gavetas -- 01/11/2002 - 19:30 (Tiago Xavier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Um Mundo Engavetado (Tiago Xavier dos Santos – 19/09/2002)



Se alguém conhecer, por favor me apresente. A pessoa que procuro não existe nem em fábula. Procuro alguém que realmente consiga deixar uma gaveta organizada, seja ela de cômoda ou mesmo de um criado-mudo. Gavetas foram feitas para guardar cacarecos e velhas tranqueiras, que você um dia julga útil, mas depois de colocadas lá dentro, só volta a vê-las quando cria coragem de arrumar a bagunça.

Numa gaveta tem de tudo. Velhos cadernos, jornais do século passado, foto da primeira namorada, um brasão de um time de futebol polonês. Certo dia, num desses chiliques de arrumar o quarto, achei na minha velha gaveta o boletim da primeira série. Com assinatura da Tia Gertrudes. Tive que guardar, afinal a Tia Gertrudes me ensinou a ler. Coloquei em outra gaveta.

O ato de arrumar uma gaveta é sempre em vão. O que deve ser jogado no lixo acaba ficando e o que realmente presta, se é que alguma coisa colocada em gaveta presta, acaba indo pro lixo. Joguei fora minha coleção de CDs de Jazz porque na gaveta de meu criado mudo só tinha espaço para uma antiga coleção de maços de cigarro. Acabei fumando os cigarros todos para colocar a coleção de tampinhas de frasco de detergente.

Pela gaveta de uma pessoa se faz uma verdadeira biografia. Os objetos denunciam detalhes que nem a própria mãe do sujeito conhece. Um amigo meu guardava luvas de seda numa das gavetas da casa. Daquelas luvas delicadas que as madames usam nos filmes antigos. O que ele fazia com aquilo eu não sei, mas é motivo de desconfiança.

Quando se perde alguma coisa como as chaves do carro, maço de cigarros, isqueiro e documentos, os primeiros lugares a serem vasculhados são as gavetas. Mas nunca se encontra nada daquilo que realmente precisa. O pior é que geralmente estes objetos estão lá, escondidos. Acho que as gavetas tem compartimentos secretos que escondem nossas coisas quando ela é fechada

A gaveta demonstra a arte da bagunça moderna. Quem tem gaveta pode se considerar um pós moderno, um futurista nato. O futuro da humanidade está na bagunça de cada gaveta existente na face da terra. Creio eu que num futuro próximo os Homens habitarão enormes gavetas, como na antigüidade se fazia uso das cavernas. As gaveta grandes terão repartições como nas casas atuais se tem os cômodos. Serão pequenas gavetas chamadas de quarto, cozinha, banheiro, sala e copa. Teremos as gavetas de empregada, as gavetas de visita, as gavetas de estar e as de jantar.

Os bairros serão chamados arquivos e as cidades de armários. Seremos o mundo das gavetas. O século XX tem provas concretas de que haverá uma transição. Um século de guerras onde a humanidade se desencontra a cada década. Décadas perdidas que nunca serão encontradas, pois sua documentação histórica foi abandonada em velhas gavetas empoeiradas. Uma história jogada as traças, perdida como um isqueiro sem fluido na velha gaveta de cuecas. Esse desencontro humano vai se dar quando o último homem se encontrar fechado em sua gaveta particular. E quando o homem for engavetado por vontade própria, estará perdido. Nunca mais será visto. Assim como qualquer objeto de uso pessoal que um dia foi deixado numa gaveta.

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