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cronicas-->Às Favas a Obrigatoriedade -- 25/12/2004 - 17:20 (Iracema Zanetti) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


Às Favas A Obrigatoriedade
Iracema Zanetti


Perguntem-me se antigamente mandávamos
às favas a obrigatoriedade?
Sabem lá o que é estar em plena lua de mel,
menos de dois meses de casada e ter por obrigação
ir sozinha ao Mercado Municipal de São Paulo?
E o pior de táxi velho, motor mal regulado
escapamento dependurado e fazer compras,
para a ceia de Natal a mais de trinta pessoas...
Sem contar as crianças que não eram poucas!

Naquele tempo não existiam os Supermercados da vida
que existem hoje!
Os varões da família se lixavam à mulher sorteada.
Mesmo sendo a sua... A sorteada fazer as compras.
O que importava era saborearem frutas importadas.
Peito de peru só servia se fosse importado da Califórnia,
bacalhau da Noruega... Azeitonas Gregas... Azeite Galo.

Ao relembrar das cenas que vi rolarem
diante dos meus olhos,até hoje me revolto!
Eu tinha apenas vinte aninhos,
mas esta obrigação me foi confiada por sorteio!

Casada, eu me considerava poderosa!
Não admitiria ser chamada de lerda
ou de mulher folgada!
Antigamente não existiam os termos...
dondocas, Paticinhas ou cocotas...

Meu segundo mês de casada elevava meu ego às alturas.
Não queria me ver comparada à mulheres vazias,
fúteis, burras sem graça.
Lançávamos à sorte nossa tarefa ao retirarmos
de uma caixa de sapatos um papelucho marcado
constando à obrigação que cada uma teria de enfrentar...
Desde avós, mãe, tias, primas, desde que casadas.

Não era permitida a ajuda dos maridos quanto aos afazeres
das esposas nos dias que precediam festas tradicionais.
Pois cabia a eles cuidarem de tarefas mais pesadas
ou muito mais importantes, isto era o que os maridos,
inclusive o meu, muito folgados, falavam!

Dia vinte e três de Dezembro... Calor de arrasar!
Meio enfurecida tomei o táxi até o mercado,
no qual eu jamais havia entrado.
Morta de calor, suada, sentia um odor terrível,
sem saber de onde vinha

Disfarçadamente levantei um pouquinho o braço
para sentir se era do meu corpo o odor que me alarmava.
Ai que alívio meu perfume característico recendia à lavanda
e talco Johnson . Só aí percebi a imundície do mercado
tão famoso de São Paulo.

A sujeira que ali imperava e o mau cheiro...
Obrigava meus dedos polegar e indicador da mão esquerda
Apertar as narinas e respirar pela boca quase fechada,
Acometida pelo nojo que me sufocava vi-me atacada
por violenta náusea.

Pedi proteção aos anjos, mentalizei um sinal da cruz
e comecei minhas compras, acompanhada por um carregador
tamanho Maguila, cara de bonachão que me fez perder o medo
da multidão.

Reclamei com o dono da barraca de frutas onde iniciei
minhas compras, sobre a falta de higiene e do odor
insuportável do mercado.
Ele deu uma gargalhada na minha cara dizendo...
Que o cheiro depois de tudo cozido assado mastigado
e engolido, passava...
E disse mais... Que os fregueses do mercado em poucos dias
esqueceriam do mau cheiro do mercado...
Voltariam com as mesmas queixas e tornariam às compras habituais
com um grande sorriso a escapar-lhe dos lábios.

Fiquei caladinha tão assustada com àquela bocarra desdentada
e o mau hálito que dela se desprendia ao rir bem na minha cara!
Deixei para escolher duas melancias para o final das compras...
Pois eram melancias gigantescas.
O dono da banca ajudou o carregador acomodar a primeira delas
no carrinho de compras.

Ao passar-lhe a outra o carregador se fez de besta e de propósito
abriu os braços ao recebê-la.
Ao vê-la espatifada no chão agarrou o maior pedaço e o devorou
em segundos...
Sem abrir a boca, assisti o espetáculo até ele terminar de comer
o resto todo.

Enquanto o carregador comia os pedaços que jaziam no chão,
pedi ao desdentado outra melancia do mesmo porte, para substituir
a pobre coitada dentro da barriga daquele vira lata.
O desdentado ria a não mais poder da minha cara de espanto.
Porque realmente eu nunca vira homem nenhum,
por maior que fosse, devorar em minutos quase dez quilos de tal fruta!

Passei à banca de frutas secas importadas.
O dono dela um italiano gordo e avermelhado
Teve a cara de pau de perguntar olhando-me maliciosamente...
O que uma menina tão bonita fazia naquele lugar fedorento ao lado
de um carregador tarado.

Senti meu coração bater acelerado ao lembrar
daquele homenzarrão comendo qual porco esfaimado.
Meus pensamentos voaram e vi naquela criatura um animal feroz
estraçalhando e comendo a pobre presa.
Pensei bem rápido e corri em disparada para fora do mercado,
onde o taxista me esperava.

O percurso do mercado à casa dos meus pais
ficava a uma distància bem considerável.
Fechei os olhos e mentalmente escrevi centenas de
discursos para escolher o mais apropriado.
para poder me apresentar diante dos que ali se
encontravam, um motivo justificável do porquê
eu voltar do mercado de mãos abanando!

Minhas idéias martelavam minha cabeça...
Visualiza-me depositando a bandeira de honra ao solo
E convictamente dizia à minha família...
Que não queria mais saber de Natal nem de Ceia
nem de nada!

Porque para mim Natal não significava fazer compras
para a ceia de Natal, desacompanhada do marido,
num ambiente perigoso, nojento mal cheiroso!
Diria a todos que quando criança eu não sentia
vontade de comer nada do que me ofereciam.
Nem sequer desejava sentar à mesa e só o fazia
para obedecer as regras das tais obrigatoriedades
que não eram poucas e eu tanto detestava.

Porque para mim o verdadeiro Natal e a emoção
que me causava a data, era olhar o presépio e o
rostinho de Jesus Menino, com meus olhinhos plenos
de lágrimas e esperar Papai Noel entrar pela chaminé
de nossa casa todo sujo de fuligem que maculava
suas barbas brancas que eu tanto amava!

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