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cronicas-->Elevadores e a Lista de Schindler -- 26/01/2005 - 20:03 (Jefferson Cassiano) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Sem contar um grande amigo que se apaixonou por uma ascensorista e leva uma vida amorosa marcada por altos e baixos, nunca ouvi falar de alguém que tivesse uma queda por elevadores. Não há nada de agradável em viajar nesse meio de transporte que é meio muito mais por ficar na parte central da maioria dos edifícios que pela vocação em transportar. É no elevador que as situações mais socialmente forçadas se constroem. Não se pode mesmo esperar muito de um cubículo que vive de subir e descer sustentado por cabos ocultos e que exibe em cada andar o simpático aviso: verifique se eu estou realmente parado aqui antes de embarcar ou despenque até o subsolo.
Você não escolhe o seu companheiro de viagem no elevador e, diferente de um ónibus ou trem, não pode mudar de lugar caso esteja sentado ao lado daquele vizinho chato que interfonou na noite anterior reclamando dos latidos do seu cachorro. E você nem cachorro tem! No elevador, o confronto é inevitável. Uma vez aberta a porta, o máximo que se pode fazer é tomar parte da viagem acompanhado daquela vizinha faladeira que adivinha a hora em que você sai ou chega em casa. Como ela sempre erra na quantidade de perfume e você, alérgico, vai espirrar no permanente da coitada, o encontro já começa mal. Um "bom dia" vai surgir autónomo da sua garganta. O som vai ser abafado pelos lábios que acham que a mulher do 72 não merece ter um dia assim tão bom. O que era para ser uma cordial saudação vai vibrar no ar como um "oi" tímido e gutural. A resposta dela virá com um aceno da cabeça vermelha Biocolor que você só vislumbrará perifericamente, já que ninguém se encara no elevador. Nos seriados da TV, até faz um certo sentido que as personagens fiquem olhando para frente. Há uma càmera que determina essa postura. Na vida real, a càmera não existe e, mesmo assim, todo mundo fica de frente para a porta fechada, como se o elevador fosse panoràmico. É nesse momento de alinhamento de ombros que a função fática da linguagem tem seu apogeu de glória máxima:
- Calor, hein?
- Nossa senhora! Ontem e hoje... Vixe!
- Onde é que a gente vai parar? Quase quarenta graus!
Por que, raios, as pessoas conversam sobre o clima quando não têm nada a dizer? E não falam de previsões meteorológicas para o fim de semana. Falam sobre o sol que acabaram de deixar do lado de fora do prédio, como se você pudesse discordar delas: "Ta calor hoje, né?", e então: "é mesmo? Quando entrei, há 10 segundos, estava uma neve gostosa. Parou de nevar?" Todo síndico deveria bolar mecanismos que impedissem que o "tempo hoje" fizesse parte de qualquer diálogo no metro quadrado do social ou no meio metro quadrado do elevador de serviço. Uma gravação didática ajudaria:
- Caro passageiro, é proibido falar sobre sol, chuva, calor, frio, nevascas, tornados, pressão atmosférica, cúmulos, cirros, estratos ou qualquer outro tema que lembre as condições do clima em nossa cidade. Caso insista no assunto, um buraco se abrira sob seus pés. Obrigada.
Elevadores deveriam ser individuais. Até se poderia oferecer carona para um ou outro condómino simpático. Mas ninguém precisaria fingir que vai pegar pacotes no porta-malas só para não subir doze andares junto ao síndico que insiste em segurar a porta à sua espera, numa gentileza sádica. Se esse luxo ainda não é tecnicamente viável, então nos resta a força da coincidência: uma das principais marcas de elevador é Schindler. Uma lista! Boa maneira de evitar encontros desagradáveis. Essa Lista de Schindler serviria para dividir os passageiros por grupos e turnos de interesse comum: variedades, política, futebol, vida alheia e, para a manutenção da mediocridade:
- Você tá na lista do "papo furado sobre o clima" ?
- Só tou!
- Beleza!Ta quente hoje, né?
- Pó! Minha pressão tá no subsolo.
- Quarenta graus! É...Ribeirão Preto não tem jeito!

........
Jefferson Cassiano é publicitário e tem para alugar um apartamento no décimo andar de um prédio sem elevador.
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