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Contos-->ROCHA INABALÁVEL -- 10/10/2007 - 21:31 (Rosimeire Leal da Motta) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Este Conto faz parte do livro:
"Voz da Alma" – Autora: Rosimeire Leal da Motta
Editora CBJE - RJ - Novembro/ 2005 - Poesia e Prosa.

Este livro "Voz da Alma",pode ser encontrado na:
- *"Biblioteca Pública Municipal de Vila Velha - ES".Tel.: (27) 3388-4208
- *"Biblioteca Transcol do Terminal do Ibes - Vila Velha - ES".
- *"Biblioteca Transcol do Terminal de Jardim América - Cariacica - ES".
- *"Biblioteca da Chocolates Garoto (Espaço Cult)
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Pedro Sabino da Mota, nasceu no dia 08 de novembro de 1912, em Sapatuí, que é distrito de Conceição do Almeida, no Estado da Bahia. Essa povoação surgiu no século XIX, quando uma aglomeração formada em torno de um santuário construído sob a invocação de Nossa senhora da Conceição, passou a ser chamada de Capela do Almeida, devido ao fato dos proprietários do terreno possuírem esse sobrenome. Esse município foi criado com território desmembrado de São Felipe, em 1890, com a denominação de Conceição do Almeida. Recebeu a nomeação de Afonso Pena em 1909. Retomou em 1943 ao nome anterior. Área: 262 km².

Em 1912, administrava o país, o presidente Marechal Hermes Rodrigues da Fonseca e a moeda da época, era nesta seqüência: “Réis”, “mil Réis” e “contos de Réis”.

Filho de Antonio Sabino da Mota (1894/ ?), agricultor, e Epifania Madalena da Mota (1889/ ?-), do lar; ele tinha a pele clara, ela, morena; os cabelos de ambos eram pretos. Não conheceu seus parentes maternos. Convivia com sua avó paterna, “Chiquinha” e seus tios: Heliodoro (único que sabia ler e exercia o cargo de delegado), Querino, Amâncio, Tonha e Maria.

Seus irmãos: HELIODORA (1900/ 1980), casou-se com Zacarias Carvalho dos Santos que tinha um comércio no município de Jiquiriçá e estabeleceram-se no município de Santo Antonio de Jesus; os negócios iam mal, ficou cego e a família sobrevivia com a ajuda de parentes e amigos... ele não viveu por muito tempo; tiveram duas filhas: Maria e Jozelita; ela faleceu em 28 de dezembro de 1980, aos oitenta anos. MANUEL, aos dezoito anos, afligia-se com um ferimento próximo ao peito que não cicatrizava e recomendaram colocar “Búzio de catar sol” (uma planta comum no nordeste; havia em grande quantidade no mato e se parecia com uma ostra) e então a ferida aumentou, chegando ao coração, levando-o a morte. UMA IRMÃ, que morreu aos dois anos de idade (esqueceu-se do nome dela) e ALÍPIO, (já falecido... seus olhos eram azuis) desposou Eloíza Almeida de Rezende (conhecida como “Zinha”, 1921/-), que ainda vive e mora no município de Pinhalzinho, no Estado de São Paulo... não tiveram filhos. Meu pai é o caçula.

Sua mãe lhe apontava em direção a um ponto entre os rios Jaguaribe e Mucamba na fazenda, e dizia: “Ali, me abaixei com o intuito de encher uma lata com água e ao erguê-la sobre a cabeça, comecei a sentir as contrações do parto e você veio ao mundo!”

Aos cinco anos de idade, seu pai transferiu-se para o município de Santo Antonio de Jesus, contudo, decidiu vender sua propriedade por ter se desentendido com seus irmãos e adquiriu outra no município de Jiquiriçá.

Jiquiriçá originou-se das fazendas do coronel Coutinho e Américo Turino; antes era um matagal cheio de animais selvagens: raposas, onças, etc. É um município proveniente dos territórios das freguesias de Santo Antônio de Jiquiriçá e Estiva, desmembrados de Valença, tomando a designação de Vila de Jiquiriçá, em 1833. Em 1868, era incorporado pela Vila de São Vicente Ferrer d` Areia (atual Ubaíra). Em 1891 restaurava a sede na povoação de Velhas e com a denominação de Vila de Capela Nova de Jiquiriçá; sendo simplificado para Vila de Jiquiriçá em 1904. Foi elevada à categoria de cidade em 1938. Ainda existem vários tatus, capivaras, preás, teiús, cobras e aves. Preserva um pouco do que resta da floresta nativa da Mata Atlântica. Área: 126 km².

A fazenda se chamava “Pindoba” porque ali havia inúmeras palmeiras dessa espécie. Seus frutos são coquinhos semelhantes ao coco-da-bahia, porém, bem menores e eles têm cerca de quatro centímetros e seus cachos desenvolvem-se colados à base das folhas; seu caule é subterrâneo, ficando expostas apenas as gigantescas folhas de até sete metros. Eram usadas para o fabrico de óleo; das suas cascas fazia-se cachimbos e cobertura de casas, tecelagem de cestos e cordas. Seu palmito é comestível.

A iluminação pública funcionava através de postes de madeira com lampião a gás. Ao escurecer, empregados do intendente, (função equivalente ao de prefeito) ia acender os lampiões e ao amanhecer voltavam para apagá-los.

O meio de transporte utilizado era a pé (andando); em carros de bois (transportar a colheita para o armazém da fazenda, cargas, pessoas, mudanças, etc.); a cavalo (passeios breves) e em lombo de burro (viagens longas e era o animal mais resistente para levar carga). Não havia estradas como hoje conhecemos, geralmente era uma clareira aberta no meio da mata.

Um personagem muito comum era o “tropeiro” que fazia um duro percurso a fim de transportar mercadorias e gado.

Todos os homens usavam chapéu.

Quando era criança, brincava com seu amigo Vicente, que vinha com freqüência à fazenda do seu pai e morava distante dali uma légua (6.600 metros). Ambos subiam nos pés de jaca, ingá, etc; pescavam; matavam passarinhos para comer; retiravam uma lasca da árvore Imbaúba, davam forma de uma vara e furavam um buraco no centro, fazendo passar um cipó neste orifício e que servia para girar no ar. A verdade é que sua infância foi curta, uma vez que dedicou a maior parte deste período às plantações.

O pai dele era rico, sua fazenda imensa, porém não se importava com a arrumação e decoração da residência e assim, na propriedade havia muitos bois, cavalos, lavouras, entretanto, num desleixo total. Meu pai conta que meu avô demonstrava um temperamento agressivo e tratava mal a seus familiares.

Para o desjejum, sua mãe cortava cana e preparava o café (pisava, torrava e coava). Seu pai não comprava nenhum mantimento para a casa, tudo era feito pela Epifania, aproveitando o que havia na fazenda, por exemplo, açúcar. Não havia papel higiênico, usava-se sabugo de milho; dormiam em esteiras de palha.

Havia poucas escolas no interior da Bahia e a maioria dos professores não eram qualificados. Meu pai e seus irmãos foram à escola, com exceção da sua irmã Heliodora, pois naquele tempo, mulher não estudava. O professor Nestor era meio surdo, não tinha didática e não sabia disciplinar e ninguém o respeitava. Utilizava uma palmatória (tinha o formato de uma colher de cabo comprido, era feito de madeira e a ponta era arredondada), que batia na escrivaninha, na cabeça e nas mãos dos meninos e gritava xingando-os de “Patifes!” As aulas eram realizadas no primeiro andar e ele trancava a porta da sala. Meu pai não aprendeu nada, porque ia uma vez ou outra. Seus pais não tinham condições de lhe instruir sobre esse assunto e fazê-lo compreender a importância de ler e escrever.

Depois mudou de escola: a classe era na residência da professora Dona Biloca (no quintal), que não motivava nem despertava o interesse dos alunos, não oferecia estímulos e incentivos apropriados para tornar a aprendizagem mais eficaz. No percurso da fazenda até lá, havia um matagal e uma ladeira cheia de buracos e quando chovia, todos os que passavam por ali escorregavam e caíam na lama e era longe, aproximadamente uma légua. Às vezes, no horário em que deveria estar com os demais estudantes, ficava escondido na roça, trabalhando. O único que progrediu nos estudos foi seu irmão Alípio. Meu pai conseguiu apenas assinar o seu nome e a efetuar cálculos.

O dinheiro que meu avô Antônio recebia do seu trabalho de agricultor (vendia os produtos da sua fazenda na feira e para o comércio local), ele guardava dentro da mesa da sala e economizava com usura. Era comprida, grossa, de madeira e antiguíssima, pois a propriedade já havia pertencido a outros fazendeiros, contudo, ao se mudar ninguém a levava, porque sendo demasiado pesada, necessitava de seis homens para movê-la. Em cada lado da cabeceira havia uma gaveta enorme e ao retirá-las, cabia uma pessoa deitada e no fundo, oculta por uma tábua, estava uma portinha, e a este compartimento ele chamava de cofre e ali, depositava toda a sua economia. Só quem sabia disso era meu avô e meu pai. Não havia bancos naquela região.

Comemoravam na fazenda do seu pai o “São João”, na noite de 24 de junho. A origem deste festejo vem de São João Batista, primo de Jesus Cristo... crêem que ele nasceu nesta data. Soltavam rojões e foguetes (representando os gritos de felicidade por esse dia), faziam fogueira (como sinal de aviso do nascimento de Jesus), mungunzá (canjica), licor de jenipapo e cravo; fincavam os galhos de uma árvore no chão e penduravam neles laranjas e espigas de milho (para serem assados) e festejavam com os trabalhadores da lavoura. Vinha um sanfoneiro tocar músicas típicas; em seguida ia para as festas vizinhas que eram mais animadas e participavam mais pessoas.

No dia 29 de junho é lembrada a morte de São Pedro, apóstolo de Cristo. Meu pai acendia uma fogueira em homenagem a ele. Quem tinha esse costume eram as viúvas e quem tinha o nome de Pedro.

Desfilavam neste cenário os cangaceiros (diversos bandos independentes, bandidos da sociedade rural encarados como criminosos pelo Estado, mas considerados heróis, justiceiros, vingadores ou alguém que rouba dos ricos, por sua gente... alguns eram grupos pobres que se organizavam para assaltar e conseguir alimentos, outros, surgiram para combater a injustiça de algum coronel). O Cangaço iniciou-se no século XVIII e foi típico do nordeste. A expressão Cangaço está relacionada à palavra canga ou cangalho; uma junta de madeira que une os bois para o trabalho... assim como os bois carregam as cangas para otimizar o labor, os homens que levam os rifles nas costas são chamados de cangaceiros. O personagem principal era Lampião (Virgulino Ferreira da Silva), o Rei do Cangaço, que nasceu no Estado de Pernambuco em 1897; aos dezenove anos já se comportava como um futuro cangaceiro, mas, somente em 1920 assumiu a chefia de um bando depois que seu pai foi assassinado pela força policial. Recebeu o apelido de “Lampião” porque gabava-se de que no decorrer de uma luta, sua espingarda fazia um clarão, tal qual um lampião! Ele e seu bando exterminavam, estupravam, torturavam, castravam, incendiavam as propriedades de grandes fazendeiros, tatuavam com fogo, cortavam a língua ou a orelha, saqueavam, atacavam vilas, povoados e cidades, e assassinavam. Fazia dos sertões dos Estados de Sergipe e da Bahia seu quartel-general, onde irradiava sua influencia para os outros Estados do nordeste. O bando de Lampião resistiu durante quase vinte anos, brigando com grupos de civis que o perseguiam e com a policia de sete Estados nordestinos.

Época onde todos no interior da Bahia andavam armados: portavam pistolas, rifles de repetição, carabinas, cravinotes, facas, facões, punhais...

Os grandes proprietários (fazendeiros), procuravam se destacar como autoridades, e ambicionavam ser “Coronéis” (chefes políticos) e alguns deles protegiam os cangaceiros para evitar ataques e ás vezes, por estar precisando de algum “serviço” e formavam bandos armados, denominados “Jagunços” (o mesmo que Capangas, Pistoleiros ou Cabras)... estes bandos também existiam de modo independente. Essa estrutura coronelística foi uma herança do passado colonial, que se solidificou durante o Império e se estendeu ao início da República. Os “Coronéis” interferiam nas eleições, obrigando seus subordinados a votarem nos candidatos que eles determinavam (“voto de cabresto”).

Foi algumas vezes com seu pai a Santo Antonio de Jesus, visitar sua avó “Chiquinha”... ela era viúva e cuidava da fazenda sozinha e era uma exímia atiradora.

Havia uma estrada que passava por trás da casa da “Chiquinha”, dentro da fazenda, situação que muito a incomodava. Por essa razão, fechou-a e construiu outra, derrubando a mata e cercando, porém, este novo caminho público era duas léguas mais longe do comércio local, circunstância que aborreceu a muitos que precisavam passar por ali. Certa ocasião, passava um “tropeiro” com um lote de quinze burros com carga e alguém lhe advertiu que a Dona “Chiquinha” havia mudado o percurso. Esse respondeu que não respeitava homem muito menos mulher e prosseguiu adiante e puxou o facão da cintura com a intenção de destruir a cerca, quando ouviu uma voz estridente e brava gritar: “Não corta não, que eu te mato!” Ela estava em cima de um pé de fruta-pão apontando um cravinote para ele (espingarda de cano longo), preparando-se para atirar. O homem imediatamente dirigiu-se para a estrada nova.

Meu avô Antônio, desde quando era solteiro, tinha uma ferida enorme nas juntas das pernas direita e esquerda e na nádega, que não cicatrizavam e ao longo do tempo aumentavam de tamanho e por este motivo, ficou dezoito anos sem poder trabalhar e quase sempre deitado na cama. Fez uma promessa ao Senhor de Bom Jesus que, se ele ficasse curado, iria à cidade de Bom Jesus da Lapa varrer a igreja... ele nunca tinha ido lá, mas ouvia falar dos milagres e tinha um quadro dele. Então, ele teve um sonho, onde lhe era revelado como fazer um preparado com folhas. Depois de alguns meses, ficou recuperado! Casou-se, teve filhos e esqueceu-se do seu compromisso. Meu pai tinha aproximadamente doze anos quando a doença voltou a atormentar meu avô, porém doíam também as juntas dos ossos e ele ficou todo encolhido, sem poder mover-se. Apegou-se novamente ao Senhor do Bom Jesus e lhe suplicou fervorosamente a cura daquela enfermidade. Uma vez mais ele sonhou os procedimentos para fazer o remédio, diferente da vez anterior. Assim que se restabeleceu foi pagar a promessa. Saiu de Jiquiriçá e no município de Jequié, encontrou três amigos que estavam indo para a festa da romaria. Viajaram quatro dias naquela região do interior afastada da costa e das povoações a pé. O calçado que meu avô usava era uma alparcata (chinelo de couro cru). De repente, pisou num espinho que entrou fundo no seu dedo, conseguiu retirá-lo, contudo, não podia caminhar como antes e seus companheiros reclamaram que se permanecessem naquele passo, morreriam na caatinga. Meu avô recomendou que fossem na frente. Anoiteceu e decidiu repousar por ali e o mesmo fizeram vários romeiros que seguiam naquela direção. O local onde eles acamparam era um espaço sem árvores, no meio da mata. Todos os romeiros ficaram próximos uns dos outros e em torno deles fizeram cinco fogueiras, formando um circulo fechado para se defenderem das onças. O fogo abaixou e começou a vir terra do lado de fora assustando meu avô, fazendo-o esbarrar rudemente num dos romeiros e este e os demais pensaram que era briga. Juntou uma multidão, com o intuito de linchar meu avô, entretanto, este teve tempo de gritar: “São as onças!” Neste instante veio mais terra e eles entenderam o perigo e trataram de colocar mais lenha na fogueira, mas ninguém dormiu, com medo de serem atacados. As onças costumam sair à procura de alimento antes do romper da aurora ou ao crepúsculo. Aproximam-se silenciosamente da vítima e saltam sobre seu dorso. Ao amanhecer, os felinos já haviam ido embora e os romeiros continuaram o trajeto. Meu avô cortou com um facão uma madeira e fez com ele um porrete para auxiliá-lo a locomover-se, pois seu pé estava inchado e ele mancava. Após horas percorrendo a mata nordestina, com vegetação baixa de arbustos, espinheiros, gravatás, cactos, cardos, etc, chegou num lugar chamado “Bonito”. Encostou-se na parede de uma casa para descansar e uma senhora idosa abriu a porta. Ao vê-lo, perguntou se desejava algo e este lhe informou que era romeiro e lhe pediu comida. Estava se alimentando e um ateu, rindo, o interrogou de maneira debochada sobre quem ele era e para onde ia. Meu avô explicou pacientemente sobre seu desejo de assistir a festa da Lapa que seria dentro de dois dias e este enfatizou que a distância até lá eram dez léguas. Iniciaram o seguinte diálogo:

__ Quem lhe trouxe até aqui?

__ O Senhor Bom Jesus da Lapa!

__ Se você acredita nesse homem, viaje a pé à noite inteira e mais um dia, que alcançará seu objetivo.

Meu avô encheu-se de coragem e apesar dos riscos, viajou com o pensamento de que “a fé move montanhas”. Quando amanheceu, avistou uma casa, foi até lá, comentou sobre seu propósito e a senhora lhe pediu que esperasse um pouco, pois o marido tinha ido buscar leite no curral. Em seguida chegou um senhor e ao escutar que havia viajado a noite inteira duvidou, montou num cavalo e foi verificar os rastros na estrada. Ao retornar, lhe disse: “Estou admirado que você esteja vivo! Há pegadas de onça logo após suas passadas!” Tomou café, pôs a sovaca nas costas (um saco com mantimentos, roupas, etc), reiniciou sua peregrinação e à tardezinha respirava o ar de Bom Jesus da Lapa.

Bom Jesus da Lapa é um município situado na margem direita do Rio São Francisco, na parte Centro-Oeste do Estado da Bahia. Seu nome homenageia o padroeiro, Bom Jesus, e Lapa significa, em latim, Pedra. Em fins do século XVII, 1691, o penitente português Francisco Mendonça Mar encontrou uma gruta (caverna) e construiu dentro dela um santuário invocando Nosso Senhor. A novena se inicia no dia 28 de julho e, no dia 06 de agosto é rezada missa pela manhã e procissão ao Senhor Bom Jesus da Lapa, à tarde. Área: 4.060 km².

Ficou três dias lá e durante este período tratou de cumprir a promessa: varreu a igreja, recolhia o pó com um lenço e empurrava a poeira com a língua. O pé tinha melhorado e ele começou o trajeto de retorno, no entanto, perdeu-se na caatinga do sertão. Preparou-se para descansar numa serra, mas não conseguiu dormir: ficou a noite inteira alimentando a fogueira com lenha porque as onças tentavam avançar e urravam. Um dia de domingo, avistou um povoado pequeno que se chamava “Vila dos Urubus” (era percurso dos romeiros e os jagunços que moravam ali, os matavam). Na entrada da Vila havia uma igreja e uma venda, que era o único comércio do lugar. Estava sendo celebrada uma missa e meu avô permaneceu na porta assistindo e viu que lá só havia jagunços: todos usavam os cabelos e a barba longos e estavam ajoelhados com os rifles de repetição encostados no ombro. O padre encerrou a cerimônia e todos foram para a venda beber. Havia um deles que parecia ser o líder, então meu avô pediu licença para comprar mantimentos e comentou que era romeiro. Pagou duas rodadas de cachaça e eles recomendaram que meu avô acampasse bem distante dali, pois a missa era realizada uma vez por mês, depois se reuniam e após ficarem bêbados atiravam em qualquer pessoa que estivesse nas proximidades. Afastou-se algumas léguas, fez uma fogueira e não tardou muito e ouviu ao longe um tiroteio. Ao amanhecer, seguiu viagem passando próximo a uma fazenda e o proprietário assim que o viu xingou e fez ameaças, mas meu avô não deu atenção. Mais à frente, encontrou um rapaz que sorrindo, informou que era filho do fazendeiro que havia visto momentos atrás e esclareceu que ele estava aborrecido porque incendiaram as cercas da sua propriedade e acusava os romeiros, mas provavelmente foram os vizinhos, pois ele tinha muitos inimigos. Forneceu água para meu avô e lhe ensinou o caminho até Jiquiriçá. Finalmente, chegou em casa e soube que seus familiares haviam ido a delegacia prestar queixa do seu desaparecimento, uma vez que seus amigos voltaram e não deram nenhuma notícia.

Quando meu avô regressou, percebeu que seu vizinho Alfredo Antônio Querino havia se apoderado de alguns alqueires da fazenda Pindoba. O Intendente Coronel João Veiga era aliado político de Alfredo e estava a seu favor. Então meu avô decidiu suplicar a ajuda e proteção ao chefe dos jagunços que lideravam aquela região, o Coronel Marcionílio Souza. Demorou muitos dias viajando. Quando aproximou-se da cancela da fazenda, havia quatro jagunços que lhe apontaram os rifles de repetição e o revistaram; meu avô lhes explicou o motivo da sua presença e lhes mostrou a escritura da fazenda. Conduziram-no à presença de Marcionílio e este para verificar a autenticidade das suas palavras fez uma série de perguntas e mandou que fosse aguardar num quarto preparado para ele. Horas mais tarde, o chamou e fez as mesmas perguntas e solicitou novamente que esperasse em seus aposentos. À noite, foi ao seu encontro e o interrogou de maneira idêntica às anteriores e por fim, observou: “Você não entrou em contradição e repetiu as mesmas respostas, logo está dizendo a verdade!” Escreveu uma carta ao Intendente ordenando que acertasse as divisas da terra. Este, ao recebê-la, disse que solucionaria o problema, contudo, não tomou nenhuma providência. Meu avô retornou à fazenda do Coronel Marcionílio e este enviou uma mensagem comunicando que iria pessoalmente revisar a propriedade e seus homens destruiriam tudo o que encontrassem pelos arredores de Jiquiriçá. Imediatamente, o Intendente providenciou o deslocamento das cercas.

Em 1922, fizeram-se as últimas moedas de ouro de vinte mil e dez mil Réis. Continuaram a circular as de prata de quatro mil, dois mil, mil, e, quinhentos Réis. No mesmo ano surgiram moedas de bronze e alumínio valendo mil e quinhentos Réis.

Meu pai trabalhava cultivando quiabo, pepino, fumo, feijão de corda, abóbora, tinha vinte e cinco mil pés de café que ele catava e pisava; criando galinha e uma porca que dava doze leitões; negociava todas estas coisas na feira, inclusive, frango, ovos, etc. Desta maneira economizou dinheiro e adquiriu sua primeira fazenda aos quatorze anos: pediu ao pai que lhe vendesse uma fazendinha, encostada a dele. Ali havia uma casa coberta de telha e um ponto de comércio (ambos feitos de adobo de barro: amassado, moldados em formas de madeira e secos ao sol, e ligados com argamassa de cal e areia); estava alugado.

Nesta época ele tinha um instrumento chamado berimbau: cortava um pedaço de galho comprido, dava um talho e envergava como o arco que o índio usava para se defender; o tocava em casa e o som era parecido com um zumbido.

Tinha um passarinho de estimação, um Suiá (espécie de Papagaio)... era verde, com uma ponta vermelha na asa. Quando chegava da roça ele vinha voando e pousava em seu ombro e beliscava delicadamente em seu rosto, como se estivesse dando beijos. Porém, um dos cachorros que havia na fazenda o pegou e estraçalhou. Meu pai chorou, pois havia se afeiçoado a ele.

Comprou um cavalo branco e muito se orgulhava dele; seu nome era “Periquito”. Era esquipador, tinha puxada forte, ritmada, andava depressa.

Meu pai estava vendendo verduras, nas proximidades da estação ferroviária de Jiquiriçá, quando viu um aglomerado de pessoas em frente de um vagão e foi ver o que estava acontecendo. Observou que era um vagão-gaiola, que geralmente transportava cavalos, bois, animais em geral e ali estava preso o Coronel Marcionílio. Primeiro pegaram o filho dele, Trancolino, e o levaram como refém, com a intenção de obrigar o pai a se render e após várias investidas e lutas, entraram na fazenda e foi capturado. Coronel Trancolino acabou morrendo de tanto apanhar, quando tentavam forçá-lo a confessar seus delitos. O Coronel Marcionílio por fim, ganhou a liberdade, mas perdeu seu prestigio e a liderança dos jagunços.

Morava na fazenda Pindoba o empregado Andrezinho e este, um certo dia, convidou meu pai para ir com ele à casa da sua namorada em Bom Jesus, perto do município de Mutuipe. Ali conheceu a vizinha dela, Alexandrina Eudóxio de Souza (apelidada de “pombinha” por sua pele clara... era muito bonita), que viria a ser sua esposa.

Estava em sua fazendinha derrubando caibros para construir um barraco, quando ouviu um barulho ensurdecedor, que lhe pareceu algo monstruoso, os demais fazendeiros também olhavam para o céu estarrecidos, no entanto, não viam nada e todos saíram correndo para se esconder, com medo: depois souberam que era um avião, o primeiro que passava por aquelas redondezas.

Depois de alguns meses tinha um roçado de feijão, milho, mandioca, coco, capim, pasto, duas chácaras de laranja, etc.

Quando meu pai se casou, tinha vinte e dois anos e neste mesmo dia, contraíram matrimônio a irmã de Alexandrina, Guiomar, com Gustavo. O padre realizou a cerimônia na fazenda de Antonio Eudóxio de Souza (pai de Alexandrina). O padrinho do noivo foi João de Oliveira.

Ninguém da família foi ao seu casamento, principalmente seu pai que estava intrigado com ele por causa de uma amante. Naquele tempo não se casava no civil.

Meu avô estava de caso com Maria Abrandina, apelidada de “Chichinha” que era morena alta, mulher muito estranha parecia homem, machão, seu cabelo era curtinho, enrolado (a mãe dela residia próximo à fazenda e ela tinha um filho chamado “Crispin”). A propriedade era imensa e assim, minha avó, Epifania Madalena passou a morar sozinha e meu avô Antonio, vivia com a Chichinha no mesmo terreno, porém distante, na beira da estrada e ambos sempre vinham maltratá-la. Antonio prendia os cabelos dela numa arca. Ao ver isso, meu pai se revoltava e chamou a atenção do meu avô, este ficou aborrecido e correu atrás dele com um porrete. Eles colocaram vários animais (cavalos, burros, éguas, etc) dentro das plantações do meu pai, arruinando-as, com o intuito de pressioná-lo a sair dali.

Vendeu a fazenda e o cafezal que ele plantou na propriedade do seu pai, para Serapião, um rico fazendeiro, por um preço muito inferior ao que realmente valia, contudo, se permanecesse na fazenda, acabariam se matando. Viajou duas léguas e comprou um pedacinho de terra na Cova da Onça, em Jiquiriçá, contendo uma residência e uma casa de farinha cobertas de palha e alguns pés de café. Cova da Onça estava localizada no meio da mata e havia muita ladeira. Seus vizinhos eram: Gaspar, Felipe Rocha, compadre Vitor, Esperidião, Avarino, Virgilio machado, Antonio Correia, etc. A Cova da Onça era duas fazendas encostadas, entretanto, os donos morreram e os herdeiros repartiram em partes e foram vendendo.

A Revolução de 1930, ao golpear a estrutura coronelística, com o fim da “República Velha”, a chegada das estradas e do progresso no sertão, marcou o começo do fim do cangaço. Neste período, foi distribuído um cartaz que dizia: “O governo do Estado da Bahia premiará com cinqüenta contos de Réis ao civil ou militar que capturar ou entregar de qualquer modo à polícia, o famigerado bandido Virgulino Ferreira da Silva, vulgo Lampião.”

Em 1936, apareceram moedas de níquel no valor de trezentos Réis.

Um rapaz que trabalhava na roça de café do meu pai adoeceu com a “Bexiga da peste” (Varíola). Meu pai pegou a doença, mas, apareceram poucos caroços na pele e logo melhorou, no entanto, Alexandrina, adquiriu a enfermidade e ficou em estado grave, o pior é que estava grávida, no fim da gestação, esperando seu primeiro filho. As características deste mal são: febre alta, calor intenso, mal-estar, dor de cabeça e nas costas, abatimento, começavam a surgir erupções avermelhadas, que se manifestavam na garganta, boca, rosto e que depois espalhavam-se pelo corpo inteiro e transformavam-se em pequenas bolhas cheias de pus, que provocavam coceira intensa e dor, e depois secavam e adquiriam a forma de crostas, que desprendiam-se ao final de três ou quatro semanas.

No dia 10 de setembro de 1937 deu à luz a um menino, o qual foi dado o nome de Manuel. Ele também contraiu a moléstia e nasceu soltando toda a pele. Para tratar da esposa e do filho, ele cortava folhas de bananeira, passava no fogo e fazia de cama e cobertor, pois não podia colocar pano em cima deles. Forçava-os a beber bastante liquido e preparava uma mistura de cânfora, açúcar e leite embebidos em algodão e passava no corpo; tentava amenizar ao máximo a coceira e a dor causadas pela doença e esperava que o organismo reagisse. Meu pai ficou três meses sem trabalhar, cuidando dos dois, mas o seu sacrifício não foi em vão: eles foram curados. Naquela região não havia farmácias, médicos, nem vacina. Todos temiam contrair a doença e os vizinhos “amarravam gato e cachorro” para não chegar perto e ninguém se aproximava visto que era contagiosa e pegava através de gotículas de saliva, objetos contaminados e contato direto. Muitos foram mortos por discriminação dos próprios parentes, com receio do contágio. Havia um lugar chamado “lazarino”, dentro da mata e distante das casas, onde abandonavam ou enterravam as pessoas com esta doença; não permitiam sepultá-las no cemitério. A varíola foi considerada erradicada pela Organização Mundial de Saúde em 1980.

Em 1938, Lampião e Maria Bonita e onze cangaceiros, emboscados, morrem no sertão do Estado de Alagoas (Sergipe) na Fazenda do Angico, pelas mãos do tenente João Bezerra e sua volante (tropa policial que combatia os cangaceiros no sertão), recebendo o premio oferecido pelo governo do estado da Bahia. Lampião e os cangaceiros capturados tiveram as cabeças decepadas e foram expostas de município em município nos Estados nordestinos e no sul do país (uma maneira psicológica de reprimir e intimidar os simpatizantes do cangaço), permanecendo depois no Museu Antropológico Estácio de Lima (Nina Rodrigues), localizado em Salvador (Bahia), por trinta anos. Em 1969, finalmente foram sepultadas.

Meu pai resolveu resgatar Epifania, sua mãe, da humilhação e do sofrimento que sofria em seu próprio lar, mas seu pai não permitia que ele a levasse, dessa forma, suplicou ao Coronel Manuel Bonfim, delegado de Jiquiriçá, que lhe desse dois policiais para escoltá-lo. Conseguiu realizar seu intuito sem problemas, pois seu pai não estava em casa e a conduziu para sua residência na Cova da Onça (depois esse comentou muito bravo, que se ele estivesse lá, não a teria deixado sair).

Alexandrina e meu pai tiveram mais três filhos: Silvanisio (04/10/1938- 28/04/2004), Alaíde (04/12/1939) e José (07/07/1940). Sua esposa que estava grávida do quinto filho, morreu no parto, nascendo uma menina a qual foi dado o nome de Alzira.

Quando Alexandrina partiu desta vida, lhe restou apenas os filhos e mais nada, porém, não perdeu a fé em Deus, não esmoreceu, nem se desesperou. Apesar dos deboches e comentários negativos, trabalhou com a certeza de que recuperaria tudo novamente. Ele sempre foi um homem decidido e corajoso. Embora não saiba ler, nem escrever, seus projetos dão certo, pois tem a direção de Deus.

“Ao homem que teme ao Senhor, Ele o instruirá no caminho que deve escolher.” (Salmo 25:12). “Esforça-te e tem bom ânimo. Não pasmes, nem te espantes, porque o Senhor teu Deus é contigo por onde quer que andares.” (Josué 1: 9)

Em 1940, termina o cangaço com a morte de Corisco, o Diabo Loiro, o último sobrevivente do bando de Lampião, que tentou assumir o lugar de chefe dos cangaceiros. Nesta época o “Coronelismo” já estava praticamente extinto. O controle eleitoral pelo Judiciário e o voto secreto também diminuíram os poderes dos “Coronéis” (na Primeira República o controle eleitoral era exercido pelo Legislativo). O aumento do quadro policial retirou dos “Coronéis” o poder de repressão que antes possuíam.

Não dispunha de recursos para cuidar da menina recém nascida e por isto a deixou com a comadre “Lora”, que morava no município de Araçás, perto de Mutuipe. Quando Alzira completou sete anos, foi mordida por uma cobra e morreu... Levou sua mãe e seu filho José para viverem temporariamente com Alípio, em Jiquiriçá. Cinco dias após o enterro de Alexandrina, ele arrendou o terreno com a intenção de ir a Bananal (localizado no município de Nova Canaã) encontrar seu sogro, Antonio Eudóxio, que havia se mudado para lá. Em seguida, foi em Jiquiriçá registrar os filhos, seguindo de trem (na locomotiva a vapor Maria Fumaça) para o município de Jequié com Manuel, Silvanisio e Alaíde. De Jequié, colocou os filhos num caminhão de carregar mercadorias e passageiros e que funcionava a “gasogênio” (foi trazido ao Brasil em 1941, quando houve racionamento de combustível; era um tambor enorme que havia na carroceria, com fogo e carvão que ia para o motor) e seguiu rumo ao município de Poções. Partiu às seis horas da manhã e ás vinte e três horas chegaram em Poções encharcados por causa da chuva forte; hospedou os filhos numa pensão e continuou a viagem sozinho. No interior da Bahia havia um reduzido número de habitantes e era cheio de mata. Eram vinte léguas de estrada ruim de Poções a Bananal a pé. Aproximou-se do Rio Grande tarde da noite (está situado no meio do caminho que vai para Nova Canaã) e pediu abrigo e alimento a um proprietário de um barraco. Ao amanhecer, este senhor ao saber do seu destino, informou que o temporal do dia anterior ocasionou uma enchente e o rio do Vigário subiu e alagou toda a região e como este rio geralmente era raso, as pessoas o atravessavam a pé e por este motivo, não havia ponte. Acompanhou-o até o rio e amarrou a extremidade de uma corda em uma árvore que estava no lado direito, nadou até a margem esquerda e prendeu a outra ponta num tronco. Meu pai não sabia nadar e ficou muito grato pela ajuda. Passou segurando a corda e em seguida desatou o nó e o senhor a puxou de volta. Em Bananal, esperou o rio baixar, procurou seu sogro, lhe pediu emprestado alguns burros e voltou a Poções para buscar os filhos.

Ficou morando com os filhos num terreno que pertencia a Antonio Eudóxio, trabalhando e economizando dinheiro; ali havia um barraquinho. Nesse período, comia palmito, coco de andaiá... Depois alimentava-se comprando toucinho, saco de chuchu, fubá... (a distância até o comércio era quase uma légua), plantava café, abóbora, mandioca, feijão, arroz e milho, negociava esses produtos também. No princípio, saía de manhãzinha para ir derrubar a mata, fazer a roça e retornava à noite, cansado e deitava no chão, porque não tinha cama. Decidiu então, vender o terreno da Cova da Onça. Lutou muito para não deixar seus filhos morrerem de fome. Quando seu sogro faleceu, o local onde residia passou a ser seu por herança e graças às suas economias pôde adquirir a parte das irmãs de Alexandrina (Guiomar e Lalá), na época as duas eram vivas. Porém, o marido da Lalá, João Ferreira, tentou agir com esperteza: ele já havia embolsado todo o valor acertado, mas disse que somente daria a escritura se recebesse a safra de café que estava lá, catado e pilado. Esse senhor trouxe o documento um dia antes do combinado do descarregamento da colheita e assim, foi buscar o café e como meu pai se recusou a cumprir o trato, brigaram e por pouco não se feriram, rolaram na grama e João Ferreira estava armado com facão e uma pistola, por sorte, chegou um rapaz chamado Antônio e apartou a briga. Seu cunhado foi embora e a história terminou aí, pois o café era do meu pai e ele queria roubá-lo.

Contudo, houve outro desentendimento por causa desta propriedade: meu pai foi medir o terreno e verificou que estava faltando dois alqueires e percebeu que estava dentro da fazenda do vizinho, Joaquim Mendonça (era a parte da segunda mulher de Antonio Eudóxio e que havia sido vendida para um rico fazendeiro). Pôs a cerca na demarcação correta e o fazendeiro entrou em questão com ele e mandou um índio valente para matá-lo: ele foi de noite e rodeou o barraco onde morava meu pai, estava chovendo e no dia seguinte viu uma carreira de pegadas e ele havia arrombado o depósito de cereais. Por acaso, Joaquim Mendonça tinha ido a Poções e meu pai também, cada um ia por uma estrada diferente, mas logo adiante os caminhos se encontravam e se fundiam num só. Meu pai o viu sem ser visto e se escondeu atrás de um pé de Jequitibá antigo, com um tronco muito grosso e empurrou sua mula na frente do burro que ele vinha montado, fazendo com que ambos caíssem num buraco; tomou o rifle de repetição que ele trazia e seguiu para Poções e foi falar com o advogado do Joaquim, o Dr. José Sabino Costa (também era Promotor Público). Este, era amigo do meu pai, que lhe entregou a arma e contou o que houve, justificando que apenas queria dar um susto nele. Mas a briga das terras durou aproximadamente dois anos, quando por fim, Joaquim resolveu analisar as documentações e fez a medição, vendo que de fato, havia um pedaço a mais e permitiu a recolocação das cercas.

Comprou uma fazenda de alambique e engenho (era movido por bois e as moendas eram de madeira), próximo de onde morava, com plantações de cana-de-açúcar e capim. Fabricava aguardente (cachaça) e vendia para os comerciantes da região.

Em 1942, o “Cruzeiro” tornou-se a nova moeda nacional.

Casou-se com Áurea Muniz de Matos, natural do município de Nova Canaã. Filha de Fulgencio Rodrigues de Matos, e, Isabel Muniz de Matos. Conheceu-a na casa de Euflosina Matos, sua tia, com quem ela morava. Casaram-se no dia 28 de novembro de 1944, no município de Iguaí. Meu pai tinha trinta e dois anos e Áurea dezoito. Tiveram três filhos: Enoque, Maria da Glória (28/11/1947) e Maria José.

Estava limpando o cafezal junto com seu filho Manuel, quando este lhe pediu para que conseguisse um emprego para ele no comércio. Foi a Nova Canaã e falou com o velho Vital, proprietário de um bar que o empregou. Após dois meses tudo corria bem, até que ele foi lavar um copo, e este escorregou, caiu no chão e quebrou. O velho Vital lhe disse que ele só prestava para a roça. Manuel se aborreceu e foi embora imediatamente. No outro dia, o comerciante foi buscá-lo, mas Manuel se recusou a retornar. Passados três dias, veio à sua casa seu amigo Teobaldo, dono de uma loja de roupas na Vila Periperi (está situada próximo aos municípios de Vitória da Conquista e Poções; atualmente é um município e chama-se “Planalto”. Área: 815 km².) e ao saber que Manuel estava desempregado o levou para trabalhar com ele... como era longe, Manuel passou a dormir na residência desse senhor. Após alguns meses ele conversou com o pai, lhe contou que aprendeu a negociar, pois estava a seu encargo não somente a parte das vendas, como também o setor administrativo.

Meu pai saiu com o intuito de vender sua safra de café, quando encontrou o seu vizinho, o delegado Antônio Teles na cancela da sua fazenda ouvindo rádio e lhe deu a notícia de que o Presidente Getulio Vargas, enfrentando forte oposição, resolveu o impasse político suicidando-se com um tiro no coração, no Palácio do Catete (Rio de Janeiro), a 25 de agosto de 1954.

Seguiu seu percurso e foi à fazenda do compadre Bruno, que era o único que comprava café naquela região, pois somente ele tinha tropas de burro para transportar a colheita e revender. Meu pai queria vender sua colheita por um determinado valor, mas o compadre queria pagar menos, porém lembrou-se de que o presidente havia morrido e que provavelmente isto abaixaria a cotação do café e aceitou o valor oferecido. Dito e feito: os preços caíram consideravelmente! No dia seguinte foi a Nova Canaã e comprou um ponto comercial com mercadoria do senhor Canuto... Trouxe Manuel para organizar as coisas e inaugurou o comércio de secos e molhados. No início, os conhecidos diziam que ia ter prejuízo, que não iria para frente porque o proprietário anterior ficou tanto tempo naquele lugar e não progrediu e além disso, estava mal localizado, num canto da rua, longe do centro, na Rua da Mamona (atual Rua do Pombal). Mas meu pai teve a idéia de colocar no fundo da loja uma mesa com vinho, café, cachaça, pão, biscoitos, bolos, etc., então as pessoas vinham comer algo e adquiriam os produtos. Assim, o negócio prosperou e deu muito lucro. Após seis meses, vendeu aquele ponto e alugou outro na Rua da Feira, no centro.

Mudou-se para Nova Canaã, uma vila com muita mata. Nova Canaã originou-se da fazenda pertencente a Love Rodrigues Matos (tio de Áurea) que estava localizada no município de “Água Fria” (município criado em 1727) e depois juntou também a fazenda do seu irmão, Bernardino Rodrigues Matos que era pegada a dele. O município de Nova Canaã iniciou a ser construído em 1942. Popularmente se diz que este município foi fundado para ser uma comunidade evangélica, porém a verdade é que seus fundadores eram evangélicos e o pastor da igreja que freqüentavam, era professor na fazenda de Bernardino e assim, as pessoas absorveram suas crenças e por isto hoje em dia, a maioria dos habitantes de Nova Canaã são evangélicos. Atualmente, o comércio se multiplicou, contudo apenas saiu do estado selvagem, não se desenvolveu. Na entrada da cidade há um portal escrito: “Bem-vindos a Nova Canaã a Terra Prometida”. Foi oficialmente instalada em 07.04.1963. Área: 682 km².

A luz dos lampiões a gás aos poucos foi substituída por pequenas redes elétricas de iluminação.

Três anos depois decidiu vender as duas fazendas.

Costumava ir com Manuel a Vitória da Conquista para comprar mercadorias para suprir o estoque do comércio e sempre se hospedava na pensão de Dona Maria. Em uma dessas ocasiões, havia acabado de chegar com o propósito de ir a Salvador, quando esta senhora lhe sugeriu que fosse ao Estado de São Paulo, pois poderia aproveitar carona de um caminhoneiro que se dirigia para lá e que estava pernoitando ali. Ela conversou com o motorista e se responsabilizou por eles, uma vez que ele ficou receoso de transportar pessoas estranhas. Antes de partir, meu pai foi a casa de um amigo, Gardino Vieira, que era um influente comerciante e pediu que lhe desse uma carta de recomendação, mas este não conhecia ninguém neste Estado, no entanto, o apresentou a um amigo que negociava com vários empresários paulistas. A viagem a São Paulo foi cansativa, chovia muito e a estrada era péssima... demoraram uma semana viajando e chegaram enlameados. Hospedaram-se no Hotel dos Motoristas, muito simples; após tomar banho e descansar, pegaram um táxi e foram a Avenida São João, ao apartamento do senhor a quem deveriam entregar a carta. Este foi logo perguntando se era parente do remetente e meu pai achou melhor responder que sim, e desta forma ele lhe serviu de fiador nas melhores fábricas (comprou alumínio, louças, vassouras, machados, foices, enxadas, etc). Este senhor recomendou que mudasse de hotel, pois onde estavam hospedados tinha fama de haver ladrões nas redondezas e assim foi para o Hotel Matias, na Rua Vinte e Cinco de Março. No dia seguinte, acordou cedo e passeava em frente ao hotel quando abriam as portas de uma loja e ele se deteve olhando a vitrine e apareceu um italiano alto e gordo e perguntou se desejava alguma coisa e este lhe explicou que vinha da Bahia. O comerciante comentou que o seu sócio, Vicente, também era deste Estado e meu pai pediu para chamá-lo. Este surgiu na porta nervoso e irritado, pois estava muito ocupado e então meu pai o reconheceu e exclamou que o conhecia e este respondeu que nunca o tinha visto. Meu pai lhe disse: “Vicente, você não é de Jiquiriçá, neto do velho Zé Nero? Foi ele quem te criou, pois seus pais haviam morrido e sua irmã se chamava Maria. Todos os domingos você ia na fazenda do meu pai para brincar comigo e comer frutas!” O amigo sorriu e o abraçou: “O que você está fazendo aqui?”. Meu pai lhe contou da dificuldade que estava tendo para recolher as mercadorias, porque naquele tempo não se podia estacionar quando quisesse, havia hora marcada e isto atrapalhava, uma vez que estava comprando em lugares muito distantes um do outro. Vicente lhe deu seu cartão de visitas e o instruiu que solicitasse que entregassem os embrulhos no armazém dele e assim poderia realizar um único apanho. Encontrou um rapaz que era cunhado de Antonio Teles, o delegado de Nova Canaã, e fretou o caminhão dele para levar as mercadorias até o município de Vitória da Conquista. Chegando ali fretou outro veículo para Nova Canaã. Passou a ir a São Paulo com este mesmo intuito de dois em dois meses.

Nessa época, ele comprou seu primeiro rádio e naquele tempo não era um produto encontrado com muita facilidade nas cidades do interior.

Havia ido a São Paulo com Manuel comprar um jipe e vários pacotes de cigarros, e levou tudo sem pagar imposto, inclusive o veículo. Porém, quando passavam pelo posto de fiscalização próximo a Aparecida do Norte tiveram que parar e pediram as notas fiscais dos produtos e do jipe; logo ficou claro que era contrabando e tudo ficou retido. Próximo dali havia um bar e um dos guardas estava sentado sozinho e distraído. Meu pai aproximou-se dele e o convidou para tomar uma bebida e lhe perguntou quem era o chefe e este respondeu que ele estava em outra cidade e lhe explicou o endereço e indicou o ônibus para chegar até lá. Meu pai lhe prometeu uma gratificação se ele se comprometesse a vigiar o jipe e os cigarros. Chegou no hotel onde ele morava no fim da tarde; o proprietário do estabelecimento lhe explicou que ele saia todo dia de manhãzinha e só retornava à noitinha. Ao amanhecer, ficou próximo à porta do quarto dele, esperando que saísse e quando isto aconteceu, o abordou e disse que tinha algo muito importante para tratar com ele. Entraram no quarto e meu pai lhe suplicou tentando ser o mais convincente possível: “Coronel, eu não entendo de lei, sou da roça, do interior da Bahia. Comprei um jipe e alguns cigarros para ajudar em meu negócio de secos e molhados, mas eu não sabia que tinha que ter documentos... quem me vendeu não me explicou nada.” Então o chefe o chamou para tomar café, pagou a conta do hotel deles e os levou de carro até onde havia sido feita a apreensão e lhe devolveu o jipe e os cigarros. Porém, informou que não poderia isentá-lo da multa e que seria enviado para ele e anotou o endereço do meu pai.

Foi a Jiquiriçá, a casa de Alípio, buscar sua mãe e seu filho, José.

Meu pai e Manuel estavam num jipe dirigindo-se a Poções e subiam uma ladeira e viram duas pessoas num carro atolado na lama (naquela época meu pai era uma das poucas pessoas que possuíam jipe com corrente nas rodas) Ele entrou no meio do lamaçal, colocou pedras debaixo das rodas e mandou ligar o motor; o motorista mostrou-se muito grato e se apresentou dizendo que era o Juiz Dr. Jofre Valmório de Lacerda e depois desse dia eles se tornaram grandes amigos. Em outra ocasião, meu pai se dirigia ao município de Itabuna numa Rural e se atolou; passou um senhor que era um fazendeiro muito rico e não prestou auxílio e ele ficou ali até o dia seguinte, quando passou uma pessoa e finalmente o socorreu. Alguns meses depois, seguia meu pai e Manuel para Poções, chovia muito e eles encontraram um casal num carro atolado. Meu pai os ajudou a sair do atoleiro e depois o homem agradeceu, mas meu pai respondeu que ele não valia nada, porque da vez passada, este senhor passou direto e o ignorou.

Estava numa venda quando chegou um conhecido de Jiquiriçá e lhe contou fatos que haviam se passado muitos anos atrás: seu irmão Alípio sofreu uma tentativa de assassinato e seu pai ficou três dias preso como suspeito e confessou ter mandado o enteado matar o filho (por usura dos seus bens). Foi o maior escândalo em Jiquiriçá! Crispin ficou seis meses encarcerado. O facão pegou nos dois dedos da mão e na cabeça de Alípio e este foi ao município de Ubaíra para se tratar e sobreviveu. Meu avô e a Chichinha venderam a Fazenda Pindoba com o objetivo de tirar Crispin da cadeia e, como a opinião pública era contra a soltura, meu avô mandou soltar fogos de artifícios para mostrar a todos que havia sido vitorioso. Depois de algum tempo a Chichinha morreu com uma doença grave e seu pai estava passando fome. Fazia muitos anos que havia saído de lá e desde então, não teve nenhuma noticia. Estava caducando e morando sozinho num barraquinho na beira da Fazenda Pindoba. Foi imediatamente buscá-lo e o trouxe para sua casa.

“Honra a teu pai e a tua mãe, para que te vá bem, e sejas de longa vida sobre a terra.” (Éfesios 6: 1-3)

Passado alguns anos, comprou o sobrado que ficava em frente ao seu comércio. Mudou-se para o pavimento superior e transferiu sua loja para o térreo, porém, decidiu ser comprador de café.

Tornou-se um comerciante de café de grande prestígio. A empresa se chamava MOTA E FILHOS IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO DE CAFÉ. Compunham a sociedade meu pai, Manuel, Silvanisio e Moisés (casado com a prima do meu pai, que era filha da irmã do meu avô, Maria). Tinham filiais nos municípios de Nova Canaã, Iguaí, Bicui, Itajaí, Poções e Ponte Nova (MG). No Rio de Janeiro (Copacabana), tinham um escritório no Beco do Bragança, Manuel ficou lá e ele, em Poções; em Nova Canaã, Silvanisio; Alaíde casou-se com Pedro Andrade e entrou para o comércio também, em Itajaí. Tinham diversos empregados, na maioria, mulheres. O café era adquirido de vários fazendeiros de toda a Bahia... chegavam em sacos, nos lombos de burros por tropas de lotes de dez a vinte animais dirigidos por tropeiros ou em caminhões; houve uma ocasião que estocou setenta mil sacos de uma só vez. Possuíam três maquinários (um em Poções, Nova Canaã e outro em Ponte Nova (MG)) para o processo de seleção: jogava-se o café dentro das máquinas e as pedras, ciscos, palhas e os quebrados saíam de um lado e o caroço bom, noutro lado. A seguir os grãos passavam para as mãos das catadoras, a fim de garantir a qualidade do mesmo, ou seja, que estaria cem por cento livre de impurezas e, só assim o produto era ensacado definitivamente (cada saco pesava sessenta quilos) e ia rumo ao Rio de Janeiro para o embarque no porto, pois o café já estava vendido... ia tudo para o estrangeiro: Estados Unidos, Itália...

Dentro do armazém de café, em Poções, na Rua de Morrinhos, havia uma fábrica de aguardente. Para a produção, compravam um caminhão de álcool vindo do Estado de Pernambuco. Havia um compartimento fechado com tampa, onde eram misturados: cinqüenta latas de álcool, dez latas de água e um arroba de açúcar branco (quinze quilos) e ali ficava fermentando por oito dias. O nome da cachaça era “Branquinha” e vendia muitos barris para toda a Bahia.

Meu pai havia chegado de viagem a São Paulo e Áurea lhe contou que sua mãe, Epifania, estava preocupada, perguntando toda hora por ele. Foi ao quarto dela, mas estava dormindo. Sua mãe estava bem velhinha, não enxergava direito, não tinha firmeza nas pernas, sua memória estava debilitada e não se recordava de muita coisa. Foi vê-la de manhãzinha e ela o abraçou chorando e ele sentou na beirada da cama e ela colocou a cabeça no seu colo; meu pai acariciava seus cabelos carinhosamente e conversava com ela, mas ao notar que não respondia, percebeu que havia morrido.

No dia 21 de abril de 1960 foram a inauguração de Brasília, meu pai, Áurea, Manuel, Enoque, Maria José e Maria da Glória. Brasília está localizada no Distrito Federal, na região Centro-Oeste no Brasil. O slogan do presidente Juscelino Kubitschek era: “Cinqüenta anos de progresso em cinco anos de governo". Era o último ano do mandato deste presidente que durante toda a campanha presidencial defendeu a criação da nova capital do país. Em 1548 a capital do Brasil estava localizada em Salvador, no Estado da Bahia. Em 1808, com a chegada da família real, o Rio de Janeiro torna-se a sede do governo português; após a independência, a cidade continua como capital. Quando chegaram, à festa da inauguração já havia terminado, mas teve o prazer de conversar com o Juscelino. As construções dos monumentos da cidade, não estavam totalmente concluídas. Ficaram quatro dias por lá, e o seu objetivo era comprar um terreno, mas, não encontraram nenhum a venda e foi informado que nos Estados de Goiás e São Paulo, havia algumas pessoas que estavam revendendo terrenos. Então, dirigiu-se para estes dois lugares, mas já estava tudo vendido e assim, terminou a viagem no Estado do Rio de Janeiro, onde aproveitou para visitar os pontos turísticos, retornando depois a Nova Canaã.

Meu pai mudou-se com a família para Poções, morando na Rua de Morrinhos, ao lado do seu armazém.

Poções limita-se com os municípios de Boa Nova e Iguaí ao Norte, Nova Canaã ao Leste, com Bom Jesus da Serra a Oeste e Planalto ao Sul. O nome Poções vem da existência de grande quantidade de poços na parte baixa da cidade, onde hoje é o centro. Em 1857 - Criação do Distrito de Poções, pertencente à Conquista; 1880 - É elevada à categoria de Vila dos Poções; 1883 - É fundado o Município de Poções. Nomes anteriores: Distrito de Vila de Poções, Poções, Djalma Dutra em 1943 e novamente Poções em 1947, após os movimentos feitos por Poçoenses que não aceitaram a nova denominação. Área: 966,3 km².

A empresa MOTA E FILHOS IMPORTAÇÃO E EXPORTAÇÃO DE CAFÉ, doou a Igreja do Divino Espírito Santo de Poções, o sino; na época quem administrava esta igreja era o padre Honorato.

Seu pai estava a cada dia mais difícil de lidar, pois estava completamente fora do juízo e quebrava as coisas dentro de casa, assim, foi necessário construir um quarto para ele, do lado de fora da casa, mesmo assim, uma vez ele arrebentou a porta e saiu correndo em disparada e foram encontrá-lo caído numa poça de lama.

Procurando diversificar a cultura, o governo de Castelo Branco (1964-1967), passou a incentivar a derrubada de plantações de café com baixa produção, substituindo-as por lavouras mecanizadas e de maior rendimento. Naquela época o café era o principal produto cultivado no Brasil, então o governo queria diminuir a produção para aumentar o preço que era barato demais e assim pagava para queimar o café, ou seja, havia uma pessoa responsável para este procedimento, geralmente a polícia, e a pessoa interessada em vender o café levava todos os documentos para provar a legalidade do mesmo (impostos pagos, etc). Todo o café comprado era enviado para um ponto entre os municípios de Feira de Santana e Salvador (na mata) e era tudo queimado. Então, vendeu todo o seu estoque e encerrou o comércio de café; mas, até hoje ele acompanha no noticiário da TV a cotação do café.

Meu pai passou a comprar e vender arroz e fumo. O cereal era comprado direto dos fazendeiros, já ensacados, em São Luís (foi fundada pelos franceses em 1612 e recebeu este nome em homenagem ao rei Luís XIII) e Bacabal (era uma pequena cidade com muito areal, não tinha hotel e havia vários pés de mangas na rua e era muito longe da capital; o nome deveu-se a grande quantidade de bacaba, coco selvagem, existente na localidade quando de sua fundação), ambos localizados no Estado do Maranhão; revendia para os comerciantes do Estado da Bahia. O arroz comprado em Bacabal era transportado através de um barco, na lotação de 110.000 sacos e devido ao peso do carregamento e o barco ser pequeno, meu pai ficava com medo que a embarcação afundasse, (uma vez, por pouco, quase afundou) e chegavam a São Luís em dois dias. O fumo era comprado nos armazéns e depois era enfardado e vendido para a empresa Tabacalero nos municípios de Feira de Santana e Salvador.

Manuel teve a idéia de que todos fossem ao município de Governador Valadares, no Estado de Minas Gerais, pois, segundo ele, “ali era um lugar que corria dinheiro”, e mudaram de ramo de negócios e de cidade.

Governador Valadares está situada no leste do Estado de Minas Gerais. Ao longo do tempo a cidade teve vários nomes: 1734 - Arraial de Porto de Dom Manuel; 1808 - Porto das Canoas; 1888 - Santo Antonio da Figueira; 1889 - Distrito De Santo Antônio do Bonsucesso; 1923 – Figueira; 1937 - Figueira do Rio Doce; 1938 - Governador Valadares. A cidade, localizada no vale do Rio Doce, é quase totalmente plana. Começou a surgir com a subida do Rio Doce pelos bandeirantes e comerciantes canoeiros que vinham do Espírito Santo, no início do século XIX. Em 1910, instalou-se a estação ferroviária local. Área: 2.447 km².

Alugaram uma sala no primeiro andar de um prédio, depois pagaram aos demais ocupantes deste pavimento para desocuparem as salas e derrubou todas as paredes e assim, foi inaugurado o Supermercado Canguru. Abriu uma filial do supermercado debaixo do Hotel Pitangui e tinha um depósito de mercadorias na Rua São Paulo. Manuel criou um logotipo para a empresa com o nome CANGURU, porque aquela parte do carrinho onde se coloca as compras parece com a barriga do Canguru e o local onde o cliente segura o carrinho parece com a frente desse mamífero australiano.

Meu pai havia ido ao município de Teófilo Otoni buscar suas filhas Maria José e Maria da Glória na escola e ao chegar, perguntou a Alaíde como estava seu pai e ela disse que havia lhe dado banho e a janta. Quando ele entrou no quarto, seu pai estava sentado diante da mesa, segurando o garfo e a faca. Ao se aproximar dele, percebeu que havia morrido.

Depois que mudou-se para Governador Valadares, a família já não se entendia como antes. Desentendeu-se com a Áurea. Moravam num apartamento e ele estava no quarto deitado refletindo sobre sua vida, quando entrou Áurea e lhe disse que era melhor cada um dormir em quartos separados a partir daquele dia e então ele respondeu que o ideal é que se separassem definitivamente e arrumou as malas e foi embora... decidiu ir à casa da sua filha Alaíde, que morava num bairro próximo dali. Foi dormir sem saber o que ia fazer da sua vida. Sonhou que uma luz forte (que ele, por ser católico, interpretou como sendo Nossa Senhora), lhe dizia que deveria pegar o primeiro trem e ir para Vitória e um ônibus para Guarapari, no Estado do Espírito Santo. Despertou de madrugada, ficou impressionado com o sonho e sem conhecer ninguém naquela região, fez as malas e partiu. Alaíde ainda perguntou: “Por que o Senhor acordou tão cedo?”, “Vou para Vitória”, “O Senhor conhece Vitória?”, “Quem tem boca vai a Roma”.

“Ora, não sabeis o que acontecerá amanhã. O que é a nossa vida? É um vapor que aparece por um pouco, e logo se desvanece.” (Tiago 4: 14)

Guarapari começou a ser colonizada pelo padre José de Anchieta, em 1585. Seu desenvolvimento se deve a descoberta da areia monazítica em suas praias. Está situada a 54 quilômetros de Vitória. Guarapari recebeu os seguintes nomes: Aldeia de Rio Verde ou Santa Maria de Guaraparim, Vila dos Jesuítas, Goaraparim, Guaraparim e finalmente Guarapari, que é derivado de duas palavras de origem indígena: o prefixo Guará = garça e o sufixo Pari = armadilha de caça. É conhecida como a "Cidade Saúde", devido as propriedades medicinais de sua areia monazítica. Área: 606 km².

Na Rodoviária de Vitória (capital do Espírito Santo), enquanto esperava o ônibus para o município de Guarapari, fez amizade com Antonio Valentim Rodrigues e sua esposa Filipina da Silva Valentim, que residiam no bairro Muquiçaba, em Guarapari e assim, ficaram conversando durante a viagem e este senhor convidou meu pai para passar uns tempos na casa dele. Valentim era um homem muito rico e tinha muitas lojas e apartamentos alugados no Rio de Janeiro e em Guarapari. Incentivou meu pai para entrar no comércio de compra e venda de lotes (imobiliária). Com o dinheiro que trouxe de Governador Valadares, comprou três lotes. Montou um escritório em Muquiçaba e assim chegou a ter dez lotes.

Em 1967 a desvalorização do “Cruzeiro” levou a criação do “Cruzeiro Novo”.

Viajou a Poções e lá, por acaso, encontrou-se com José Correia dos Santos, este ao saber da separação com a Áurea ofereceu uma das suas filhas para que ele desposasse (Egilda ou Maria do Carmo). Meu pai lhe disse que veio a esta cidade para receber um dinheiro, mas depois iria a sua casa no município de Itororó (vem do tupi e significa “pequenas cachoeiras”). Com quinze dias cumpriu o prometido e decidiu escolher Maria do Carmo, pois já a conhecia de vista. Ela porém, estava trabalhando na casa de uma prima no município de Votorantin. Fretou um jipe, chamou o irmão dela, Antônio, e foram buscá-la. A prima não queria que ela fosse embora, no entanto, a deixou partir. No caminho explicou-lhe sua intenção de viver maritalmente com ela. Ela aceitou. Reuniu-se com os pais dela, José Correia dos Santos e Anita Leal dos Santos e foram num advogado e fizeram um documento reconhecido em Cartório oficializando este acordo: era 02 de março de 1967. Ela tinha dezoito anos e ele cinqüenta e cinco anos. Seguiram para Vitória da Conquista e comprou-lhe roupas novas seguindo para o município de Monte Santo, onde passou uma semana na casa de Rimoaldo (sogro de Silvanisio), retornando a Guarapari. Permaneceu na casa de Valentim por seis meses e mudou-se para a casa de praia de Nilson em Muquiçaba (um farmacêutico que conheceu na Praia do Morro) e permitiu que ele morasse ali por quatro meses sem pagar nada. Alugou um apartamento todo mobiliado por um período de um ano. Desta união nasceram: Rosilda (1968 - Valentim foi seu padrinho de batismo), eu (Rosimeire, (1969) e Robson (1971-1991).

Meu pai sempre estava em contato com seus filhos, parentes e amigos.

Estava em casa, descansando, quando ouviu pelo rádio a notícia de que o ex-presidente Castelo Branco morreu num acidente aéreo... era o dia 18 de julho de 1967 (deixou o governo em 15/03/1967); o aparelho em que viajava chocou-se em pleno ar com um jato da FAB.

A sentença do desquite de meu pai e Áurea foi proferida pelo M. M. Juiz da Comarca de Governador Valadares (MG), em 18 de junho de 1969 e confirmada pelo Egrégio Tribunal de Justiça daquele Estado. Segundo consta, os conjugues foram ouvidos em separado e exortados a reconciliação, sem que desse resultado.

Com um ano, tinha uma fazenda na localidade de Jaqueira com vinte alqueires de primeira qualidade, com trinta vacas de leite e criação de peixe e que se chamava Fazenda Rio Grande (tinha este nome devido a um rio imenso que cortava toda a propriedade). Assim, os pais de Maria do Carmo e seus irmãos (Egilda, Antônia, Antônio e Elizeu) vieram para Guarapari morar com eles.

Trocou um lote na Praia do Morro, em Guarapari, por um terreno de 3.000 metros no bairro Aribiri, no Município de Vila Velha.

Em 1968, veio para o município de Vila Velha e fixou residência no bairro Aribiri (palavra indígena que significa barata d`água, cujo habitat natural são as pedras existentes no rio com este mesmo nome). A região já foi um quilombo de escravos e foi transformada em povoado em 1910, em decorrência do projeto da linha de bondes. Morava ao lado do Posto Sete, na antiga Rua Estrada Velha, n.º 67, atual Rua Emydio Ferreira Sacramento. Nos fundos de nossa casa havia muitas árvores: fruta-pão, goiaba, pau-brasil, cacau, etc. De quando em quando apareciam muitos vaga-lumes e borboletas coloridas (amarelas, brancas, etc). Cortou as árvores e construiu uma casa. Alugou a casa da frente e nos mudamos para a nova. Os fundos deste terreno saia na Rodovia Carlos Lindemberg, assim construiu quatro lojas. Com o tempo, construiu em cima da casa da frente e nos mudamos para ali, alugando a anterior. Onde era a garagem fez um ponto comercial.

Vila Velha é a cidade mais antiga do Estado do Espírito Santo, berço da civilização capixaba. Em 1534, Vasco Fernandes Coutinho, em Alenquer (Portugal), recebeu a carta regia que o tornava donatário de uma capitania, nas terras brasileiras. Ele desembarcou com sua caravela Glória em 23 de maio em 1535, onde hoje é a prainha... era domingo do Espírito Santo (ou Pentecostes, 50 dias após a Páscoa), razão pela qual a capitania recebeu o nome de vila do Espírito Santo. Quando a sede da capitania foi transferida para a ilha de Vitória (para fugir dos constantes ataques dos índios Goitacazes... aliás, justamente por ter conseguido vencer a batalha com os índios é que esta ilha passou a se chamar "Vitória"), por volta de 1550, a vila do Espírito Santo passou a ser chamada de VILA VELHA. O nome tornou-se oficial para designar o município em 1958. Possui belíssimas praias, com destaque para a Praia da Costa, uma das mais procuradas em todo o Estado. Seguindo para o Sul, chega-se às praias de Itapoã, Itaparica e Barra do Jucu, esta mais freqüentada pelos adeptos do surf por causa de suas ondas altas. Mais adiante há ainda a Ponta da Fruta e a Praia do Sol. Temperatura agradável, estando o sol sempre presente. Vila Velha é ligada à Vitória, por três pontes. Área: 211 km². Limita-se com Vitória ao norte, ao sul com Guarapari, leste com o Oceano Atlântico e a oeste com Cariacica.

Quando chegou nesta cidade havia algumas linhas de ônibus em circulação (era um projeto recém posto em prática, levando os bondes a extinção). Naquele tempo a Rodovia Carlos Lindemberg e a Avenida Jerônimo Monteiro ainda não eram asfaltadas.

Manuel veio contar a meu pai que ia vender o Supermercado Canguru porque descobriu-se que o contador recebia o dinheiro para pagar os impostos, porém embolsava o valor e emitia informações falsas. A Receita Federal veio fiscalizar a empresa porque a dívida com o governo era altíssima. Moisés, o sócio, foi o único que não ficou numa situação difícil e estava milionário!

Começou a fazer casa, a comprar e vender lotes nesse município: tinha dezoito inquilinos e cento e vinte lotes.

Infelizmente, não se entendeu com meu avô José Correia e após uma série de desentendimentos, tomou a decisão de vender a fazenda por uma ninharia. Teve um prejuízo enorme! Os pais da minha mãe foram morar no bairro Vale Encantado, em Vila Velha.

Em 1970, o “Cruzeiro Novo” voltou a chamar-se apenas “Cruzeiro”. Neste ano, meu pai estava passando com o seu fusca novo no bairro IBES, então Adelson, um senhor que ele conhecia de vista e que tinha um comércio de madeiras, o chamou para negociar o carro com o imóvel que ele tinha naquela rua e onde estava seu comércio: era um galpão com uma laje e uma casa nos fundos. O trato foi entregar o veículo e voltar mais dinheiro. Foram ao Cartório Leandro, próximo dali e passou o carro para o nome de Adelson, sem documentar a compra do imóvel. Depois meu pai soube que Adelson já havia vendido para outra pessoa e não deu o documento. Adelson foi ao encontro do meu pai e disse que veio receber a importância combinada e meu pai deixou claro que só pagaria com a escritura em mãos, mas este informou que essas formalidades levariam trinta dias para ficar prontas. Depois ele comentou com um amigo, que meu pai era um besta que veio da Bahia para dar um carro para ele, pois ele não era maluco de vender aquela propriedade por aquele valor. Adelson transferiu seu comércio para o fim da rua, próximo a Rodovia Carlos Lindemberg. À noite, meu pai vestiu o paletó e botou o revólver na cintura e foi ao armazém de Adelson; quando este já encerrava o expediente e se dirigiu ao escritório, meu pai entrou atrás e trancou a porta. Aproximou-se de Adelson fingindo que ia conversar amigavelmente e subitamente chegou bem perto e o agarrou pela gola da camisa, colocou a arma dentro da boca dele e descreveu os comentários que os amigos lhe contaram sobre sua intenção de trapaceá-lo. E perguntou: “Você vai dar a escritura ou não?” Este sugeriu que fossem ao seu advogado para acertar os detalhes. No escritório de advocacia Adelson foi dizendo: “Este é o homem que eu te falei!”. E o Dr. Nilson Neves exclamou: “Você está doido! Ele é meu cliente e é gente boa!” Então meu pai contou sua versão do caso. Foi datilografada uma declaração onde Adelson se comprometia a dar a escritura no prazo de três dias. Na data marcada, ele chegou com a esposa no Cartório Leandro, dizendo que se não tivesse o dinheiro perderia o carro. Meu pai perguntou ao tabelião João Leandro: “Já lavrou a escritura?”, e este respondeu que só poderia fazê-lo com o dinheiro prometido. Meu pai pôs a mão no bolso e retirou um saco de dinheiro e despejou em cima do balcão e pediu a João Leandro que separasse a quantia para Adelson, mas que somente entregasse a ele após sua assinatura. Quando encerrou a negociação, Adelson chorou, pois pensava que meu pai não tinha dinheiro, pois ele se trajava de maneira simples e parecia uma pessoa típica do interior e portanto, fácil de enganar, porém compreendeu amargamente que as aparências enganam.

Começou a construir na laje deste terreno em 1971 morando ali em seguida e alugou a casa no Aribiri, sendo este ano, a ultima vez que viu Antonio Valentim. Naquela época ninguém se preocupava em trancar as portas e ficavam conversando até mais tarde no lado de fora e as crianças brincavam tranqüilas na rua. As noites eram silenciosas e calmas. Em 1972, voltou a morar no Aribiri e alugou o apartamento no bairro IBES, mas em 1979, decidiu voltar a morar definitivamente no IBES e em 1990 vendeu a propriedade do Aribiri.

O bairro IBES ("Instituto do Bem-Estar Social do Espírito Santo”), conjunto residencial construído em 1952; projetado com formato de uma flor (na verdade, forma a figura de um grande hexágono, com a Praça no centro), dividido em setores. No setor Jerônimo Monteiro, residiam funcionários públicos e seus familiares; no setor Unidos da Vale, moravam empregados da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD); no IAPC, pessoas ligadas ao comércio; os demais setores eram mais diversificados. Em 1954, trezentos e cinqüenta moradores receberam as chaves das casas. Em 1955, foi construído o centro comercial, próximo à Praça Assis Chateaubriand.

Em 1986, a desvalorização do “Cruzeiro” levou a criação do “Cruzado”.

Tinha dois lotes no bairro Barra do Jucu: Limpou, plantou (aipim, feijão de corda e guandu) e cercou. Meu pai adoeceu e demorou alguns dias sem ir lá, quando voltou havia dois barracos, sendo que um deles já havia pessoas morando. Ele chamou a atenção dos invasores e eles responderam que “Já era! Agora o terreno era deles”. Meu pai deu um prazo de vinte e quatro horas para que desocupassem a propriedade. Então, naquele mesmo dia, às dezenove horas da noite, com a ajuda do meu irmão Robson e alguns amigos dele, foram ao local e com uma foice e uma alavanca, derrubaram o primeiro barraco e no outro onde residia um casal, bateram na porta e eles compreenderam o que estava acontecendo e gritaram que não iam sair. Meu pai arrancou uma tábua do quarto e jogou dez litros de gasolina e acendeu o fósforo. Em questão de minutos o fogo se espalhou e o casal saiu correndo com apenas a roupa que usavam. Meu pai e meu irmão retornaram para casa às vinte e três horas.

No município de Cariacica, comprou sete lotes juntos. Colocou um caseiro com a família e ele quis tomar a propriedade. Mandou a filha avisar que estava esperando para lhe dar uma surra. Meu pai colocou o revólver na cintura e foi para lá. Próximo ao terreno morava um amigo policial, Adilson, comentou com ele a situação e o que pretendia fazer, mas este lhe disse que resolveria a questão. No outro dia, Adilson, colocou o caseiro e seus familiares para fora. Por fim, decidiu se desfazer da propriedade porque todos os empregados contratados causavam problemas.

Em 1989, a desvalorização do "Cruzado" levou à criação do "Cruzado Novo". Em 1990, a moeda nacional volta a chamar-se "Cruzeiro". A moeda desvalorizou-se mais duas vezes: Em 1993, passando a chamar-se "Cruzeiro Real", e em 1994, que levou a criação do "Real", vigorando até os dias de hoje.

Em maio de 1996, meu pai ficou internado no hospital público “Antônio Bezerra de Farias”, pois contraiu pneumonia. Além disso ele foi aparar a unha do pé esquerdo e cortou um pedacinho do dedo e foi muito difícil estancar o sangue. A diabetes dificulta a cicatrização de feridas e a parte do dedo apodreceu e o médico a retirou. Depois começou a ficar com uma aparência estranha, e o doutor cortou metade do dedo. Ele sente dormência nas pernas e por isso não doía... anda bem devagar. No primeiro dia que fui visitá-lo, ele não estava lá: dividia o quarto com seis enfermos e eles me contaram que ele havia ido visitar os outros doentes. Ele conhecia quase todos os pacientes e sabia o problema de cada um. Segurava o suporte do soro que estava tomando e saia a visitá-los. Passado uns quinze minutos retornou ao quarto e ao me ver, foi se explicando: “Fui me despedir de uma senhora que ia receber alta hoje, a família vinha buscá-la e eu queria conhecê-los”. Depois de duas semanas, telefonou para meu trabalho a chefe da enfermaria, informando que meu pai havia fugido. Arrumou a mala e ficou escondido atrás de uma parede e ficou observando o vigia, quando este se afastou da porta, saiu apressado rumo ao ponto de ônibus (pessoas a partir de sessenta anos não pagam passagem). Quando fui em casa almoçar ele estava me esperando na porta e me disse que não agüentava mais ver tanta gente doente!

Por um motivo ou por outro acabou vendendo todos os seus imóveis e hoje, possui apenas a propriedade onde mora, no bairro IBES.

Atualmente, Manuel mora em São Paulo (SP); Silvanisio faleceu em 2004 de câncer e residia em São Luís (MA); Alaíde em Governador Valadares (MG); José em Fortaleza (CE); Enoque em Goiânia (GO); Maria da Glória em Nanuque (MG), e, Maria José em Goiânia (GO).

Por erro do Cartório, eu e meus irmãos (do terceiro casamento do meu pai), assinamos “Motta” com dois “t” (“tt”), porém, o correto seria grafar “Mota” com um “t”.

In memoriam a meus avôs maternos:
Anita Leal dos Santos:
nos deixou em 22 de agosto de 1983.
José Correia dos Santos:
nos deixou em fevereiro de 1991.

In memoriam a minha mãe e meu irmão:
Maria do Carmo Leal dos Santos:
nos deixou em 28 de fevereiro de 1994.
Robson Leal da Motta:
nos deixou em 28 de agosto de 1991.

Nesse ano de 2005 meu pai completou 93 anos. Ele estava sentindo-se mal e foi ao médico e este, em tom de brincadeira, disse: “Está reclamando de quê? O Senhor já passou do tempo de morrer... as estatísticas dizem que hoje em dia, ninguém vive mais do que setenta e cinco, oitenta anos...”

O nome “Pedro” é uma palavra latina e significa: “pedra, rocha”.

“Muitos são os planos do coração do homem, mas é o propósito do Senhor que permanecerá.” (Provérbios 19: 21)

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NOTA DE ESCLARECIMENTO:

Meu pai, PEDRO SABINO DA MOTA, foi o principal narrador desta história, contudo, pesquisei na Internet, em livros e revistas algumas informações para ilustrar o texto, tornando-o interessante e mais compreensível. Abaixo seguem os devidos créditos
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FONTES CONSULTADAS:

*Vainsencher, Semira Adler. “Lampião (Virgulino Ferreira da Silva)”, e, “Cangaço” .
Acesso em: 10 out. 2005. Disponível em:
< http://www.fundaj.gov.br> Fundação Joaquim Nabuco

*Instaschi, Celso. Por Dentro Da História.
Acesso em: 10 out. 2005. Disponível em:


*Mello, Frederico Pernambucano de. O Guerreiro do sol. Revista de História da Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, ano 1, n.3, p.18 a 24, set. 2005

*Caetano, Maria do Rosário. ‘Nordestern’: Luz, Câmara, Cangaço. Revista de História da Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, ano 1, n.3, p.25 a 27, set. 2005

*Brasil 500 Anos – O Brasil do Sertão e dos Sertanejos. São Paulo, Editora Abril – v 2 - Fascículo 10 -. p. 626 a 627

*Ferreira, Olavo Leonel. História do Brasil. “O Coronelismo”, e, “Juscelino Kubitschek.” 17ª.ed. São Paulo. Editora Ática., p 292 e 293 – p 377 a 379. 1995

*Ferreira, Pablo. Varíola.
Acesso em: 18 out. 2005. Disponível em:
http://www.fiocruz.br/ccs/glossario/variola.htm
Fundação Oswaldo Cruz

*Ruiz, Manoel. A História da Moeda no Brasil.
Acesso em: 15 out. 2005. Disponível em:


*Histórias e histórias do Rio de Janeiro. “Capital do Brasil no Rio de Janeiro” - Acesso em: 05 nov 2005. Disponível em:
http://www.almacarioca.com.br/historia.htm

*Municípios da Bahia. Conceição do Almeida, Nova Canaã, Jiquiriçá, Planalto, Bom Jesus da Lapa.
Acesso em: 20 out. 2005. Disponível em:
< http://www.pfldabahia.org.br/municipios.asp>
Obs.: A maior parte das informações sobre estas cidades foram fornecidas por meu pai, parentes e amigos que viveram nestas cidades no inicio do século passado.

*História de Poções.
Acesso em: 20 out. 2005. Disponível em:
http://www.pocoes.ba.gov.br/- (Prefeitura de Poções – BA)

*Governador Valadares.
Acesso em: 23 out. 2005. Disponível em:


*História Guarapari.
Acesso em: 23 out. 2005. Disponível em:



*Osório, Carla. Histórico de Vila Velha. Dados Geográficos.
Acesso em: 23 out. 2005. Disponível em:
- Prefeit. Vila Velha – ES

*Clério`s Home Page. Origens do bairro Aribiri.
Acesso em: 23 out. 2005. Disponível em:


*Origens do bairro IBES. Jornal A Tribuna, Vitória-ES, 22 Ago 2003.

© Rosimeire Leal da Motta.

OBS.: Este Conto faz parte do livro:
"Voz da Alma" – Autora: Rosimeire Leal da Motta
Editora CBJE - RJ - Novembro/ 2005 - Poesia e Prosa.


Página Pessoal: http://www.rosimeiremotta.com.br/
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