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Contos-->Raiva -- 12/10/2007 - 12:17 (Alvaro Nascimento Vieira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Raiva
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Costumavam brincar juntos quatro garotos. Depois de terminada a lição do dia, corriam para a margem do rio brincar de piratas, de cavaleiros, de reis. Era o que realmente eram: reis. Senhores de seus próprios destinos, decidiam quem vivia, quem morria (de mentira), quem ficava preso. Só não decidiam a hora de parar a brincadeira.

- Os quatro – grita aquela mãe delicada – já para dentro!

Era motivo de indignação por parte dos grandes heróis.

- Mãe, às vezes, sei lá, né? Se elas querem o bem da gente, por que dizer para a gente parar de brincar? Brincar não faz bem para a gente?

- É, faz – respondeu um.

- Para mim também – o outro.

O quarto garoto nada respondeu. Era assim mesmo. Quieto, pouco falava. Prestava atenção no que os outros diziam, mas não os respondia com freqüência. Gostava muito de ler, lia o tempo todo, mesmo quando brincava com os outros garotos, o que, é claro, os aborrecia sobremaneira. Não foi sem motivos que logo o apelidaram de “O Leitor”. Não que fosse possível achar um sentido negativo neste apelido, mas apelido que se preze sempre tem conotação negativa. Senão, não é um bom apelido e, provavelmente, não vinga. E se o apelido não é negativo, fala-se com voz de gralha, fazendo careta, gestos com a mão, qualquer coisa para fazer pouco do brio de outro ser humano. E moleques são muito bons nisso.

Um dia, iam derrubar um cacho de abelhas. O Leitor não concordava, pois havia lido em um livro que as abelhas são boas, e não más, uma vez que possuem importante papel na cadeia alimentar, garantindo a sobrevivência de outras espécies animais, além de auxiliar na polinização das flores, o que também contribui para a manutenção dos vegetais.

- Não vai chamar o Leitor? – pergunta um deles.

- Não - respondeu o líder. Se ele vem e não participa, melhor que não venha.

Sempre há um líder. Aquele que incita, aquele que conduz sua maneira de pensar para dentro da cabeça dos outros. Quando uma criança é eloqüente demais muito cedo, ali, certamente, está nascendo um líder. É um momento para se ter bastante cuidado. Como quase sempre acontece em um grupo de crianças, era o mais velho. Na escola, já estava uma série acima dos demais e conhecia mais histórias sobre garotas que os outros três juntos, o que trazia certa competição ao grupo. A popularidade e a experiência do líder concorriam com a inteligência do Leitor. Em algumas brincadeiras de dupla, ganhava a experiência. Em outras, a inteligência. Além disso, devido à sua condição física – o Leitor era meio “gordinho” – grande parte das atividades tinha nele seu principal entrave. Correr e subir em árvores eram atividades cruéis para os seus quilos a mais. Somada a essa a restrição de sua personalidade, pouco sobrava para interagirem, propriamente, os quatro.

O Leitor, por sua vez, não se incomodava. Ele sabia que estava certo. Achava um desperdício de tempo ficar imitando piratas se poderia aprender a ser um de verdade nos livros. Seu sonho, inclusive, era um dia encontrar algum tesouro escondido por piratas. Os outros três, crianças que eram, mas tão críticos que se tornaram, o consideravam não mais do que um louco.

Certa vez o Leitor encontrou um homem muito velho. Era um quase vizinho dele, mais adiante na margem do rio. Esse homem lhe contou uma história muito interessante.

- Sabe, garoto, eu vivo aqui há muito tempo e, antes de mim, o dono de toda essa terra morava aqui. Ele era meu avô e disse que, em um lugar próximo ao rio havia um grande segredo. Eu nunca descobri coisa alguma. Dizia ele que tudo se baseava no primeiro pinheiro que ele plantou. Saiba você, é essa árvore bem ao seu lado.

O menino olhou, encantado.

- Mas será mesmo verdade? – perguntou o pequeno.

- Ah, certo que é verdade. Meu avô jamais mentiu. Costumava dizer: “Eu sou Eustáquio Pinheiro, e no pinheiro deixarei o meu legado.” Nunca entendi muito bem. O pinheiro está aí, igual a todos os outros pinheiros. É bem possível que eu morra sem saber o segredo e, se assim acontecer, tente descobri-lo você, pois, a partir de hoje, além de mim, você é o único que sabe dessa história.

E o velho foi embora. O Leitor, fascinado por todo aquele mistério, foi correndo para contar aos seus amigos aventureiros. E então, parou. Por que iria ele partilhar tão incrível história com aqueles que só sabiam chamá-lo de bobo? Não, não. Iria investigar o mistério sozinho.

Passaram alguns dias e, em cada um desses dias, o Leitor foi até o pinheiro. Pensava, procurava por algum sinal não chão, por entre as folhagens, mas nada. Até mesmo tentou subir na tal árvore. Impossível. Era muito alta e mesmo os primeiros galhos eram completamente inatingíveis. Nem se conseguisse uma boa escada chegaria ao primeiro deles. A dificuldade, entretanto, não diminuía a ânsia pela descoberta. Várias e várias noites dormiu pensando em como entender o que aquele velho senhor lhe contara. E, então, surgiu uma idéia. Simples e, como a maioria das coisas simples, genial: uma pá.

Num domingo, bem cedo, quando todos ainda dormiam, ele pegou uma pá e foi até o local. Mas era tão óbvio! Certamente o segredo deveria estar enterrado. Seu sonho de pirata parecia estar se realizando. Já no pinheiro, cavou um certo tanto até que seus golpes com a pá atingiram algo duro. Era uma espécie de baú, algo que parecia ser de bronze. Estava muito bem fechado, mas não trancado. Com facilidade, o Leitor abriu o baú e viu uma placa metálica onde se lia, em letras bem grandes: LESTE. Inicialmente, ele não entendeu e a frustração pareceu assaltar-lhe o espírito. Até que decidiu verificar, pelo Sol, onde era o leste. Foi quando viu outro pinheiro, imenso e solitário em uma clareira no bosque. Empolgado, como quem acha uma peça de um quebra-cabeça após horas procurando, correu, arrastando aquela pá imensa, em direção ao outro pinheiro. Começou a cavar e não demorou muito. Igual à primeira placa, mas, desta vez, escrita: SUL. Não mais surpreso, mas ainda com a emoção da aventura, avistou a terceira árvore, plantada à mesma distância em que a segunda se encontrava da primeira. Lá, enterrados do mesmo jeito, mais um baú e a placa: OESTE. Apenas a alguns passos de sua grande descoberta, cansado, o garoto lentamente se dirigiu ao quarto pinheiro. Cavou, cavou, e cavou mais, e nada encontrou. Conclusão: termina o conto e o leitor fica sem norte.


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