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Contos-->O CASAMENTO -- 07/11/2007 - 09:02 (HENRIQUE CESAR PINHEIRO) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O CASAMENTO
Jaguaruana é uma cidadezinha do interior do Ceará, que fica à beira do Rio Jaguaribe. A uns cento e oitenta quilômetro de Fortaleza. Região quente. Clima seca, típico da caatinga nordestina.
Um amigo de infância, certa vez, convidou-me para assistir ao casamento de uma prima dela naquela cidade. As famílias eram importantes: do noivo e da noiva. Ambas influentes naqueles tempos da Revolução. Mandavam e desmandavam na cidade. A palavra deles era lei.
Como era praticamente da família, fiquei hospedado na casa dos pais da noiva, numa fazenda fora da cidade, às margens do Rio Jaguaribe, aonde chegamos sábado pela manhã.
Dia de festa, passamos todo na beira do rio. Comida farta. Muita bebida. Enfim um verdadeiro banquete.
À noite o casamento se realizou lá na fazenda do pai da noiva, que fora prefeito da cidade e tinha um prestígio danado com o juiz e o padre, afora ser o noivo dono do cartório da cidade.
A festa rolou noite adentro e continuou domingo afora. Motivo para permanecemos na cidade todo o fim de semana e voltarmos somente na segunda-feira; e também por imposição do destino. Tínhamos ido de carona, por isso tivemos que esperar o retorno do dono do carro na segunda-feira. Mas logo pela manhã da segunda-feira, quando saíamos da fazenda, por sorte, pois poderia ter sido na estrada, o carro deu o prego.
Levado para o conserto, o mecânico avisou que o conserto demoraria um pouco e talvez só ficasse pronto no dia seguinte na parte da tarde. Porque faltavam umas peças que seriam pedidas em Fortaleza, e viriam, possivelmente, no ônibus à noite, para serem colocadas no outro dia.
Como não tínhamos certeza de que o carro ficaria mesmo pronto no dia seguinte, eu e o amigo resolvemos voltar de ônibus, porque estudávamos e não podíamos ficar perdendo aulas e deixamos o dono do carro lá, sozinho. Não foi desconsideração, mas uma decisão acertado com ele, que inclusive era natural da cidade, portanto estava em casa e também não tinha pressa de chegar a Fortaleza.
Devido ao carro ter ido para conserto, resolvemos permanecer na fazenda pela manhã e seguir viagem somente à tarde. Iríamos até Jaguaruana onde pegaríamos um ônibus de volta para Fortaleza. Nisso surgiu novo problema. Todos os veículos disponíveis tinham voltado no sábado ou no domingo à tarde, ficando na fazenda apenas nós e os empregados.
Como as condições de transporte eram precárias, assim como as estradas, por ali trafegava quase exclusivamente animais. Veículos raramente passavam, a não ser caminhões pau-de-arara, que, entretanto, tinham horário certo. De manhã iam para a cidade e voltavam à tarde. Com o reboque de nosso transporte, tivemos que buscar uma maneira de voltar; carona num veículo qualquer, difícil, mas não impossível. Em último caso, era apelar para uma viagem de jumento, mas aí se perderia o ônibus.
Esperamos pelo almoço e arriscamos a sorte numa carona. Pusemo-nos à beira da estrada, aguardamos, pacientemente. À espera, ficamos sentados em cima de uma cerca.
Enquanto aguardávamos, meu amigo sentiu uma forte dor de barriga, e para não correr nenhum risco, caso passasse um carro, preferiu se aliviar no meio do mato, debaixo de uns pés de carnaúba.
Eu continuei sentado em cima da cerca, aguardando transporte e a volta dele.
Na ocasião, ali na beiro da rio, soprava um vento gostoso. Uma brisa suave, que aqui no Ceará conhecemos como vento Aracati, que na língua tupi, significa vento fresco, vento que sopra do norte. A falta consenso não interessa. Ele, por sua vez, lá no meio do mato todo feliz, diante daquele paisagem bonita, ainda era inverno e o sertão estava todo verde, começou a dá loas à natureza e disse:
- Que coisa gostosa defecar no meio do mato, entre a natureza, com este vento fresco soprando na minha bunda.
Olhei pra ele, fingi não ter dado muita importância; dei apenas um leve sorriso e continuei onde estava tranqüilamente deslumbrando a paisagem. Com um sorriso irônico, como se estivesse a dizer rapaz toma cuidado, pois pode haver surpresa aí onde estás metido.
Acho que estava adivinhando. Não deu outro.
De repente um grito. Um grito desse medonho que mete medo. Pulei da cerca, apavorado, pois um grito tão intenso e forte como aquele devia ter ressoado por uns dois quilômetros. Fiquei realmente assustado com o grito, e pensei no pior: ataque de animais; provavelmente uma cobra cascavel – pois o local era propício a elas - . Só podia ser, ou na melhor das hipóteses uma aranha caranguejeira.
Rápido corri para acudir meu amigo. No caso de ter sido picado por uma cobra era buscar ajuda o mais rápido possível, se fosse ataque de outro animal qualquer, ajuda-lo na luta para espantar o bicho. Mas era difícil um ataque diverso de uma cobra ou aranha. Poderia ter sido também um ataque de camaleão, que molestado, teria dado nele uma chicotada com o rabo.
Assim, continuei correndo para onde ele estava.
Que nada!
Ele escolhera ficar em cima das palhas de carnaubeiras, porém, na pressa, não se deu ao trabalho de examinar o ambiente; ver se não havia qualquer perigo. Mas embaixo das folhas havia um formigueiro. Formigas vermelhas, saúvas tenazes e mordedeiras, violentas que atacam tudo que vêem pela frente, aos bandos. Cada ferroada de um delas queima que não é brincadeira. Agora avalie ser atacado por um formigueiro; umas duzentas formigas mordendo você. Pois foi isso que aconteceu. As formigas, ao se sentirem ameaçadas, atacaram; agarrando-se na bunda, nas pernas e até no cacete do coitado.
Avalie a cena. Ele muito branco, com a bunda de fora, correndo com as calças impedindo melhor seus movimentos, semi-arriadas, pressas que estavam às pernas, e aquele enxame de formigadas agarradas em quase todo o corpo, que de todas maneiras tentava se livrar delas. Depois de muita luta, e com minha ajuda conseguimos tirar e matar as formigas.
A bunda, as pernas, o pau ficaram completamente vermelhos e no centro das picadas as marcas miúdas, mas doloridas.
Passado o susto e bastante tempo se coçando, ele se lembrou de se limpar. Aí teve de voltar à casa da fazenda para tomar banho para podermos continuar a viagem, pois vestira a roupa todo sujo.
Nunca mais quis saber de cagar ao ar livre, fazendo ode à natureza.
A viagem de volta a Fortaleza transcorreu no mesmo dia e com bastante tranqüilidade.
HENRIQUE CÉSAR PINHEIRO
OUTUBRO/2007
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