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Poesias-->Dz Poemas de Silas Correa Leite -- 28/10/2008 - 09:56 (Silas Correa Leite) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Dez Poemas de Silas Correa Leite



Condomínio Via-Láctea





A lua nova sobre o arranha-céu

Com rímel de nuvens e sorriso de miss

Não sabe de janelas abertas

No enorme Edifício Vulgata

De arquitetura espacial.



O edifício e o condomínio têm luas

Como tem ruínas e alguns fantasmas

Da rua olho todos os sinais

Janelas abertas são ruas no breu

Muito além do noturnal.



A lua e o breu noturno no alto céu

O condomínio e seus desenredos

As luzes e as janelas abertas

Talvez a Lua seja uma

Válvula de escape sideral.

........................................................



No céu noturno da cidade grande

O prédio é só cimento armado

Mas a lua é uma janela

No Condomínio Via Láctea

Como um jogo de pinball.



-0-



Declamar Poemas



Para Regina Benitez





Não fui feito para declamar poemas

Ter timbre, empostar a voz, tempo cênico

E ainda dar tom gutural em tristices letrais.



Não fui feito para decorar poemas

Malemal os crio e os pincho fora

Para o poema saber mesmo quem é que manda.



Não fui feito para teatralizar poemas

Mal os entalho e deixo que singrem

Horizontes nunca dantes naves/gados.



Não fui feito para perolizar poemas

Borboletas são pastos de pássaros

Assim os poemas que se caibam crusoés.



Não fui feito para ser dono de poemas

Eles que se toquem e se materializem

Peles de pedras permitem leituras lacrimais.



Não fui feito nem para fazer poemas

Por isso nem cheira e nem freud a olaria

Apenas uso estoque de presenças jugulares.



Não fui feito eu mesmo. Sou poema

Bípele, cervejólo, bebemoro noiteadeiros

Quando ovulo sou fio-terra em alma nau.



-0-





Poema do Cego Pulando Amarelinha



Para Alberto Frederico Correa Santos





O cego pulando amarelinha

Toma o anjo pela mão

Você só vê o gesto táctil do cego, não

Vê jamais o anjo na sua condução

Em cada estágio de saltar sem pisar na linha.



O cego pulando amarelinha

Parece flutuar num balé

E sonda-o a rua de Itararé inteirinha

Perguntando o que nele enseja tanta fé

Céu e inferno; o cego parece que advinha



O cego e a sua amarelinha

Parece um milagre até

Toma-o pela mão o anjo; o cego se aninha

E pula e salta e vence e acerta o pé

Talvez porque céu ou inferno só dentro da gente é.



-0-



Forfé de Pião Rueiro







A madeira na mão um toco de imbuia cheirosa

Pedindo pro Jora da Marcenaria Estrela tornear

O pião pra jogar com a gurizada na rua descalça

Que a fieira tinha tirado de uma cortina de casa



O Seu Jora só perdeu um instantinho-prosa daí

Surgiu o pião rombudo qual coxinha de frango

Marrom lixado e um prego sem cabeça na ponta

Pro bicho correr doido como a bailar fox-trot



O pião na mão e o movimento no colo da idéia

Rua cheia de piás guris moleques curumins até

O sol de Itararé rachando revólver de mamona

Gibis do Flecha Ligeira na mão e tarde ardendo



Então a fila pra assistir a inauguração do pião

O coração tamborilando rabo de olho na mira

Enrolei a fieira na bundinha do pião maroteiro

E fiz panca de Burt Lancaster depois da maleita



Soltei o pião lazarento (que apelidei de Garrincha)

E ele foi de bubuia e fez reviravolteio na Rua Capilé

Foi um deus-nos-acuda dos guris serelepes torcendo

Pro meu pião querido ir de vareio no rio da bosta



Mas o caipora lazarento fez fricote zumbiu e parou

Na minha mão direita como uma roseira de brincar



Eu era criança e Itararé tinha uma barulhança pueril

Cresci virei peão de pegar no batente e fazer poemas



-0-



Poeta Escolhendo Feijão





“Um poeta escolhendo feijão/

Não parece nada poético/

Antes, piegas; na ótica vão/

Onirismos - metáforas do imagético/

Que pedaços ali se haverão/

Como palavras, no profético?/

(Que caldo na imaginação/

A situação até como arquétipo?)/

Um poeta escolhendo feijão/

Está em lavração errada/

As palavras ali não se serão/

Num peneirar de pedra limada/

Por isso os carunchos ficarão/

Além da situação impensada/

E nesse oficio ele é aleijão/

Como um porco, na feijoada”



-0-



A Identidade da Dor (Poema Para o Centenário da Imigração Japonesa)



Hiroshima ainda está lá

Como um espelho

Uma bomba não mata uma cidade

Uma identidade-povo

Uma idéia-espaço



Nagazaki ainda está lá

E reflete Hiroshima

Não pela radiação mas

Pelo que ambas foram e serão



Restos de Hiroshima

Ainda são Hiroshima

Como escombros de Nagazaki

Têm uma identidade silencial



Ninguém mata Hiroshima ou Nagazaki

Ninguém mata a vida

Ou uma identidade histórica e espacial de vida



A bomba não mata a dor

Do que restou da guerra

E essa dor que doerá infinitalmente

Será Hiroshima

Será Nagazaki

Porque a paz confere a dor

Perpetrada na lágrima

Como um desenho arquitetural na saudade

Que a luz lê em sangue

Nas flores de cerejeiras

Como haicais, no átomo



-0-





La Vie En Rose



Leminski morreu de poesia

Ou de cirrose; se vivo fosse

Naturalmente um outro seria

Talvez vencedor de posse

Caetano que fugiu pra Londres

Não morreu e se socorre

A escrever bugigangas hoje

Como se nunca existisse

Hendrix, Joplin; até Cazuza

Se não morresse o que seria?

Lupíscinio não se fez num dia

Só no infinital da boemia

Renato Russo, Torquato, Capinan

Um parafuso a mais tantas vezes

(Ou o anonimato de uma neura vã

Em celeiros de burgueses?)

A vida é cor-de-rosa na juventude

Depois o decrépito vive amiúde

E na velhice a arte louca vegeta

Artista, vanguardista, poeta

........................................................

Morrer criando toda glosa

Em verso e samba e prosa

Foi o clímax de Noel Rosa

Idolatrado



Morrer de velhice por aí

É muito triste ao condenado

Feito Caimy ou Cauby

Cada um de si mesmo em si

Beirando ser esclerosado.



Melhor morrer no auge a criar, de overdose

Jovem portentoso - no suicídio ou na cirrose



Ou restar-se à decadência vil, pobre coitado

E à existência reles e comum ser condenado



-0-





Tomar Chuva





Algumas vezes existi.

Algumas vezes tomei chuva.

Mas quando tomei chuva eu me senti um átomo da água e ali

Fui rio, nuvem, relâmpago, açude, cisterna, foz e quase voei.



Porque tomar chuva é integrar-se à natureza, ser parte dela

Conjugar o verbo haver no sentido mais pleno de seu assento

Eu a chuva e até algumas lágrimas de alegria, êxtase e contentamento

Como se a minha alma-árvore se lavasse por dentro...



E fui chuva e guri e mar e senti minha alma flutuar numa nuvem-nau

Porque eu era a maravilhosa Chuva naquele bendito magno momento



Então a chuva me reconhecendo como parte dela (que o meu espírito o é)

Parou de ser peneiradinha naquele tardiscar cor de rosa-pitanga de Itararé

E o lírio-laranja do sol se abriu e eu me vi ali

No fio-terra, o guri

Angelicalmente de alma lavada

Pronto para enfrentar a cara amarrada

Da vida distante que em busca de mim mesmo a peregrinar escolhi.



-0-





MANDRAKE





O pai prendia a rua:

Cristão não brinca na rua.

O pai desinventava a bola de capotão

De Garrincha, Bellini, Rivelino, Pelé, Tostão.

Crente não joga bola, Deus não gosta.

O pai desproporcionava a infância:

Ler gibis é pecado, não vai pro céu.

E eu era fã do Mandrake, Príncipe Valente,

Flecha Ligeira, Fantasma, Saci e Flash Gordon.



De tanto ler - em casa era castigo ler bastante

De dicionários e jornais à Bíblia

Fiz da minha imaginação uma rua aberta para além da humanidade.

Vi pegadas no céu. Tive rasuras de peregrinações.

Sempre fui muito grosso no futebol, cavalo mesmo.

Um perna de pau que sabia que ki-chute e unha encravada não combinavam

Quando não, por ser crente, era um manteiga derretida, canela de vidro

Que mal sabia dar direito o drible da vaca louca.



Da Poesia fiz almanaque rueiro em fugas letrais

Gibis clandestinos povoaram minha abstração em lavouras-intimidades

Com entrudos de histórias em quadrinhos como se cinesmacope na alma-avelã.

O poeta-caminheiro a escrever acontecências do arco da velha

Pomposos causos pra boi dormir

Entre invencionices desparafusadas e poemas em polaroid.



Assim vim pela vida sendo um guri eterno

Com medo de Deus, com medo do inferno

Chutando a pelota do amargo mundo legal

Para o desmundo das idéias, muito além da triste vida real



-0-









Álbum de Figurinhas







Ai que saudades que eu tenho

Dos meus álbuns de figurinhas de coleção

Que eu cuidava todo trancham, todo pimpão

Quando guri lá em Itararé

À sombra do lar and jazz

Que os anos não trazem mais.



Bolinho de piruá, capilé de groselha preta

O pai floreando o acordeão ou a clarineta

Eu com gibis do Tarzan ou do Flecha Ligeira

E o álbum que devidamente preenchido dava de brinde

De bola oficial de futebol a panela-de-pressão



Com meu belo ki-chute pretinho

Tomava crush de canudinho, e de boné

Jogava bate-bafo na rua descalça e rapelava

A petizada pidoncha da periferia de Itararé.



Um dia chorei de montão

Porque por mais que a vida por bem ou mal ensine

É a frustração na infância que a desilusão define:



-Deixei de ganhar uma bola da capotão

Porque na minha bendita coleção

Faltou uma figurinha carimbada do Belini.





-0-



Silas Correa Leite, Itararé-SP

Teórico da Educação, Jornalista Comunitário, Conselheiro em Direitos Humanos (SP).

Blogues: www.portas-lapsos.zip.net ou www.campodetrigocomcorvos.zip.net

E-mail: poesilas@terra.com.br









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