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Contos-->VESTÍGIOS -- 18/01/2009 - 08:11 (Roberto Stavale) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Carla consultou o relógio de pulso – ainda não eram 6h30 da manhã. Sonolenta, ela não sabia a quem xingar. Resolveu, mais uma vez chamar-se de estúpida, por continuar usando aquele traste digital que, além do horário falso, marcava quarta-feira, 13 de novembro de 2097. Será quarta, quinta ou sexta? Pensava Carla, enquanto se preparava para sair.
O inútil relógio agora marcava 8h15 do que deveria ser uma ensolarada manhã de primavera subtropical da cidade de São Paulo. Mas a noite ainda se fazia presente e a temperatura, também mostrada no relógio, era 12 graus negativos – um frio intenso! Sem sinais de aurora no horizonte, no firmamento, a lua que deveria estar em quarto minguante, segundo o imprestável relógio, não existia mais! Fora substituída pelo vulto tenebroso de Vênus, que a cada hora se aproximava mais da Terra.
Toda essa confusão era causada pelas antigas e as mais recentes catástrofes, envolvendo o ecossistema do nosso planeta.
Mas a vida teria de continuar. Até quando?
Carla, 65 anos, pesquisadora e livre-docente em história e antropologia pela Universidade de São Paulo, estava de volta ao campus da universidade para uma reunião de emergência, convocada pela ONU, para deliberar sobre os últimos dias de vida na Terra.
Sua função, e de outros poucos pesquisadores brasileiros, era armazenar rapidamente todos os dados e materiais referentes à nossa história: pré-descobrimento e os períodos colonial, imperial e contemporâneo.
E isso porque uma comissão de cientistas de todos os países estava reunida em uma assembléia permanente na sede nas Nações Unidas, na castigada Nova Iorque, para depositar, em uma enorme caixa de titânio, documentos, livros, utensílios, máquinas, computadores e pesquisas sobre todos os períodos da história da humanidade. Havia de tudo um pouco, desde o homem da caverna, idade da pedra lascada, da pedra polida, do bronze, idade média e moderna. Esta imensa caixa, situada nas entranhas de um antigo abrigo atômico norte-americano, um dos muitos construídos durante a Guerra Fria nos anos de 1960, estava disposta em andares e salas para o arquivo final da nossa história.
Depois de receber o seu carregamento, uma enorme placa de bronze, com o epíteto do motivo de tudo aquilo, escrito em diversas línguas, seria colocada do lado de fora do abrigo lacrado, prevendo que, algum dia, talvez milhões de anos mais tarde, alguém pudesse saber que o homem dominou a Terra, quis dominar o espaço, mas pagou caro o preço da sua ambição e sabedoria!
Desde o começo do século XXI, cientistas vinham alertando para o superaquecimento global devido aos vários tipos de poluição atmosférica.
Em 2035, a temperatura no Pólo Norte registrou, em pleno inverno, dois graus Fahrenheit.
Os enormes degelos já eram sentidos havia mais de cinco anos, causando inundações em todo o hemisfério norte e secas intermináveis no sul do planeta.
As colheitas estavam cada vez mais prejudicadas. Os países situados na faixa do Equador registravam números elevados de óbitos, causados pelo calor de mais de 55 graus.
A fome também provocava outras centenas de milhares de morte.
Em 2085, a vida na Terra era um completo caos!
Para piorar, e muito, a situação, com a grande transferência das águas oceânicas do Norte para o Sul, o nosso planeta começou a girar fora de seu eixo habitual. E a sua translação acontecia cada vez mais distante do Sol.
Os dias ficaram mais curtos e as noites, conseqüentemente, mais longas.
A parca energia elétrica passou a ser fornecida apenas pelas poucas usinas nucleares.
Os grandes rios e suas bacias desapareciam a cada dia da geografia terrestre.
O controle da natalidade tornou-se drástico em todos os países, sem exceção. Estava praticamente proibido colocar mais habitantes na sofrida e terminal Terra.
Fornos para cremar cadáveres, que faleciam aos milhares, todos os dias, substituíam os antigos e nostálgicos serviços funerários.
Nesta época, o censo mundial registrou apenas quinhentos milhões de habitantes, a maioria, chineses.
Religiões multiplicam-se, tentando salvar o homem do inferno, naqueles dias de Juízo Final.
As comunicações pararam de funcionar. As poucas notícias que chegavam às redações dos jornais vinham através de antigos cabos submarinos.
Imagens da televisão estavam cortadas, devido à falta de energia.
Os antigos rádios, USB, LSB, AM e FM, usados pelos rádios-amadores que existiam bem antes da Internet, agora voltavam a prestar solidariedade aos terráqueos. Mesmo com a propagação cada vez mais difícil, as estações comunicavam-se, trazendo um pouco de alento à sofrida população.
No auge dessa desolação e pânico, aqui, no Brasil, quiseram tirar das cinzas da história algumas antigas ferrovias que corriam para o interior.
Mas como?
Seus leitos não mais existiam. Comboios de vagões e locomotivas haviam se transformado num amontoado de sucata.
Por fim, o homem estava sucumbindo em suas próprias armadilhas!
Foi quando os cientistas, para enorme desespero das sentenciadas criaturas, anunciaram o iminente choque da Terra com Vênus, cada vez mais próximo da nossa nova órbita.
Mesmo se não houvesse a colisão, a força de atração deixaria o ar rarefeito, sem oxigênio para a manutenção da vida terrestre.
Segundo cientistas e estudiosos em astronomia e astrologia, não era a primeira vez que Vênus, outrora um enorme cometa, chocava-se com a Terra.
A primeira ocasião aconteceu antes da era glacial, cerca de um milhão de anosração dos continentes, deixando o nosso planeta, durante milhares de anos, fora de sua órbita original. A lua deve ter aparecido de um desses fragmentos e, por força de atração e gravitação, tornou-se o nosso satélite.
Na segunda colisão, o mesmo cometa, depois de ter o seu cs orpo aumentado por fragmentos, poeiras gasosas e meteoritodesprendidos na Terra, distanciou-se milhões de quilômetros do noss atrás – época dos animais pré-históricos, como os mamutes. O choque foi tão violento que resultou na sepao sistema solar para voltar, milhares de anos depois, na mesma rota de colisão.
Desta vez não foi um choque frontal.
Estima-se que esse fato aconteceu entre 3.000 a 2.000 anos aC.
Após se afastar de seu periélio, o cometa, com sua enorme calda, passou tão rente à superfície da Terra, que causou terremotos, maremotos, inundações, mortes e destruição.
Mais uma vez, por poucos dias, nosso planeta saiu de seu eixo rotacional. Os raios de sol não iluminavam a superfície, devido às densas nuvens, deixando a Terra na mais completa escuridão.
Textos como o Antigo Testamento e algumas passagens da Bíblia comentam esses episódios como o dilúvio no tempo de Noé, as sete pragas do Egito e outros acontecimentos relativos à grande catástrofe.
O que mais chama a nossa atenção são os sete dias de trevas, uma das pragas do Egito que, segundo alguns cientistas, aconteceu exatamente no período em que parte da Terra ficou às escuras, encoberta pela cauda do cometa. O número sete, além de ilusório e cabo alístico, representa os sete dias de trevas em todo o Oriente Próximo, o mundconhecido dos antigos profetas.
Ao contrário, no oposto do planeta, onde estão as Américas, ainda há vestígios desse fenômeno – lendas dos habitantes que lá moravam antes do descobrimento falam sobre diversos dias em que o Sol não se escondeu no horizonte.
No Oriente, apenas escuridão. No Ocidente, claridade, dia e noite. Esses fatos, de acordo com informações deixadas, aconteceram na mesma era.
Depois da última colisão, a cauda do enorme cometa fragmentou-se, deixando o núcleo livre. De forma esférica, passou a ter uma órbita ao redor do Sol, perto da Terra, e se transformou no planeta Vênus.
Com telescópios de última geração, principalmente os instalados em naves espaciais, pode-se observar o apêndice que seria o começo da calda do antigo cometa.
Mas voltemos aos afazeres de Carla.
Apesar do frio intenso e da escuridão, a Terra ainda girava de torno de um bolsão com oxigênio. O homem e alguns animais ainda respiravam.
Todo o cardume de peixes havia desaparecido.
Os animais selvagens buscavam lugares ainda povoados para saciar a fome e a sede.
As orlas marítimas do hemisfério sul estavam submersas, deixando a maioria das cidades desaparecidas.
No Brasil, até onde a Serra do Mar se estendia, um imenso muro natural não deixava o mar entrar planalto adentro. O norte e nordeste brasileiro eram um imenso mar de destruição. E assim estava o resto do mundo.
Os transportes já não existiam.
Todos queriam fugir para longe do mar. Mas como?
Em 2095, apenas três milhões de sobreviventes observavam Vênus a caminho da Terra, vinte vezes maior que a nossa antiga lua.
O choque estava previsto para os dias 15 e 18 de agosto de 2098, segundo o relógio atômico instalado na sede da ONU.
Carla, com a sua bagagem histórica adquirida em museus, bibliotecas, discotecas e afins, no dia 19 de novembro de 2097 embarcou, com os seus assessores, para Nova Iorque, em um avião militar, um dos poucos movido a energia nuclear que ainda voava a serviço da ONU.
Os navios e outras embarcações marítimas eram peças de museu. Não navegavam havia anos, devido aos maremotos.
Depois de uma longa e penosa viagem de mais de doze horas, o jato pousou em Nova Iorque, para os funestos preparativos.
Em poucos dias, todas as nações estavam representadas.
Comendo apenas alimentos liofilizados e cápsulas hidratantes, cerca de oitocentas pessoas começaram a árdua tarefa de transferir, manualmente, toda aquela bagagem, vinda dos quatro cantos do mundo, para o interior do abrigo atômico.
Apenas as grandes peças eram transportadas por empilhadeiras com baterias elétricas.
Carla e mais vinte brasileiros dedicavam-se ao que classificavam de a última missão.
Depois de meses carregando para o abrigo todo o material escolhido, consideraram a tarefa terminada e o local, pronto para ser fechado e lacrado.
Todos saíram e se reuniram na sede da ONU.
O relógio atômico no salão de entrada, talvez o único com alguma confiabilidade, marcava 6h00 horas da tarde. O calendário indicava quinta-feira, 15 de agosto de 2098.
O grupo pensou em ir até o lado de fora do prédio, mas uma tremenda chuva de granizos colossais e meteoritos varreu as poucas ruas da cidade, matando os seus últimos habitantes.
É o fim! Disse Olav Sansilac, de nacionalidade francesa e atual presidente da organização.
No ano de 2035, quando começaram as catástrofes, a Terra era habitada por sete bilhões de habitantes. Hoje, 15 de agosto de 2098, segundo estimativas, o número de sobreviventes não passava de quinze mil seres que perambulavam pelo planeta. Noventa e cinco por cento da fauna e da flora tinha desaparecido.
Dos subsolos do prédio da ONU saía um túnel, direto para o abrigo.
Chegando à porta da imensa sepultura, fez-se a última contagem do pessoal.
Lá estavam reunidas 783 pessoas, que solenemente fizeram um pacto antes de se trancar com as relíquias armazenadas.
Depois de lacrar, por dentro, a única porta de acesso ao abrigo, todos rezaram e se abraçaram e, comovidos, despediram-se do mundo castigado pela ira de Deus!
Em seguida, engoliram a sua última refeição – uma cápsula de cianureto de sódio que os matou por asfixia em milésimos de segundos.
E assim tudo terminou e o homem pôde, então, conhecer o fim de seu tempo.
Doze horas mais tarde, a fatal colisão entre os dois planetas aconteceu.
O nosso mundo, tão comentado em profecias apocalípticas, simplesmente tinha acabado!
Milhões de anos se passaram até que aquilo que restou da Terra, da destemida doutora Carla e seus colegas, e que passou por todos os ciclos e eras, voltou a ser, mas de forma bem diferente, o que foi até o ano do nascimento de Cristo, de 2015 a 2030.
Pesquisadores do futuro encontraram o abrigo atômico com os vestígios das antigas civilizações.
Ao comparar os dados geográficos, descobriram que o Planeta Fênix, nossa antiga Terra, apresentava os seguintes dados:
Idade até 2098 – 4.7 bilhões de anos; volume – 1 trilhão de km³; peso – 6 sextilhão de toneladas; superfície total – 510.200.000 km²; circunferência ao redor do equador – 40.000 km.
Descobriram, também, que era o terceiro planeta do sistema solar, com uma distância aproximada do Sol de 150 milhões de km.
Com o violento impacto entre a Terra e Vênus, a estrela matutina, como era chamado, por ser menor, simplesmente desintegrou-se, espalhando trilhões de meteoros pelo espaço.
Na colisão, a maior parte da Terra, que estava praticamente partida ao meio, foi arremessada a milhares de quilômetros da órbita. A fração menor não se desintegrou totalmente.
Esse segundo bloco, atraído pelos corpos celestes, seguiu o que restou da Terra e entrou em órbita de translação ao redor do sol, novamente. A conseqüência é que Fênix tem um satélite natural com as mesmas características climáticas, iguais ao novo planeta, e é, inclusive, habitada. A distância entre Fenis e seu satélite Lux é de aproximadamente 150.000 km.
Nossa lua, cantada em prosa e verso por trovadores e seresteiros dias antes da colisão, devido à gravidade exercida pelos dois corpos maiores, desprendeu-se da órbita da Terra e se transformou em mais um asteróide do espaço sideral.
Fênix tornou-se o oitavo planeta do sistema solar entre Netuno e Plutão.
A nova distância do Sol, acrescida em milhões de quilômetros, levou o seu movimento de translação a ter 975 dias. A rotação sobre o seu próprio eixo é de 58 horas, entre o dia e noite. O calendário, dividido em 10 meses de 98 dias, é regido pelo Sol.
Fênix compõe-se de dois continentes, com enormes bacias fluviais, pólos norte e sul, e apenas dois oceanos.
As estações climáticas são duas: inverno e verão.
Seus habitantes, desde os primórdios de suas existências, não adoram nem professam nenhuma deus. Não existe religião.
Todos falam a mesma língua, o fenixórdio, e não há fronteiras geográficas. Todos pertencem à mesma etnia e continentes.
Só há uma referência monetária. Os principais negócios são feitos através de convênios e intercâmbios comerciais, principalmente de alimentos e gêneros de primeira necessidade.
A regra do planeta é: trabalhar para prosperar
As viagens entre Fênix e Lux são feitas semanalmente e demoram cinco dias. Transcorrem tranqüilas, como as antigas viagens de avião. O bolsão de nitrogênio e oxigênio que envolve os dois astros garante a sobrevivência.
Durante muito tempo, os cientistas fenexsianos estudaram e analisaram todo o material deixado no abrigo, milhões de anos atrás.
Devido ao fechamento hermético, somada à falta de oxigênio, os ossos dos cadáveres permaneceram intocáveis, cada um com sua identificação: nome, idade, sexo, nacionalidade e profissão.
Os pesquisadores ficaram incrédulos ao descobrir o poder daquele antigo povo com suas armas de destruição nucleares e biológicas. Os fenexsianos ainda não tinham conseguido dividir o átomo.
Com sabedoria, resolveram lacrar novamente aquela fonte de guerras e ódios violentos, provocada por diferentes etnias e religiões.
De forma alguma quiseram seguir os passos dos terráqueos. Sábia filosofia, que ainda cultivam com paz e carinho!
Espero que sejam felizes e continuem a viver bilhões de anos com a enorme responsabilidade de ser humanos. Hoje, 15 de janeiro de 2009, ao término dessas pretensas linhas, infelizmente ainda somos completamente desumanos!


Roberto Stavale
Janeiro de 2009.
Direitos Autorais Reservados®



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