O Capitão
È uma divindade, ou quase; quando ele fala, todos se calam; um gesto seu movimenta oficiais, tripulação, agentes e agencias. Pode ser tranqüilo, como o nosso, ou afobadinho, irascível e antipático como o do Zim Argentina, por exemplo. Pode ser um bom papo como um paquistanês que conheci, mas, uma coisa têm em comum: como o Tai Pan da Casa Nobre o navio gira em torno dos seus desejos. Têm á mão tudo que querem e podem tudo que desejam;antigamente até tinham o direito de casar passageiros,mas,hoje,pelo menos,este perigo foi banido das viagens marítimas.No mar traçam o roteiro,corrigem curso e deixam quase tudo nas mãos do Imediato,o sujeito cujo sonho maior é chegar a Capitão e mandar no Imediato.Está,invariavelmente na Wheel House nas manobras de atracação e desatracação,vigiando tudo junto com o Pilot,os quais geralmente detestam e desconfiam;nunca conversei sobre isto com um pilot,mas,deve ser recíproco.As horas no mar são longas e solitárias;eles a enganam assistindo filmes,ouvindo música e amando, porque sem uma mulher a seu lado ninguém agüenta esse rojão.Nos portos têm mordomias que fariam corar Brasília;mas,ao contrario dos de lá os de cá,as merecem.Quando aportam, há sempre uma bateria de pessoas trabalhando,com o único objetivo de lhes facilitar a vida.Carros á disposição,boas refeições em bons restaurantes,vinhos honestos;não se prendem a ninharias;expedir correspondência,comprar e revelar filmes,cuidar da burocracia é trabalho dos agentes.Eles tomam o café da manhã com os agentes de carga,um chá com o pessoal que conserta containeres,almoça com o agente,lancha com a estiva e janta com os armadores.Estica a noite com o ship-chandler que depende de suas boas graças para viver.Todos adoram navegar no Mediterrâneo,mar calmo e 10 dias para descansar entre as Canárias e a America do Sul.Acima do poder absoluto do Capitão só o Presidente da Companhia;este pode destituir um capitão ou mudar-lhe a rota a de acordo com seus interesses comerciais.A vida no mar amacia um caráter já de si,terno e piora os mais amargos.Pondo de lado as responsabilidades que são imensas-----sobre vidas,cargas,navios etc. o comandante é um ser com muito tempo livre para pensar,muito tempo sozinho consigo para olhar dentro de si mesmo----e ás vezes não gosta do que vê.Daí muitos descambam para a bebida.O nosso é um capitão ecológico;gosta de plantas,pássaros,até construiu aqui no ZIM um jardim suspenso, onde as plantas repousam e florescem e pássaros eventuais, voejam em torno delas. troço com ele dizendo que descobri que ele não resiste a cinco coisas:cachorro,pão,vinho,peixe e mulher;não necessariamente nesta ordem.O certo é que o Cap. Ortega, René para os Íntimos,com a sua serenidade,segurança,bondade e compreensão tornou esta viagem inesquecível para mim.
Chegamos a Montevidéu, capital da República Oriental do Uruguay, ás 17.30, mas, só atracamos ás 19.30 por problemas técnicos. Um pouco antes,o pilot globe-trotter despediu-se de mim e disse que em B.A. ia deixar um cartão para quando eu precisasse de um piloto;mas,quando e para quê eu precisaria de um?Deveremos sair á noite, mas, enquanto esperávamos comemos um sanduíche aqui na cabine. Logo armamos uma festa;eu forneci o presunto,Francis,o pão,Gilmar,o queijo e o Cap.,as cervejas.Liguei o rádio e o Orlando faturou mais um cliente;Gilmar,encantado com o som pediu ao Cap. para encomendar um para ele.O pilot recomendou um restaurante para nós;iremos conferir se é bom mesmo.A Bahia está em todas as bocas e todos os ouvidos;Gilberto Gil canta aqui no Cine Plaza,dia 8 de julho.Dá-lhe,Bahia!...
Saímos com o Thomas John, o agente meio uruguaio, meio nórdico. Jovem,simpático nos levou a um tour pela cidade.Vimos monumentos,o Teatro Plaza,o Palácio do Governo,igrejas,a praia e a parte velha da cidade cheia de historias para contar.René me apresentou como a esposa do agente de Salvador,e ele muito galanteador,disse _que pena,ele chegou primeiro.Fomos então jantar no”Veio Pancho” um dos mais belos e aconchegantes restaurantes que conheci,com personalidade própria.A decoração é linda,sugestiva e a comida,excelente.Adorei o café colombiano,forte e encorpado;porque café e homem,só quente e forte.A sobremesa,uma cassata siciliana,de se comer rezando e eu disse para comigo,o paraíso é aqui.Gente elegante,bem vestida,distintos cavalheiros educados,do tipo que ainda mandam flores;nada de gritinhos,risadas estrepitosas e conversas em voz alta,como no Brasil.Ficamos até ás 3 da manhã,saímos com o lix,após conversarmos em três idiomas,ou melhor,quatro,se contarmos com o portunhol;Inglês,espanhol.português,que o Tom fala bem.Amanhã tem mais Tom e mais comida,não posso é perder o tom das coisas.Será que é melhor eu dobrar as horas da ginástica e passar a sopas?O frio era de 14º, mas, o calor humano era muito. Na volta fomos barrados no porto;não nos queriam deixar entrar;precisávamos de um permisso,seja la o que isto signifique;os passaportes não serviam;Imagina quem foi chamado?Acertou, o agente. As três da manhã e a gente com sono e com frio,esperando no meio da rua,pois não podíamos entrar.finalmente,entramos sob escolta;um soldado nos acompanhou.Nosso dia terminava ali,mas,o agente ainda foi levar o Gilmar ao Hotel Lafayette onde estava hospedado.
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