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Artigos-->CASO CLÍNICO -- 22/12/2002 - 20:38 (Wilson Coêlho) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Parece-me assaz oportuno lembrar Artaud quando afirmou que “se não houvesse médicos nunca haveria doentes (...), pois a sociedade não começou com os doentes, mas sim com os médicos”.

Quiçá, para justificar sua indelével influência da Geração AI-5 (termo muito empregado por Luciano Martins quando se referia aos que estão sempre no limiar da dependência entre aprovação/desaprovação de seus atos), Lúcio Packter, em seu livrinho FILOSOFIA CLÍNICA – PROPEDÊUTICA, Editora Age Ltda, se principia com uma superficial e medíocre análise de “conjuntura” (queda do muro de Berlim, surgimento do PT e bigodadas do Sarney), como se fora uma tentativa de se situar num determinado ponto no espaço e no tempo. Imediatamente, no que se refere à chamada “filosofia clínica” como a empreitada de criar uma nova seita ou um outro balcão de negócios no famigerado mercado, queixa-se de “dezenas de aspectos jurídicos, picuinhas contábeis (...)” e, acrescenta ainda a existência de “toda a turminha do contra, é claro”. Além de sua presunção, não pretende admitir nenhuma crítica e, tampouco, a possibilidade de questionamento do gênio – no pleno exercício do “direito natural” – abrir um instituto para “trabalhar” (sic) filosofia, adestrando “filósofos” ao “cliniquismo filosófico”.

Em outras eras que já eram, ou num tempo em que a preocupação com o caráter de determinado empreendimento falava mais alto que o modismo categórico do “politicamente correto”, todo esse movimento poderia ser compreendido como uma grande picaretagem.

O (a) personagem em questão, tendo em vista a incapacidade de sustentar a “necessidade” de sua investida, se utiliza de frases feitas de alguns filósofos como se fora uma muleta confeccionada com material de discutível durabilidade. Por exemplo: quando recorre a Protágoras afirmando o homem como medida de todas as coisas, é como se dissesse que tem todo o direito inquestionável de se arvorar o Antônio Conselheiro da filosofia, sem ao menos imaginar que suas vítimas também são homens e se medem por outras medidas. Por que sobrepor uma à outra? Onde residem os elementos que garantem sua pressuposta estrutura hierárquica? O que pode sustentar a sua idéia de que “Platão, um homem talvez muito poeta e pouco filósofo”? Jogar fora toda uma afirmação em função de um “talvez” sem definir quem é o fulano de tal e muito menos da sua vez?

A citação excessiva de nomes de filósofos, sem ao menos uma mínima discussão ou possibilidade de reflexão sobre o pensamento dos mesmos, torna-se uma mera tentativa de se afirmar como conhecedor... E o referido livro, levando em conta o número de filósofos dos quais o autor se apropria de forma aleatória, assemelha-se a um catálogo telefônico cujo único critério de constar na lista se resume em ter um telefone. Assim, não necessariamente nesta ordem, é uma verdadeira salada: Platão, Protágoras, Sarney, Nietzsche, Gorbachev, Reagan, Sêneca, Schopenhauer, Steinbeck, Gadamer, Aristóteles, Kant, Chaplin, Hume, Locke, Berkeley, Einstein, Georg Cantor, Bertrand Russell, Alfred Whitehead, J. L. Austin, Wittgenstein, Boomfield, Chomsky, Ryle, John Wisdon, G. E. Moore, Descartes, Foucault, Jacques Derrida, Umberto Eco e tantos outros. E tudo isso em apenas 110 páginas, contando com a introdução, página de rosto e folha branca. Nas últimas páginas, inclusive, o tal autor sugere filmes para o estudo de sua indecorosa proposta. Não existe nenhuma referência da importância dos filmes, tampouco, alguma relação com o suposto projeto. É como se afirmasse: eu assisti e gostei destes.

Tudo bem que o nosso modelo social se alimente de idéias extravagantes mesmo, como uma possibilidade do maior débil mental se sentir o máximo porque se enquadra em determinado grupo. Ou apenas porque se considera mais inteligente que um dinossauro. Mas tudo isso pode ser considerado como um acidente de percurso, levando em conta os paradigmas socialmente adotados em nosso momento histórico como – conforme Marx – o homem fazendo a história, não conforme sua vontade, mas de acordo com a sua capacidade. Outra coisa é admitirmos que determinadas pessoas e/ou grupos manipulem esse processo.

Não fosse o caráter criminoso que a questão encerra, eu poderia afirmar que a tal “filosofia” clínica é um caso gravemente clínico.

Wilson Coêlho é escritor, dramaturgo e professor de Filosofia na UFES.



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