Nasci há 47 anos atrás numa cidade linda que tive que trocar pela capital por necessidade de trabalho. Quando volto à minha terra, não comento, mas sinto saudades de tudo que ela já teve.
Tenho saudades do campinho de futebol em frente à igreja do meu bairro. Havia partidas de futebol entre equipes de todo o município. Existiam uns dez times que disputavam partidas acirradas, mas não violentas.
Eis algumas peculiaridades de alguns dos times participantes: O Internacional era um time só de negros. O TEP era formado por jovens que moravam próximo a casa do seu Paulista (casado com uma tia minha). TEP significava Turma da Esquina do Paulista. O Caxias era o time forte da Lagoa Preta. A Portuguesa era o time dos gêmeos Izidro Luiz e Luiz Izidro, e o Tupi foi fundado por um rapaz que estudou na Escola Técnica Tupi de Joinville.
Lembro-me também do Estádio na cidade (centro) em que se destacava o Barriga Verde. No campinho do Bairro Magalhães eu assistia à s partidas na beira ou à s vezes dentro do gramado. No Barriga Verde eu subia numa plataforma de concreto na casa da tia Alzira pois lá era cobrada a entrada. Do Barriga Verde saiu o primeiro jogador catarinense Campeão Mundial, Mengálvio, colega de Pelé no Santos.
Hoje na minha terra se eu quiser um filme tenho que alugar de uma locadora. Já tivemos o Cine Roma do seu Epitáfio, Cine Central ao lado da Igreja Matriz e o mais famoso, o Cine Mussi. No Cine Mussi a gente assistia a sessão das seis da tarde de domingo para namorar. Eu e outros rapazes costumávamos deixar a namorada entrar primeiro e depois sentávamos com elas, só para não pagarmos o ingresso delas porque não tínhamos dinheiro.
Tivemos uma heroína que não é do meu tempo. Li nos livros que Anita Garibaldi lutou no Brasil e na Itália. Hoje os únicos heróis que eu considero são meus pais que depois de criarem oito filhos com muita dificuldade, com quase oitenta anos transmitem alegria e bondade.
O carnaval de hoje pode ser considerado melhor, pois a mídia e o turismo ajudam muito. Mesmo assim sinto saudades dos Blocos que viraram Escolas de Samba. A rivalidade entre os Blocos era enorme. O Xavantes e o Brinca Quem Pode não podiam se encontrar, se isso acontecesse o pau fechava.
Sinto saudades do Cacareco, da Bandinha Maluca Os Palhaços de Momo e o Rei Momo, Maneca Fortes.
Hoje não se escuta mais o piuí, piuí da Maria Fumaça. Quando eu era guri e ia pra cidade vizinha, Imbituba, passar as férias na casa de meus primos, embarcava no trem e quando o cobrador aparecia eu corria para o banheiro. Só saía de lá quando não escutava mais o barulho da peça que ele usava para picotar o tíquete da passagem.
Ai que saudades do porto onde meu pai trabalhava. Um dia meu pai levou-me a conhecer um navio por dentro. Entre outras dependências do navio me lembro da cozinha, dos corredores estreitos e da casa de máquinas. Se um navio é grande por fora, por dentro ele é monstruoso.
O progresso acabou com nossos cómoros ou combros. Deixando essa frase jogada a esmo, poucas pessoas vão entender. Explicar-vos-ei: com a abertura de estradas, construção de casas e prédios, foram sumindo as dunas, dunas de areia branca que surgiam nas praias e que o vento trazia até perto da minha casa.
Acho que não se faz mais serenata. Eu mesmo nunca fiz, mas minha irmã mais velha ganhou algumas que ficaram na minha lembrança.
Festa Americana é coisa do passado. Escolhia-se uma casa que tivesse uma sala grande, instalava-se a radiola e esperavam-se os convidados. Os rapazes levavam as bebidas e as moças os salgadinhos. A dança de rosto colado corria solta ao som de Roberto Carlos, Wanderléa e outros. Além dos jovens convidados apareciam os bicões, os narizes de folha que já eram conhecidos na cidade.
Tem outras coisas que continuam tendo, mas com roupagem nova.
Jornais existem, já que minha cidade foi a primeira a ter jornal no estado, graças a Jerónimo Coelho.
Hoje temos duas bandas de axé music. No passado, tivemos o Conjunto Melódico Ravena que se apresentou na TV no Rio de Janeiro, e o conjunto da família Paulino.
No passado tínhamos um aeroporto que funcionava onde hoje é a área mais populosa do município, o Balneário Mar Grosso. Mais no passado ainda, será que a área do aeroporto não foi um campo de golfe?
Hoje na terra do já teve, ou não tem ou diminuiu de tamanho. Antes o nome do município era Santo António dos Anjos da Laguna e hoje é simplesmente Laguna.
