Em face do que vou vendo, ouvindo e sentindo, após lúcida reflexão para que não me precipite nos movediços lodos do egoísmo, interrogo-me: - Sob a atmosfera encefálica do bem e do mal, em qual dos lados estarei eu?!...
Na imediata sensação que me aborda, dá-me ideia que existo entre sofisticados bárbaros que, logo que se lhes solta a corda, explodem em saudosa e épica carnifina. Enquanto uns se ferem e abatem entre si, ora muito-muito lentamente, ora em inopinados ápices de pór cabelos em pé, alguns correm aflitivamente sobre escombros e mortos na tentativa de salvar o impossível. Os outros, uma enormíssima cambada de corajosos covardes - e no meio deles, eu - contemplam comodamente o estendal da miserável desgraça que avassala e ameaça sem equívoco a humanidade.
Enquanto pois não se exercer a rigor o princípio do ciclo natural de todas as coisas - algo incontornável, dê para onde der o alcance da ciência - não há hipótese alguma de harmonisar a passagem da gente global pela vida, tanto mais que os feiticeiros, os mágicos surripiantes, os malabaristas cultores da ineficiência mental continuam vigorosamente a piedosa extorsão sem trégua sobre as sucessivas legiões de inteligentíssimos seres humanos. Por esta e por outras como esta, adoro sem reservas o urso.
Esclareço: o joio tem de ser eliminado rigorosamente quanto baste para que o trigo flua feliz e útil. Tal como as coisas estão e vão, estamos todos desde já comendo joio sem dar por isso.
De resto e por enquanto, estou tão-só a escrever para uma grandessíssima cambada de hipócritas, cuja imagem se me depara num iludido cão que volteia sistematicamente atrás do rabo.
Dar à luz um ser humano deficiente e conservá-lo em existência é a mesma coisa que arranjar um bom motivo para extorquir o Estado (que são todos) e fingir que se trabalha heróica e tenazmente, assim, sem mais, como pór um ovo para comê-lo lentamente. Por causa disso penam e morrem à fome milhões de crianças saudáveis. Só que, pois, essas criaturazinhas, não são "o meu querido deficientezinho"... Que lindo, né?!...
Claro, a montanha social de joio é gigantesca. Vá, olhem pra ela, chorem, riam, fruam a trágica beleza que desliza e lutem, lutem muito pela salvação do límpido trigo e sejam felizes. Como?!...
Ah... Caramba, e eu embrulhado no meio de toda esta amálgama de estupores sem ter culpa alguma de tão conspurcado miasma. Culpa?... Ah... Tenho alguma pelo tempo todo em que me mantive calado aprazivelmente a xafurdar no mesmo lodaçal. Estava só a levar a minha vidinha, sabem?!...
Vá, corrámos, vamos assear a nossa presença e conferenciemos sobre tão delicada problemática. Na esonsa escuridão cerebral em que vivemos vamos conseguir decerto muitas ideias luminosas... Pois então não vamos?!... |