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cronicas-->NO MERCADO -- 29/07/2006 - 10:34 (ANTONIO MIRANDA) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
(RELÓGIO NÃO MARQUE AS HORAS, de Antonio Miranda. Quarta crónica da série*)

Crónica do livro: Miranda, Antonio. Relógio, não marque as horas: crónica de uma estada em Porto Rico. Brasília: Asefe, 1996. 115 p.


4

NO MERCADO


Judith trabalhou para a Peace Force em Medellín, nos anos das guerrilhas urbanas que, por certo, ainda não acabaram por lá. Fala spanglish e dá aulas sobre regras catalográficas. Tem o espírito de uma missionária e parece estar sempre querendo ajudar as pessoas.

Miúda, olhos azuis, desajeitada. Sai na frente e é difícil acompanhá-la.

Passos miudinhos, céleres, apressados. Escolhe frutas e verduras na feira e barganha os preços, por hábito -quem sabe, adquirido na Colómbia- e que aqui, em San Juan de Puerto Rico, apenas consegue um sorriso aquiescente do vendedor.

Minha amiga Blanca Alvarez, venezuelana, foi comigo a Cúcuta, na fronteira com a Colómbia. Espécie de zona livre, com um sortimento enorme de ofertas de objetos para o lar e o lazer. Ela foi ver produtos femininos e eu curiosear. Acabei comprando uma colcha. Era impossível escapar ao assédio dos vendedores. Agarravam o braço da gente, sugavam os clientes para dentro das lojas! Iam desmontando as prateleiras e jogando no teu colo. Abriam caixas e destruíam as embalagens para que tu tocasses os tecidos. "Este custa tanto, mas vai pela metade mesmo, é seu!" Para livrar-se do homem-papel-caça-moscas tu o humilhas, oferecendo-lhe ainda bem menos mas ele topa, com um sorriso de triunfo, embrulhando a encomenda.

Quando abres o pacote, em casa, encontras uma peça ordinária que nem tinhas visto antes!

Das cinco camisas que compraste na loja vizinha, ao preço de quatro, só vieram três no embrulho. O eletrodoméstico que vistes funcionando veio faltando uma parte. Aí é quando se entende porque têm tantas lojas que vendem peças avulsas! A gente pensa, cismando, para que comprar peças sobressalentes e aí descobre que são os clientes que voltam para minimizar o prejuízo.

Mas eu tivera sorte e a colcha viera inteira, sem defeitos. Uma beleza!

Blanca Alvarez levou um susto. Ela comprara a mesmíssima colcha pelo dobro do preço. Expliquei-lhe que o segredo estava em saber barganhar ...

Judith aprendeu a lição e continua usando a sua habilidade, mesmo sem resultados. Ela acredita que isso inibe a inflação, que a vigilància dos preços constrange as remarcações. Deve pechinchar até na Selfridges.

Quando ela dava uma paradinha para olhar a qualidade dos tomates e a excelência das batatas, eu saía na frente. Olhava para trás, tentando localiza¬-la mas ela já ia adiante ... Eu é que estava sempre atrasado, apalermado.

Tentou explicar que não era casada mas tinha um filho. Como não expressei nenhuma reação, ela completou o raciocínio, dizendo que nem todo mundo vê fatos como esse com naturalidade. Eu nem estava prestando atenção, entretido com uma fruta-pão. Igualzinha às do Nordeste do Brasil. Senti-me um tanto embaraçado, pensando em como comer uma fruta-pão. Crua, cozida? E dizer que eu sou nordestino ... Mas Judith sabe como prepará-la. O filho não gostou da vida simplória de Rio Piedras, voltou para Washington. A mãe de Judith também não gostou. Primitivo demais para o gosto dela.

- O pessoal daqui também me acha esquisita porque eu almoço às vezes nos restaurantes do mercado, com os feirantes.




Próxima crónica da série: (5) NO JARDIM BOTÂNICO
Para ler toda a sequência inicie pela crónica (1) VÓO NOTURNO.

Iremos publicando as cronicas que vão constituir uma espécie de romance, paulatinamente.Semana a semana... o livro impresso já está esgotado...

Sobre a obra e o autor escreveu José Santiago Naud: "A agudeza do observador, riqueza do informe, sopro lírico e sentido apurado do humor armam-no com a matéria e o jeito essenciais do ofício. É capaz de apreender com ternura ou sarcasmo o giro dos acontecimentos e deslizes do humano. Tem estilo, bom senso e bom gosto, poder de síntese e análise assim transmitindo o que vê e o que sente, nos transportes do fato ao relato, para preencher com arte o vazio que um vulgar observador encontraria entre palavras e coisas".



Crónica do livro: Miranda, Antonio. Relógio, não marque as horas: crónica de uma estada em Porto Rico. Brasília: Asefe, 1996. 115 p.


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