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Poesias-->Fragilidade -- 19/04/2012 - 18:03 (Rinaldo Brandão) |
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quando Dé morreu
eu tinha pouco mais de sete anos
e quis chorar como todos os adultos fingiam
não conseguia
agarrado à barra da saia de minha mãe
vi, debaixo de um manacá
a mãe que estava em luto
vociferar contra todos os céus
um cego e cerrado silêncio
de olhos se arregalando
em não crer
por quê?
e se naquele momento
alguém não chorasse ali
de medo, quer fosse
de fraqueza, talvez
ou por simples compaixão
que todos os céus se voltassem
com toda a fúria
contra tais olhos ateus
não aos meus
ali
vi a mãe em luto
tomar do manacá
a mais singela flor
miúda
a mais frágil
e atravessar o quintal
à sala escura
uma silenciosa sala
onde Dé
inerte
frágil
e miúdo
tal qual a flor
como soubesse ainda tocar
como sentisse cheiros
e ouvisse
e visse
e se risse de tudo
e soubesse mais que tudo
e que todo mundo
recebesse o último presente de sua mãe
e ensinasse a mim
e a todos ali
como se deve amar uma flor
hoje, no declive que leva ao rio
longe dos olhos de quem passeia em poeira
hoje, lá
também tenho um manacá
escolho
e colho a flor mais singela e lilás
minha irmã talvez pudesse me odiar
se ainda pudesse odiar
se algum dia soube odiar
por não gostar de manacás
mas saberá
tocar e cuidar
de meu singelo presente
hoje é dia de minha irmã
e dou a ela meu carinho frágil
pequeno
como se ela pudesse me olhar nos olhos
e me tocar
como sentisse ainda meu cheiro
ah, meu Deus
como se ela me mandasse ir ao florista
comprar rosas decentes
como se ela me fizesse um carinho
me tomasse das mãos o lilás
e o eternizasse em si
e o amasse
como se deve amar uma flor
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