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cronicas-->CASAMENTO EM NAGUABO -- 27/08/2006 - 10:05 (ANTONIO MIRANDA) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


(RELÓGIO NÃO MARQUE AS HORAS de Antonio Miranda. Esta é a 42ª. crónica da série*. São cronicas independentes não obstante formem uma sequência, na intenção de uma crónica de viagem contínua...)

42
CASAMENTO EM NAGUABO


A autopista para a cidade de Ponce corta o verde e montanhoso interior da ilha, na direção sul. Poucas fábricas, umas plantações esparsas e casas em todas as direções, povoados e bairros por toda parte. Depois tomamos o caminho pitoresco e sinuoso de Humacao e Naguabo.
Glória pilotava um elegante Mitsubishi Mirage S, em azul turquesa claro, alugado para a ocasião. Milagros luzia num vestido festivo, bonito, próprio para o casamento a que íamos assistir. Casamento na roça. Melhor: no povoado de Naguabo, numa igreja simples, cercada por prédios modestos e a praça típica do interior, onde convivem as linhas conservadoras e rústicas da arquitetura tradicional e a modernosidade de uns poucos novos locais de comércio.

A noiva com o vestido branco, de cauda longa, buquê e grinalda. Uma franjinha bem aparada e duas mechas laterais caindo-lhe suavemente. O noivo em seu uniforme cinza e azul da força aérea e uma cara de anjo, com as asas batendo palmas. Baixinhos, tensos. Juntos pareciam bonecos de vitrine. A cerimónia foi longa e a missa pontilhada de música adaptada ao estilo caribenho, com um coro de meninas aparamentadas e jovens formalmente vestidos. As mulheres na igreja ostentavam seus trajes domingueiros e os homens seus blusões de linho ou seda, os mais velhos com suas guayaberas de manga larga.

Um sargento empunhava a càmera de vídeo e houve tempo para as fotos oficiais da boda, depois dos juramentos eternos e da troca de alianças. O padre sorria, vacilava o corpo e movia a boca ao som e ao ritmo, com uma cara de parrandero, de festeiro mor.

Lembrei-me da história que uma amiga baiana contou-me do pároco de sua cidade natal. Ele vivia nos bilhares, tomando sua cachaça e terminava a noite nos prostíbulos. No Carnaval saía de nega maluca grávida. Quando tinha que ir para a celebração do santo ofício, dizia para os companheiros de boteco:

- Segura essa aí, que eu já volto depois da porra dessa missa Milagros e Glória notaram o sorriso nos meus lábios:
- Que está aprontando?!
Para elas, ser brasileiro é ser irreverente.

Depois contei-lhes que no Brasil algumas noivas estão agora trajando vestidos roxos, amarelos, pretos e que eu imaginara uma cena de casamento com os noivos sendo acorrentados pelos sogros e o padre, vestido a la Sarita Montiel, cantava árias de ópera bufa. Os nubentes eram arrastados até ao altar onde, após o juramento de eterna submissão, suas asas eram cortadas. Afinal, tinham caras de anjos. Eram anjos.

Almoçamos em um restaurante à beira mar, na romàntica praia de Naguabo, onde existe um lindo malecón - um passeio cimentado, com postes de luz e, ao fundo, duas preciosas casas no melhor estilo art nouveaux, conferindo à paisagem um indefectível ar fin de siécle.

O mar calmo, com gaivotas no ancoradouro e pescadores velando suas toscas embarcações. Serviram-nos peixe ensopado, no melhor estilo crioulo.

Estivéramos juntos em muitos passeios e em muitos lugares da Isla del Encanto mas aquele instante parecia-nos eterno e definitivo. Uma certa graça européia combinado à luz e ao esplendor colorido do Caribe, com as águas tranquilas e seu revérbero constante.

Acabamos a tarde visitando o recém reinaugurado hotel El Conquistador, de Fajardo. Depois de vê-lo, o Copacabana Palace continua requintado
e saudoso mas reduz-se a um detalhe se comparado ao El Conquistador! Imenso! Campos de golfe, praias, piscinas por toda parte, nos diversos níveis em que o descomunal resort se multiplica, havendo um plano inclinado interligando os pavilhões superiores e suas casas adjacentes aos últimos chalés, às piscinas derradeiras e à marina cheia de barcos e veleiros. Uma decoração bem ajustada, com muitas palmeiras, bromélias e orquídeas em flor, um sofisticado mini-shopping, restaurantes e bares, e uns tantos salões abertos à paisagem de ilhas e águas delineadas pela baía. Ali estivera Glória em sua lua-de-mel, antes que o hotel entrasse em decadência. Era -e voltou a ser o símbolo do turismo porto-riquenho, uma experiência inesquecível para os seus ocupantes, por sua excessividade, por seu estilo da década de 60 - os anos dourados! -, num cenário holliwoodeano de Great Gatsby, para novo-rico nenhum botar defeito, para o exibicionista ficar à vontade. Irresistível. Mas os noivos de Naguabo certamente tiveram que contentar-se com a estada numa casinha de praia de algum parente mais afortunado, nem por isso menos encantadora.

* * *

Geraldo Franco reclama que falta sexo a esta narrativa. Calúnia. Não bastam as referências a duas luas-de-mel num único texto?! É o máximo que se permite por aqui, onde as novelas da TV Globo chegam censuradas. Ou será que ele deseja sexo explícito, com os noivos naguabenhos nus, frente ao espelho, excitados por serem quatro? E ele, Geraldo concupiscente, metido na estória, sendo o quinto, curtindo o seu morbo. Vai acabar cobrando sexo grupal, onde apenas registro o colóquio de anjos em seu farfalhar e arrulhar de plumas e regozijos. Se acha pouco, que tal anjinhos fornicadores, copulando no ar? Sem chegar, é lógico, ao extremo dos caralhos voadores do Nelson Rodrigues, porque então já seria pornografia maior.


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Próxima crónica da série: (43) BABYSITTER DE CACHORRO



Para ler toda a sequência inicie pela crónica (1) VÓO NOTURNO, na seção de cronicas de Antonio Miranda, na Usina de Letras.

Iremos publicando as cronicas que vão constituir uma espécie de romance,
paulatinamente. Semana a semana... o livro impresso já está esgotado...

Sobre a obra e o autor escreveu José Santiago Naud: "A agudeza do observador, riqueza do informe, sopro lírico e sentido apurado do humor armam-no com a matéria e o jeito essenciais do ofício. É capaz de apreender com ternura ou sarcasmo o giro dos acontecimentos e deslizes do humano. Tem estilo, bom senso e bom gosto, poder de síntese e análise assim transmitindo o que vê e o que sente, nos transportes do fato ao relato, para preencher com arte o vazio que um vulgar observador encontraria entre palavras e coisas".

Crónica do livro: Miranda, Antonio. Relógio, não marque as horas: crónica de uma estada em Porto Rico. Brasília: Asefe, 1996. 115 p.



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