Usina de Letras
Usina de Letras
12 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62285 )

Cartas ( 21334)

Contos (13267)

Cordel (10451)

Cronicas (22540)

Discursos (3239)

Ensaios - (10386)

Erótico (13574)

Frases (50671)

Humor (20040)

Infantil (5458)

Infanto Juvenil (4780)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140818)

Redação (3309)

Roteiro de Filme ou Novela (1064)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1961)

Textos Religiosos/Sermões (6209)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Artigos-->Quinze Minutos de Fama ou Meu Dinheiro de Volta -- 20/01/2003 - 07:53 (Márcio Scheel) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
No livro bíblico Eclesiastes, podemos encontrar uma das melhores definições do homem de que já tive notícias (e olha que tenho um sem-número de notícias advindas das mais variadas fontes): Vaidade de vaidades e tudo é Vaidade. Leio na revista Época uma reportagem especial sobre a onda de vaidade e necessidade de reconhecimento público pela qual as pessoas vêm passando nas últimas décadas e que gerou essa contemporaneidade narcisística, que se mira ao espelho na tentativa de reconhecer em si a razão mais bem elaborada do resto do universo.

Houve um tempo em que ter dinheiro, propriedades ou um título de nobreza eram passaportes certos e garantidos para o reconhecimento. Foi o tempo dos salões, das saraus, das festas em que se reunia tanto a aristocracia decadente quanto a burguesia em ascenção, a primeira pobre e falida, mas fina, educada e culturalmente imbatível, a outra rica, jogando dinheiro fora, mas sem cultura, numa época em que esta era mais do que suficiente para o sujeito viver um vida principesca, de reconhecimento e notoriedade, basta pensarmos em Rainer Maria Rilke, um das grandes poetas alemães de fins do século XIX, que não era rico ou tinha dinheiro, mas invejável culturalmente, passou a vida em castelos, em meio a nobreza, sustentado por ela e escrevendo aquela que talvez seja a mais conhecida poesia em língua alemã dos últimos cem anos.

Apesar da decadência financeira da aristocracia de fins do século XIX, ela ainda servia como uma espécie de modelo cultural para a burguesia que ascendia economicamente, mas que não tinha formação cultural ou tradição, como acontecia aos aristocratas, mas que tinham o dinheiro de que necessitavam para se educar em literatura, música, pintura, ou qualquer outro tipo de manifestação artística humana. Aliás, o kitsch como sinônimo de mau gosto ou de lixo cultural, imitação ou pastiche das grandes obras artísticas de vanguarda, surge de forma indissociável e intimamente ligado ao desejo de se educar culturalmente, em fazer parte também da elite intelectual da época, sofrido pela burguesia oitocentista. A arte burguesa populariza excessivamente os gostos e a alta cultura aristocrática que passa a imitar, deixando sua marca indelével, como um Midas do horror concentrando, em tudo o que tocava.

O romance romântico, aventureiro, melodramático, folhetinesco, é um típico exemplo do caráter diluidor e kitsch da arte burguesa porque aparece na esteira desta e se firma como o gênero por natureza de uma classe que ascendia sem critérios de valor mais bem sedimentados que as próprias e enganosas idéias de que o mundo é um universo passível unicamente de capitalização, sem qualquer condição judicativa mais ou menos organizada com relação às artes, já que estas dependem sempre da contemplação desinteressada do homem, o que fere em cheio a postura pragmática do senso burguês, que vive da ideologia do imediatismo, do acúmulo, da contenção e geração de recursos, sem que os valores eternos, preocupação primeira de toda a obra de arte, seja sequer considerado.

Hoje as coisas pioraram drasticamente. Não há limites para o pior! Com o surgimento da televisão e outros veículos da comunicação de massas, houve uma espécie de elogio da baixa cultura, do entretenimento vazio, da auto-referenciação, da exposição de corpos, seios e bundas ad nauseam, capaz de causar tédio e fastio até mesmo no mais completo e absoluto pervertido sexual. Homens, mulheres, jovens ou velhos, ninguém escapa à superexposição, à vaidade de se ver estampado na capa da revista Caras, com um sorriso fake de idiota realizado, feliz com o próprio destino. São os mitos da hora, os que acontecem nesse exato momento, mas amanhã, o que será?

A televisão, por exemplo, é uma indústria cujo valor de seus bens é medido, paradoxalmente, pela capacidade de ser perecível. Tudo tem de acontecer rapidamente, inclusive o sucesso, tudo tem de se dar no intervalo do imediatismo, instantaneamente. Não se pode levar anos para criar um mito porque as pessoas necessitam dele agora, nesse próximo segundo, ou trocam de canal. As pessoas têm uma necessidade de se reconhecer no outro, no bem-sucedido, no astro televisivo, no famoso, que é como se compartilhassem assim a fama, como se vivessem, ainda que de forma irrefletida, o sucesso alheio.

Os que se mostram diariamente na TV, nas colunas sociais, nas revistas de chiques e famosos, esses se comprazem com a glória da glória, como o sucesso de ver suas casas, seus guarda-roupas, seus carros importados, sua intimidade revelada e desvelada diariamente, com a felicidade besta de se mostrar. Vão à festas, eventos, exposições apenas para que algum fotógrafo se digne a dar uma nota que seja da presença de fulano ou beltrano entre os convidados menos favorecidos pela sorte. Gastam verdadeiras fortunas em apartamentos, jantares, aniversário ou qualquer outra bobagem que possa garantir o menor destaque que seja na imprensa especializada, porque, não se enganem, há uma imprensa especializada em faturar alto em cima das aspirações coletivas de realização, idéia central do capitalismo moderno, aspirações quase sempre irrealizáveis porque a realização pessoal há de ser financiada, e isso e lógica de mercado básica.

Não há mais arte burguesa imitativa, pastiche de alta cultura sequer, há o corpo, o rosto, os seios turbinados, as bundas em trajes sumários, ás vezes sem traje, a mansão em Angra, o apartamento no Leblon ou em Copacabana, a casa em Campos do Jordão, a conta no banco, tudo exposto aos olhares atentos de uma massa esfaimada de reconhecimento e sucesso, ainda que furtado ao outro, ainda que alheio a si mesma, numa espécie de esquecimento calculado da própria e mais íntima condição. Vaidade de vaidades e tudo é vaidade.

Andy Wharhol, artista plástico norte-americano da década de setenta, profetizou que no futuro todos teriam direito a quinze minutos de fama. Na atual circunstância, me parece, é o tempo exato que ela dura. Enfim, matamos a eternidade.

Deus castiga!















Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui