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Artigos-->O reboque -- 04/02/2003 - 12:08 (J. Eduardo P. Pontes) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos


O reboque (1)





Deve ter sido em fins de 1963 ou início de 1964 pois não tenho o registro do “vôo”, somente uma impressão na memória já confundida por tantas vezes em que a estória foi contada a ponto de haver se transformado em um “causo”. Estou seguro, porém, que era época de férias as quais transcorriam pachorrentas com as tarefas diárias de comer, dormir e voar na ordem que fosse mais confortável.



No aeroclube tudo era rotina com um pouco mais de agitação no hangar da oficina onde um avião desafiava os conhecimentos técnicos e a paciência de mecânicos, pilotos, diretores e a “saparia” em geral. O rebocador PP-GIM, um PA-18, havia sido reformado e o motor “feito” de novo recusava-se a fornecer todos os seus 108 HP de uma só vez resultando em horas e horas a “rodar nos calços”, estas intercaladas com misteriosos ajustes nos magnetos, limpeza de velas, trocas de hélices, ameaças ao carburador bem como orações diárias seguidas de curtos e decepcionantes vôos de experiência.



Para nós dos planadores o rebocador era apenas um avião que puxava a gente até uns 400 metros durante cerca de 10 ou 15 minutos tempo em que deveríamos manter o planador na direção indicada pela corda o que deveria resultar em razoável alinhamento com o avião até o desligamento. Ninguém se preocupava com “pane” no avião.



O treinamento para “emergências” era dado exclusivamente pelo “Kurt”, que aparecia na pista de repente e, com sua perspicácia, escolhia um aluno na faixa dos 35 ou 40 vôos ao qual mandava entrar no “Neivão” ao mesmo tempo em que ele se acomodava no assento de trás. Tudo muito rápido, ultrapassados os 100 metros de altura no reboque, geralmente com a pista por trás, o “Kurt” acionava o desligador e gritava - “ Emerchenzia!!!.....”- já ajudando o espantado aluno a apontar o planador na direção da pista para um emocionante pouso em sentido contrário parando exatamente de onde havia saído dois minutos antes.



Aquele era um momento de glória porque indicava que o escolhido iria solar logo e todos se alegravam com a perspectiva de uma “chopada” à noite em um dos restaurantes da cidade, regada com muita cerveja, azeitonas e sanduíches de presunto e queijo no pão de fôrma. Para todos efeitos técnicos “emergência” significava “chopada”.



Foi em um daqueles dias em que eu estava na “instrução” naquele sobe e desce, aluno após aluno, me preparando para mais um vôo, o próximo aluno era o “Kartoffel” (opção em idioma alemão usada alternativamente para identificar o “Batata”), quando percebi que haviam trocado o avião. Foi uma satisfação saber que haviam finalmente arrumado a fera pois lá estava o GIM com o Orlando no comando taxiando até próximo ao nariz do “Neivão” dizendo algumas palavras, que eu não entendi mas com as quais concordei inteiramente, e já alinhando para esticar a corda.



Decolagem iniciada,- “ Demorando para ganhar velocidade.....”- pensei , na metade da pista o avião ainda estava no chão e eu por puro reflexo já acompanhando os comandos, fim da pista e o avião sem outra alternativa decola o suficiente para passar sobre a cerca permanecendo na mesma atitude. Situação nova e interessante, não é o avião que sobe mas sim o chão que abaixa. Curva suave para a esquerda seguindo a bacia de Bauru por cima da quiçaça com a cidade pela frente e os prédios do aeroclube a esquerda quase que acima do nosso nível de vôo. Com inspiração de “instrutor” eu pergunto ao “Batata” - “ Se quebrasse a corda onde você pousaria ?.....”- não houve tempo para resposta pois o avião já entrava em um certo angulo com a perna do vento conseguindo subir alguns metros, silêncio de pouso fora, curva para a esquerda, a pista aparece, o avião desliga a corda (!!!!), nós também (!), e continuamos a curva pousando um atrás do outro.



O dia deve ter continuado e acabado normalmente pois o “Batata” não solou e também não houve “chopada”, eu, como sempre, devo ter levado sim alguma “chupada” pois o Orlando já era meu freguês de uma outra estória.



O avião continuou a ter e a dar problemas até que um dia piloto e mecânico, provavelmente já sem paciência, saíram para mais um vôo de experiência e logo na decolagem, aquelas de máxima performance com o nariz bem para cima, o motor simplesmente parou. Na recuperação o avião tocou uma primeira vez violentamente nos três pontos, voltou para cima sem controle, terminando em uma placada na lateral da pista com a fuselagem dobrada ao meio, além disso apenas danos morais aos tripulantes. Foi completamente recuperado prestando relevantes serviços ainda por muitos anos, aliás foi o avião em que fiz o meu solo de rebocador.



Hoje quando o “Kartoffel/Batata” já é apenas o grande “Batata” e alguém especula sobre a origem de suas habilidades como piloto, eu tenho vontade de contar o segredo simples que sempre está por de trás dos grandes feitos. Ele é um dos poucos pilotos que recebeu treinamento completo em emergência, muito mais amplo que o do “Kurt”, em um único vôo, da decolagem até o pouso, e sobreviveu.







P.S. : Caro Kurt, eu sei que na época eu era pior que água em gasolina e graxa em roldana, mas esta eu contei para que você se lembre de mim e ponha sempre a mão na minha cabeça.













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