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cronicas-->Lavadeiras de Água Doce -- 25/01/2007 - 20:07 (Jader Ferreira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Lavadeiras de Água Doce

O Ribeirão Bom Jesus era um riacho de águas límpidas. Ele cruzava a Vila de Água Doce e passava bem nos fundos da minha casa. Naquele tempo as águas eram puras, límpidas de se ver o fundo pedregoso. A areia branca se movia e sobrepunha-se, arrumava-se devagar. Um grão brilhante rolava sobre o outro formando um tapete branco -eram milhões, aparentemente parados, mas seguindo todos na direção do mar. Foi naquele rio que eu vi uma camisinha pela primeira vez. Estava inflada e presa num ramo submerso, agitando-se na força da corrente. Pensei que fosse uma bola de bexiga ou uma mini-biruta a sinalizar o pouso de aviões liliputianos imaginários. Mas isto é uma outra história...
Na direção do nosso quintal o rio fazia uma curva, alargava-se e formava uma extensa praia de areia. Minha mãe e outras mulheres iam ali para lavar roupas. Elas levavam grandes cestos cheios de lençóis, toalhas de mesa, calças e camisas dos filhos pequenos, enormes e feias cuecas dos maridos mandões. Esses preguiçosos ficavam em casa fumando e conversando abobrinhas, sem coragem para fazer um tiquinho de nada. Ao longo da praia fluvial era possível ver bacias de latão cheias de roupa já lavada e torcida, ladeadas por enormes troncos rachados ao meio que serviam de batedouro para alvejar a roupa. As mulheres pareciam ter sido feitas de mola, pois flexionavam o corpo e erguiam a roupa molhada bem acima da cabeça e depois, com força de gigante, malhavam o "biscoito ensaboado" sobre os troncos de madeira, espirrando espuma e água para todos os lados. De longe era possível ouvir o barulho gostoso -igual ao que produz um lenhador trabalhando no alto da serra. Elas diziam que batiam para alvejar a roupa, para que ficasse bem branquinha. Mas eu achava que tinham mesmo era raiva dos seus maridos, uns folgados, e se vingavam deles ali, batendo forte na roupa deles. Bem feito!
Nós, meninos irresponsáveis, brincávamos despreocupados na água limpa e rasa, não havia possibilidade de um afogamento. A preocupação maior das nossas mães estava voltada para os temidos cabritos, comedores de botões, e para os porcos famintos que frequentavam o local. Os cabritos passeavam sobre as roupas postas a quarar e deixavam rastros bipartidos, amarelos, sujando as peças recém-lavadas e comiam os botões das camisas. Os porcos, por sua vez, apreciavam comer as aparentemente deliciosas barras de sabão. Não raro, um gordo suíno saía correndo, enxotado pelas valentes mulheres. O delinquente suíno, sem nenhuma preferência culinária fugia medroso, ostentando no queixo uma enorme barba de espuma, resultante da barra de sabão que comera impropriamente pensando que fosse queijo. O terror maior das lavadeiras, porém, era a mamangaba, ou mangava (um tipo de abelhão peludo de barriga listrada de amarelo e preto, cuja picada é assaz dolorida). A mamangaba sempre gostou de morar nos troncos podres, exatamente naqueles batedouros de roupa, que eram tão necessários à profissão das lavadeiras. As vigorosas pancadas que elas davam na parte externa dos troncos irritavam os insetos lá dentro e eles saíam furiosos para se vingarem.
Heróica, úmida comicidade. Jamais me esquecerei dessas cenas molhadas e cómicas. As mamangabas, insetos extravagantemente grandes, acrescentaram valentia ao trabalho da minha mãe e aumentaram o meu amor por ela. A dona Francisca lavava roupa e ainda enfrentava cabritos comedores de botões e porcos comedores de sabão. Ela tirava de letra as picadas dos abelhões gigantes enquanto o Juca, meu pai, ficava em casa fumando, dormindo feito um capado ou pescando no distante Rio Preto acompanhado por algum compadre seu, igualmente preguiçoso e vagabundo. Cada vez que me lembro dessas coisas, gosto um pouquinho mais da minha mãe.




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