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Contos-->JUÍZO PARTICULAR -- 18/12/2012 - 15:22 (Adalberto Antonio de Lima) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

    Sete anos de pastor Jacob servia
    Labão, pai de Raquel, serrana bela;

   Mas não servia ao pai, servia a ela,
   E a ela só por prêmio pretendia.

   (Camões)

 

Sentia-se pastor ferido, incapaz de conduzir o rebanho da casa de Jacó. Servia a Deus na esperança de que a Madre Igreja não tardasse permitir que os sacerdotes se casassem. Por que não agora? Quanto tempo esperar ainda?... Estaria ele vivendo o processo agostiniano de conversão? Um processo inverso, porque primeiro, Agostinho viveu a concupiscência da carne, e depois se converteu. O Padre Éden  não queria para Victor Augusto a mesma sorte  do  filho que  a mulher de Urias tinha dado a Davi, nem a morte prematura de Adeodato.  Cedo o levaste — confessou Agostinho.

O padre estava profundamente perturbado com a pergunta que Morgana fizera há poucos dias no colégio: “É verdade que José de Alencar é filho de um padre?” Teve vontade de dizer que o romancista brasileiro era filho do ex-padre José Martiniano de Alencar. Mas sabia que padre, uma vez padre, mesmo perdendo algumas atribuições do ofício, nunca deixa de ser padre. Levantou, vestiu a batina e pouco depois já estava na Matriz celebrando a missa das sete. Consagrou o pão e o vinho. Distribuiu as partículas consagradas, deu a bênção final aos fiéis e ficou em adoração.

O Auto da Alma se lhe passou pela mente — ele mesmo ensaiara a obra de Gil Vicente com os alunos do Marista. Agora, diante do Santíssimo, via em imaginação seu juízo particular: Custódio tentando resgatar alma do padre e o Diabo querendo arrastá-la para as trevas.

Persignou-se. Selou com o sinal dos cristãos a testa, a boca e o peito e em seguida, telefonou para  suplicando por uma refeição.

— O padre não tem quem lhe faça o almoço.

— Não tenho nada especial no cardápio de hoje, se não se incomodar com o trivial... vamos comer arroz, feijão, alface e bife. — disse ela.

— Ótimo, não aguento mais frango caipira.

Chegou cedo trazendo na mão esquerda uma valise e na direita, uma sacola.

— Que é isso? Veio de mudança?

Teve vontade de dizer “SIM”. Mas se calou.

— Fique à vontade, padre! Ainda não terminei o almoço.

— Sim, sim! Mas gostaria de te entregar estes paramentos! Se puderes mandar lavar, quero dar a eles uma aposentadoria digna.

— Aposentar por quê? Estão novos.

— Não é bem por que, é para quê. O sacerdócio agora para mim é uma página virada no livro da vida. Ele tem páginas amarrotadas, páginas amareladas que tento remover, rasgar e atirá-las fora. Existem páginas que só poderão ser lidas em dias futuros, porque ainda não foram escritas. São capítulos que estão sendo gestados hoje, para serem lidos amanhã. E, embora não se saiba exatamente quantas páginas tem o livro da vida, o da morte tem apenas uma página, o panegírico.

­— Isso é verdade, disse ela — Começamos a morrer, no primeiro instante em que nascemos.

— É... um dia a alma se cansará do cárcere e abandonará o corpo.Completou o padre Davi.

Imediatamente  fugiu ao tema de morte e anunciou:

—A mesa é posta.

Durante a refeição a anfitriã olhava os movimentos do padre cortando a carne com a mão esquerda.

— Canhoto, o senhor é canhoto?

— Quem criou as etiquetas de boas maneiras, esqueceu dos canhotos. Como posso cortar com a faca na mão direita? As pessoas acham-se no direito de determinar um padrão único para destros e canhotos e ainda pedem explicações aos que não se afeiçoam aos moldes que eles criaram. 

Davi percebeu que tinha dito uma asneira. Ele devia explicações ao bispo diocesano sobre os motivos da decisão de deixar a batina. E quando o fez, o bispo já sabia pela boca do povo.

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