Usina de Letras
Usina de Letras
13 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62285 )

Cartas ( 21334)

Contos (13267)

Cordel (10451)

Cronicas (22540)

Discursos (3239)

Ensaios - (10386)

Erótico (13574)

Frases (50673)

Humor (20040)

Infantil (5458)

Infanto Juvenil (4780)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140818)

Redação (3309)

Roteiro de Filme ou Novela (1064)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1961)

Textos Religiosos/Sermões (6209)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
cronicas-->Galinha caipira -- 08/02/2007 - 10:58 (Jader Ferreira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Galinha caipira

Na hora do almoço o pavor dominava o terreiro da minha casa. A galinhada se agitava, pois a escolhida para morrer seria abatida pelo meu pai. O Juca, depois de arrancar algumas penas do pescoço da ave, passava a làmina afiadíssima. Era uma violência contra a vida mas ele não tinha dó nem piedade. O sangue viscoso e abundante era colhido em xícara de louça adrede preparada. Depois de depenada, na força da água fervente, ocasião em que as penas liberavam um cheiro esquisito de cachorro molhado, a dona Francisca, minha mãe, picava a galinha em pedaços, lavava, temperava e refogava com maestria numa panela de ferro. O sangue, já coagulado feito um pequenino queijo marrom, era cozido junto com a "oveira". (assim chamavam a estrutura central do ovário com a penca de ovinhos amarelos anexos que aguardavam para vir ao mundo). A moela, o pescoço e os pés também entravam no processo. Depois de uns vinte ou trinta minutos no fogo alto, com a tampa da panela sambando em meio às borbulhas do caldo quente, eu me deliciava. O caldo amarelo com muita cebola e bolinhas de gordura sobrenadando, eu botava em cima do arroz. Era uma delícia. Quando tinha polenta ainda era melhor, mas apenas os miúdos do frango e o arroz soltinho já eram suficientes. Esperando ansioso que a galinha caipira ficasse pronta, eu ficava rodeando por perto, gemendo, dando pulinhos, correndo feito um bobo, apressando a mãe-cozinheira. Eu era o principal freguês da minha mãe e acho que era só por isso que ela me suportava.
Certo dia, o tio Sebastião que morava num sítio distante, veio nos visitar e ficou conosco um dia inteiro. Na hora de voltar convidou-me para ir com ele. O tio não tinha carro e o sítio ficava longe, num fim de mundo na direção de Ataléia. Era uma distància enorme, mais de oito léguas. Fui mas não devia ter ido. Quando chegamos na casa do tio, no final da tarde, eu tinha assaduras feias no ponto de fricção das nádegas. As assaduras queimavam muito e eu não conseguia dormir. Para incrementar a minha insónia, veio o injustificado medo. Enormes vaga-lumes, de um tamanho que eu nunca tinha visto, entravam pelos vãos das telhas e acendiam fachos de luz azulada que me apavoravam. O quarto ora ficava escuro, ora ficava claro. Tremendo de medo eu não dormia. Na manhã seguinte, o tio Sebastião, para me agradar, moeu uma cana caiana e fez garapa para mim. Porém, na hora do almoço, a tortura recomeçou.
A tia Altair, irmã mais nova da minha mãe, não sabia cozinhar muito bem mas prontificou-se a fazer uma galinha caipira para me agradar. O caldo ficou ralo e o arroz empapado. Eu não queria desagradar à tia, mas também não sabia dizer que não estava gostando da sua comida. A galinha parecia estar viva, crescia no prato e eu não conseguia engolir.
A situação ficou dramática e acabei fugindo para a estrada. Logo depois passou um caminhão cheio de sacas de café, com destino à minha doce Vila de Água Doce. O motorista me reconheceu como sendo o filho do Juca, dono do bar, e não me foi difícil descolar uma carona. O certo é que, tangido pelo tempero e pela saudade da dona Francisca, voltei correndo para casa. Cheguei três dias antes do combinado: "Mamãe, olha eu aqui de novo!..."

Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui