Democracia é conversa de grego. Se presente de grego não é confiável, imagine a conversa dele. Em nome da democracia muita bobagem já foi feita, muitos crimes já foram transformados em atos heróicos, muito fascista desfilou de salvador.
Demo quer dizer povo. Cracia é poder. Demo também é um dos apelidos do diabão de rabo comprido e tridente sempre faminto e cada vez mais alimentado. Cracia parece nome de gente maltratada pelos pais já na hora do registro no cartório: "A graça dela vai ser Cracia da Silva Pereira de Jesus! Uma Cracinha.". Democracia pode até significar o povo no poder, mas está mais fácil pensar que demo-Cracia é o diabo daquela alagoana do cafezinho, a Dona Cracia. Café com muita quentura e pouco gosto.
Na prática, a democracia não existe. Na política, por exemplo, democracia é escolher pelo voto obrigatório centenas de pessoas para que elas tomem decisões e façam pelo país aquilo que nós sempre temos a certeza de que faríamos muito melhor e mais rápido. É a tal de democracia representativa. Por que representativa? Alguém conhece almoço representativo? Sono representativo? Doença representativa? Morte representativa? Sexo representativo até existe, mas é motivo para divórcio. Em tudo estamos presentes; para resolver as mazelas nacionais, mandamos um representante menos preparado que nós. No final, democracia representativa é o poder nas mãos de quem tem mais dinheiro para comprar votos.
Se na política, berço dos ideais democráticos, a democracia é uma falácia, não entendo porque todo mundo quer que tudo seja democrático. Volta e meia alguém ergue a voz para gritar:
- Mas isso não é nada democrático!
Na escola, foi-se o tempo em que o professor decidia o que, quando e como ensinar. Não é raro ouvir dos jovens e até dos miúdos a reclamação de que eles nunca foram consultados sobre o conteúdo programático. É o vírus da democracia! Democrático seria fazer uma votação na qual eles definiriam o horário de entrada, a duração da aula, as disciplinas importantes e até o método de avaliação. Pense nisso. As aulas seriam das 14h00 Ã s 16h00, duas vezes por semana e versariam sobre futebol, Revista Capricho, games e afins, educação sexual e futebol outra vez, sem a obrigatoriedade da presença dos mestres que estariam liberados para permanecer na sala dos professores reclamando do salário e falando mal dos alunos. Preste atenção 1: escola nada tem a ver com democracia.
A família também sofre com o vírus democrático. No tempo da camisolinha, se um moleque de quatro anos quisesse saber da mãe porque ele era obrigado a tomar banho todo dia, bastava responder o bom e velho "porque sim!" ou "porque a mamãe está mandando!" e fim de papo. Hoje, pais são reféns de filhos que querem sempre uma explicação lógica e convincente sobre as razões de ir à escola, de escovar os dentes, de ser educado com os mais velhos, de não poder comprar tudo o que eles querem no shopping. Onde já se viu? Dizer não sem ouvir a maioria? Vamos votar! Papai e mamãe disseram não; Júnior, Clarinha e o primo disseram sim. Três votos contra dois. Oba: vamos comer pizza todo dia! Preste atenção 2: família nada tem a ver com democracia.
Já ouvi algumas pessoas reclamando que o casamento não ia bem porque o marido não era democrático! Preste atenção 3: relacionamentos nada têm a ver com democracia. Outros criticam os patrões porque eles não são democráticos. Preste atenção 4: trabalho nada tem a ver com democracia.
Apesar disso tudo, há um anseio de democracia nas salas, nos quintais, nas ruas, em todo o planeta. Até os animais de estimação, os eletrodomésticos, os computadores e os carros querem ser ouvidos. Votemos para decidir tudo e qualquer coisa. Melhor: façamos uma votação para saber se o país concordaria em realizar uma votação para decidir se devemos votar para decidir tudo! Viva o vírus da democracia! Viva a democracinha! Ou seria a anarquia? Não sei... então votemos!
