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Artigos-->Dinália acabara de sair -- 07/03/2003 - 21:28 (BRUNO CALIL FONSECA) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Dinália acabara de sair de casa, atravessou a calçada, e na primeira passada, em direção ao asfalto, a sua perna direita foi engolida por um bueiro, como se engolida por um tubarão. Sofrera alguns hematomas sem maiores conseqüências. A vizinha, ao acudí-la, muito prática, untou a perna engolida e está saiu pelo mesmo lugar com pequenas escoriações.

Eu, com um bueiro, tive mais sorte. Ah! Não diria eu. Diria o minúsculo pedaço de papel. Já quase na boca do bueiro eu o recuperei, atraído pelo que nele estava escrito. Eram números. Não é a primeira vez que papéis-do-chão das cidades me atraem, não é a primeira que me cerco de números para expressar algo. Mas o que têm em comum o papel e a Dinália? Nada além da circunstancialidade de ambos — ela e pedaço de papel — estarem se esgueirando pelo ralo de um bueiro. Mais nada! Pelo menos nada que eu possa explicar.

Não é tão simples assim. Um pedaço de papel com números, prestes a ser tragado por um bueiro, recuperado instintivamente, parece-nos uma premonição de que ele pode vir a ser a salvação de quem luta para sair da sarjeta social através de jogos numerológicos. Números que nos atraem não arriscamos desconsiderá-los. Acaba que somos supersticiosos.

Apanhei o pequeno papel e o guardei no bolso. Não tive, no primeiro instante, nenhuma motivação de servir-me dele para o tal jogo de loteria. Sou cético: Dinália, eu e você temos muito mais chance de perder a perna no ralo de um esgoto do que acertar na loteria. Não perco muito tempo com isso. Quero dizer: não perco tempo em filas. Sou seletivo com elas. Por falta de opção, ocupo-me com as filas dos congestionamentos dos sinaleiros de trânsito. O dia é pequeno, escurece logo, e logo tenho que chegar em casa. Sentar-me pelo menos meia hora no sofá, com ou sem suor e depois me levantar e ir para o curso que faço. Os cursos são condições imprescindíveis para sintonizar-me com o mundo, para que possa enxergar melhor e evitar cair a torto e a direito nos bueiros da vida. O pedaço de papel e os números nele contidos não passam de uma ilusão.

Quando Dinália me contava que havia caído no bueiro foi que eu dei, pelo tato, pela segunda vez, com o minúsculo papel cujas inscrições formavam o número 099738. Ele ainda estava em meu bolso. Analisei os números, combinei-os e conclui que eles não apresentavam uma boa combinação para fazer um jogo da sena. Formavam apenas oito combinações ao alcance do jogo. Se três evidenciassem acerto, teria mais de cinqüenta por cento de chances de ganhar o prêmio. Ah! Mas como disse: “Eu sou cético”. Meio acerto não tira ninguém do buraco.Então eu não jogo.

Mas se tenho tanta certeza de que estes números não saem, para mim, no jogo da sena, tão barato, por que eu não faço um jogo duplo? De sena e de cena. Marco os números e dou a cartela de presente para a Dinália que caiu no bueiro. Poderia ser a chance de soerguê-la desse buraco social em que nos encontramos. E, afinal, esta já não era a primeira vez que me despia do egoísmo de ter só para mim a minha potencial chance de ganhar muito dinheiro. Lembro-me que de outra, comprei três cartelas de raspadinha e as dei de presente para meu amigo, com direito ao prêmio, raspar.

Se der o primeiro prêmio você não vai se arrepender? — pergunta a consciência. Ora! O que tem a ver? Que seja dela! Não é isso que queremos para os nossos amigos, os nossos irmãos? Sempre desejamos mil dias de felicidades; que sejam felizes para sempre, até a morte; desejamos que seus dias sejam lindos e que possam aproveitar as maravilhas do mundo. Dê uma chance a ela. Enfim, o meu propósito não é fazer um jogo duplo? Que ela seja feliz.

O sonho dela, depois de formada em jornalismo, é ir à França, conhecer a torre Eifel; à Holanda, conhecer as lavouras de tulipas; à Inglaterra, passear de ônibus sem o risco de, ao apear, meter a perna num buraco de bueiro; a Portugal, andar pelos brados, colher frutas nas quintas e em especial roubar maçãs na quinta do Ribamar Sarney e entrar na sua intimidade ao entrar em igrejas calhadas de branco, tão lindas, tão alvas, como a veste da noiva que um dia fora virgem. Todos estes sonhos foram sonhados e copiados de magníficos cartões postais. Mas ela é muito humana. Se a “sena” der, ela não vai para a Europa sem que antes compre uma casinha para a mamãe, para os irmãos; sem que antes dê ajuda aos irmãos da igreja, à própria igreja, porque a igreja é a casa de Deus. É preciso cuidar que Ele não a desabita, porque uma vez desabitada Ele nos desabita e causa um vazio interior do tamanho do mundo, portanto, impossível de ser preenchido com uma viagem pelos cartões postais da Europa.

Como vedes, a felicidade dela carece de pouca coisa. Meros postais cravados no inconsciente. Que, no entanto, para se concretizar, depende de mim que sou o autor desse jogo de cena, incumbido de marcar num cartão da sena, os números colhidos de um pequeno papel que escapava pelo ralo de um bueiro e presenteá-la, e ela, uma vez premiada, poder realizar seus sonhos, mesmo que sejam simplórios, comuns; tão simplórios e tão ridículo aos olhos de quem cruza o oceano à custa de meu trabalho e do trabalho de Dinália.

Não fiz o jogo da sena para Dinália. Eu e muitos ainda não chegamos a esse grau de altruísmo e de desprendimento material. Mas se a Dinália quiser ela pode pegar o número e marcar o seu. Duvido que marque. Pelo que me consta, ela não vai fazer esse jogo da sena. Ela, igual a mim, é descrente com os jogos de loteria.Entretanto, por via das dúvidas, pedi a Angélica que marcasse esse jogo. Afinal, por razões civis, se ela acertar eu estou garantido. Metade dela, metade meu. Àqueles a quem os números não caem de bandeja, ou os prendem quando estão prestes a cair na sarjeta, mas acreditam na sorte, anotem os números 0, 9, 9, 7, 3, 8 que combinados dão pouco mais de vinte dezenas. Boa sorte!

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