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Artigos-->Brincadeira de criança -- 09/03/2003 - 23:42 (Nilo dos Anjos Gomes) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos




A maturidade do indivíduo se dá pela capacidade de suportar as suas frustrações.De um certo modo às brincadeiras de criança, em muitos aspectos, nos prepara para as várias frustrações a que estamos sujeitos a passar pela vida e revive as que já passamos, quando recria de forma lúdica as maneiras pelas quais nos tornamos, em nossa formação psíquica, seres desejantes. Nessas brincadeiras revivemos, por exemplo, o complexo de Édipo, pois, quando privado da satisfação do gozo incestuoso pela mãe, o menino deseja matar o pai, para poder viver essa relação sem impedimento, mas aceitando a castração, não o mata, mata simbolicamente os adversário num jogo, que os remete a este pai em suas brincadeiras.Ou a menina que tem ódio da mãe, porque esta a pôs no mundo desprovida de um pênis, tem nas brincadeiras de criança, seu pênis representado na figura do prêmio pela vitória alcançada, o falo imaginário está ali representado.



Uma conseqüência da inveja do pênis parece ser um relaxamento da relação de ternura com a mãe enquanto objeto.[...] É quase sempre a mãe que é responsabilizada pela falta do pênis, a mãe que lançou a filha no mundo com um equipamento tão insuficiente.Freud (1925, pp. 128-9)



Ou quando não obtém êxito da conquista, a figura da castração se faz presente deste modo também em algumas brincadeiras. Nasio (1997,pp. 37-38) citando Lacan diz: “Uma experiência por atravessar, um obstáculo a superar, uma decisão a tomar, um exame a passar etc., todos são desafios da vida cotidiana que reatualizam, sem o conhecimento do sujeito e ao preço da perda, a força separadora de um limite simbólico”.

A figura da lei, que nos mantém cônscios do valor que ela representa a todo instante em nossas vidas, está sempre presente, seja nas regras, seja no poder conferido a algum membro; que dita as ordens, que manda, que organiza e divide o grupo nas brincadeiras infantis, nos remete à figura paterna, a terceira pessoa da relação mãe e filho, aquele que tem o poder de castrar o menino, que compelido “... aceita a lei da proibição e opta por salvar seu pênis...” (Nasio, 1997, p.17), em Freud: “Um belo dia, dá-se que o menino, orgulhoso de sua posse de um pênis, tem diante de seus olhos a região genital de uma menina e forçado a se convencer da falta do pênis num ser tão parecido com ele. A partir desse fato, a perda de seu próprio pênis torna-se também uma coisa passível de ser representada, e a ameaça de castração consegue fazer efeito só depois”.(1949, pp. 60-1). Em Lacan o menino assustado, aceita a castração renunciando ser o falo da mãe: “... a solução do problema de castração não se sustenta no dilema de tê-lo ou não tê-lo; o sujeito deve, primeiro, reconhecer que não o é...”. É também nas brincadeiras que as crianças encontram um meio, socialmente aceito, para testar sua agressividade, sublimando suas pulsões sexuais em brincadeiras de super-heróis, por exemplo, ou quando brincam de pintar.



“A sublimação é um processo que concerne à libido e objeto e consiste em que a pulsão se dirige para outro alvo, afastado da satisfação sexual.” Freud (1914).



Essas construções são, enfim, representações que acabamos por transferir de uma situação insuportável, para uma forma mais aceitável, através das brincadeiras infantis. Todos os nossos medos, receios, proibições, frustrações e desejos que inconscientemente nos levaram a nos tornar este ser eternamente em falta que somos, que se repetem e se manifestam nessas brincadeiras, funcionam como válvulas de escape. O curioso é que essas manifestações surgem de uma forma aparentemente ingênua, despretensiosa e “inconsciente”, mas que refletem uma gama de sentimentos que talvez se parássemos pra pensar numa elaboração, não encontraríamos melhor forma de expressá-los. Como fica evidente na brincadeira que escolhi.Chama-se: MAMÃE POSSO IR? QUANTOS PASSOS?



MAMÃE POSSO IR ? Local(is): Rio de Janeiro

MAMÃE QUANTOS PASSOS ? Mato Grosso



· Desenvolvimento:



Esse jogo é semelhante às “Passada de Gigante”. Os jogadores formam uma fileira, de pé. Destacado da fileira, a uma distância de aproximadamente 10 metros, um jogador fica de costas para o grupo e sentado no chão, fazendo o papel de “Mãe” do grupo.

Cada criança deve, uma de cada vez, fazer as seguintes perguntas à mamãe:

_ Mamãe posso ir ?

_ Pode (responde a mãe que também pode dizer: não. Neste caso a criança pergunta: Por que? Ao que a mãe responde: por causa da raposa. Que é um animal fictício que supostamente estaria entre a mãe e as crianças, ameaçando-as)

_ Quantos passos ?

_ . . .passos (a mãe diz o número de passos que a criança irá executar)

_ De que ? (pergunta a criança)

_ De . . . (a mãe deve responder indicando o nome de algum animal)



A criança deve então, imitando o bicho anunciado pela mãe, dar o número de passos determinado no diálogo.

Quando todas as crianças já tiveram feito a série de perguntas, a primeira recomeçará.

O jogo terminará quando um jogador conseguir chegar até a sua mãe. Esse jogador passará a ser a nova mãe na rodada seguinte.



· Fonte - MELLO, Alexandre Moraes de



Título: Jogos populares infantis como recurso pedagógico de EF. . .



Data da publicação: 1985





Fica claro a intenção quase que explícita nessa brincadeira. A mãe de costas para as crianças informa a cada uma delas quantos passos devem dar em sua direção. O fato de estarem de costas seria, na brincadeira, para evitar que uma predileção por alguma delas, fizesse com que a mesma a alcançasse primeiro. Deste modo todos estariam em igualdade de condições e a escolha da mãe se faria de maneira imparcial. O que na verdade não é o que acontece, já que, pela voz, a criança poderia ser identificada. Mas o que fica evidente é o caráter imparcial que deve levar a mãe à escolha da criança que vencerá. Em outras palavras, aquela que chegar mais perto dela, que lhe abraçará e tomará o seu lugar, ou seja, se fundirá ao seu ser. Mas existe a raposa no caminho. Fica claro também o seu papel nesta brincadeira. A figura da lei do pai está aí identificada, ela é a única que impede a criança de se aproximar da mãe, aparece como um bicho ameaçador, aquele que vai evitar o encontro fusional, o castrador. Mas ela não aparece, é um personagem imaginário, fictício na trama, (em alguns lugares uma criança representa a raposa), mas está ali a rondar a caça, e a mãe é quem alerta a sua presença ameaçadora.



A castração, tal como a encontramos na gênese de uma neurose, nunca é real, mas simbólica, e se refere a um objeto imaginário. Lacan (vol. X,1959-1960, p.334)



As crianças sabem da existência da raposa, mas parecem não identificar quando é que ela está por perto, pois é a mãe quem avisa. A criança quer passar sem ser “vista” pela raposa e quem mais se aproximar da mãe será a vencedora. O falo tão desejado pela mãe, agora está a seu alcance na figura da criança, que deseja alcançá-la sem impedimento, deseja ser seu falo, já que a lei do pai não se fez presente.



Se o desejo da mãe é o falo, a criança quer ser o falo para satisfazê-lo. Lacan (loc. cit., p.693)





O outro aspecto da brincadeira diz respeito aos passos da criança. Pelo que me recordo, quando a mãe queria que a criança se aproximasse mais rápido, ela ordenava que a mesma se aproximasse com passos de elefante. Sabemos que elefantes são animais gigantes, mas a despeito de seu tamanho, sem dúvida, ele não é o animal mais rápido. Mas o que fica claro aqui é o desejo do falo. A criança desejada é concomitantemente relacionada ao elefante, este animal gigante e sua tromba, que evoca na mãe a inveja do pênis. Inveja essa que em última instância, cede lugar ao desejo de ter um filho. E, não satisfeita, tentará possuí-lo.



A vontade de gozar com um pênis no coito metaboliza-se, nessa terceira saída, na vontade de gerar um filho. O deslocamento dos investimentos erógenos do clitóris para a vagina traduz-se pela passagem da vontade de acolher no corpo o órgão peniano para a vontade de ser mãe. Nasio (1997, p.21).



Fica então representada nesta brincadeira, aparentemente ingênua, todo um processo que invariavelmente passa despercebido, mas que reflete uma situação encontrada na mais tenra idade e que depois é novamente processado como que tentando encontrar um escape para nossas emoções reprimidas.



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