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Contos-->Desconstruindo sonhos -- 04/05/2018 - 18:00 (Adalberto Antonio de Lima) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos







Aparentemente cansado. Mais nervoso do que cansado de lutar para transformar a brancura em negrume e a mentira em verdade,  Robert  não acreditava na versão que seu pai houvesse morrido, mas não podia dizer que a  mãe mentia. Era preciso descobrir. E muitas vezes, teve vontade de perguntar a qualquer vivente: ‘Você é meu pai?’ 
  
 Sentia-se algemado e com  um freio cabrestante na boca. Não sabia por onde começar e recebeu Ravenala  com um sorriso fabricado:

 —Incomoda-se se eu tocar baixinho um disco?
— Se for metade da alma, já está tocando.
— Fez parte da juventude de nossos pais. Metade de minha alma está no estilo musical daquela geração.

Ela tomou suco de abacaxi para ajudar na digestão de um batráquio que engolira na loja: teve que trocar uma peça visivelmente danificada pelo freguês e ouvir a ameaça de denunciá-la  ao Programa de Orientação e Proteção ao Consumidor. Pensou em acrescentar que já engolira muitos sapos. Não disse.  Até porque, já  tivera que explicar ao PROCON outras denúncias contra a loja de informática. 

Robert   parecia  triste, não sabia como enxugar seu passivo, nem seu passado, porque o passado doído de menino criado sem pai, nunca passou. E, naquela noite. Bem, naquela noite,  o enxugamento dos textos  de Estrela que o vento soprou, ficou prejudicado. 
Guardara com cuidadado as paplavras do professor Arnaldo "Não marque data para aprontar o trabalho. Adicione ou retire texto, somente quando estiver inspirado. Pense sobre o sentido de cada frasal, de cada parágrafo..."
 

Chovia lá fora. 
Gotas miúdas escorrem na vidraça da janela.Parecem lágrimas.

— A vida é uma janela escancarada para o mundo, uma grande tela pintada com estilo e arte.

— Poético, mas a hora avança. Precisamos encerrar a astivdades de enxugamento da obra. Dez anos!... Até quando terei paciência de enxugar pedra?
— Se não é benfazeja para tua alma, encerremos por hoje  esta jornada.
— Onde acontecerá a próxima tertúlia?
— No sítio de Alice.
— Passo amanhã às 17:00h.
— Até amanhã.

O sítio reconstruía em Ravenala  a imagem das tardes de domingo, na Quinta da Boa Vista, algumas vezes na companhia de Ramayana e Morgana ou com outros colegas de sala.
 — Robert   vai? Perguntava Jeremias.
— Talvez!...
— Podes convidar também o José Américo, se quiseres.

O amanhã já era hoje.

 Ravenala abortou as lembranças da Quinta da Boa Vista e aterrissou no sítio. Olhou uma gigantesca mangueira carregada de frutos e disse com doçura:

—Lindo!
— Obrigado. Eu também te acho linda.
— Não estou falando de ti, Bobinho! Falo delas...
— As mangas são de agradável sabor aos olhos.
— As mangas são lindas, mas estou falando do casal de maracanãs trocando carinhos no galho.
— Parece que se beijam, enquanto catam piolhos, ou catam piolhos, enquanto se beijam.
— Não estão catando piolho, bobinho! 

 Robert aproximou-se. E por impulso beijou-a meio sem jeito, meio fora de prumo. Ravenala tremeu. Suou frio.   
Desajeitado, ele  disse alguma coisa sem nexo: 

— Viste A Lagoa Azul? 

Ela  teve vontade de dizer que viu estrelas e um raio de fogo percorrer seu corpo. Mas, aprendera que se deve responder apenas o que foi perguntado. 

— A Lagoa Azul, é uma linda história que se passa numa ilha. Às vezes viajo na imaginação, e me sinto numa ilha deserta... 
— Contenta-se em fcar vendo o pôr do sol todo dia? É Monótono demais!
— Nem tanto monótono, se virmos o raio verde.
— Isso é lenda.
— Gosto de viajar nos livros de ficção. Eles descrevem uma realidade que ainda não aconteceu. Júlio Verne, por exemplo,  apresenta um submarino, quando ainda não existia nenhuma embarcação que viajasse abaixo do espelho das águas.
— Não é preciso estar numa ilha para ver o raio verde. Basta um final de tarde na praia.
— Hoje não há mais tarde.  São vinte horas.
— Isso significa que é hora de voltarmos.
— Sim, mas antes quero contar um segredo.
— Não somos mais crianças. Não vais falar sobre o quarto secreto, vai?
— É outra coisa.  Vi teu nome escrito em uma página amarelada no baú de meu pai.
— Leste?
— As linhas introdutórias, apontavam para um pedido de desculpas.
— Não leste tudo? 
— Meu pai chegou trazendo a aquarela de Toquinho e uma folha de papel em branco, dizendo ser o túnel do tempo... Eu tinha mais interesse de saber o que estava escrito naquele  papel que acabara de encontrar no baú dele. Fiquei curiosa.
 —Eu também

Teve vontade de contar as objeções sobre o namoro dos dois que o pai dela  insinuava haver descoberto.  Ravenala  justificara-se dizendo ao pai que escrevia um livro a duas mãos com Robert.

— Livro? Afinal, qual o foco?
Moral católica tem leque restrito. Já os livros que oferecem solução para todos os problemas, vendem muito. Mas mentem. São verdadeiros apenas quando ensinam a ganhar dinheiro fácil. Realmente, se  alcançarem boa vendagem, o autor, ganha muito dinheiro. 


A voz narrativa calou-se extasiada. Ravenala deslizou o mouse sobre o último capítulo com a intenção de excluir algumas páginas. Não conferiu o que selecionara e clicou em recortar. Salvou, e desligou a máquina. E  ao reabrir o arquivo, no dia seguinte, seu livro tinha sumido, das 256 páginas, restavam apenas 23 palavras. 



Chorou.
Estava tão focada no que perdeu, que se esquecera do que tinha  ganhado. Ou não. Seria  Robert  seu irmão? Bem neste caso, teria ganhado um irmão. Passou a mão nos olhos, limpou as lágrimas, mas não conseguiu estancar o choro. Acabara de perder dez anos de trabalho. 

 






Adalberto Lima




Enviado por Adalberto Lima em 04/05/2018

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