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Poesias-->Teatro Cigano -- 08/07/2001 - 14:46 (ANTONIO ELSON RODRIGUES SIQUEIRA) |
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Teatro Cigano
I
Abrem-se as cortinas
No teatro do desconhecido
Platéia não há
Para a encenação
Do amor
Os assentos vazios
Se permitem ocupar
Pela só Solidão
Oh alguém que lamente
Alguém que grite
Alguém que chore
E que saiba sorrir
Alguém
Alguém que presencie
A tomada do palco
Pelo ator e pela atriz
Corações senhores de si
Sonhadores cheios de lua
Inverno e Primavera
Guiados pelo destino
Frio e Flor não se tocam
São vozes ainda sem rosto
Anseios que se elevam
Temor e palpitação
Fragor e arrebentação
Sedução
Quimera
“Olha-me nos olhos
Que serei teu rei
Teu bobo incorrigível
Teu honrado cavaleiro
Teu poeta e cantor
Viverei os teus dias
Farei meu teu penar
Professarei a felicidade
Que é estar junto a ti
Que é ser tua saudade
Se a distância existir
Mas não sou orvalho sequer
Nem brisa que te alcance
Nem luz pro teu jardim
Sou só um pobre sonhador
E sei que em contentamento
Pra sempre viveria
Se me concedesses
A suprema alegria
De repousares os teus
Nos meus olhos tristes”
O eco da fria estação
Rompeu o silêncio
Enquanto chovia
O cenário é melancólico
Para tão ardentes dizeres
Mas resta a esperança
De que bem sobrevivam
Até que a aurora traga
Embebida em perfumes
A doce estação das flores
A fala seguinte
Permanece um mistério
Que somente à Primavera
É dado conhecer
Que de todo se revele
O mais nobre bem-querer
Com suas quatro pétalas
Amor e vida
Razão e viver
II
A orquestra do tempo
Em perfeita harmonia
Saúda a chegada
Da estação florida
Foi-se a candura invernal
E com ela os gélidos ventos
Eis que uma borboleta
Recém saída do casulo
Em suprema inquietação
Denuncia a existência
De alguma coisa no ar
Um sussurro talvez
Um declamar amoroso
Que mal se consegue ouvir
Era a voz viajante do Inverno
A preencher o que havia de vazio
No seio da novel estação
Ao invés de se dissiparem
Mais e mais aquelas palavras
Se tornavam presentes
Até que por completo
Se fizeram ouvir
Quiseram então saber
Bichos plantas e nuvens
O que teria a dizer
A gentil musa Primavera
“Tuas palavras me comovem deveras
Meu querido cantor primeiro
Deixam-me assim sem reação
Sem saber bem o que dizer
Ou o que fazer para retribuir-te
A benfazeja e intensa alegria
Com a qual me agraciaste
Então fecha os olhos e pensa em mim
Caminhando para junto de ti
Levando ao aconchego das mãos
Uma linda flor carmesim
Do meu seio extraída
Cheia de vida e ternura
Como alhures não há
E permita que eu a plante
Em seu bondoso coração
Porque se dizes que sou
Do teu viver a razão
És tu da minha vida
A revelação do amor
E se eu não estiver ao teu lado
Quando te sentires triste
Ou do mundo esquecido
Bastará a ti que olhes
Esta flor que agora carregas
Viva em teu coração
Para que a minha lembrança
Possa enfim consolar-te
E que seja este o meu gesto
De mais sincera gratidão
Porque ver-te ainda não posso
Que é imenso e profundo
O vale que nos separa
Ai se tu fosses um miserável poeta
Decerto conceber não poderia
Esse inefável acontecimento
Essa esplendorosa magia
Então rogo não mais faças
Pouco caso da tua nobre arte
Com falas de pouca expressão
Mas não digas de qualquer jeito
Não quero dos teus lábios ouvir
Menos do que uma promessa
E quando te recolheres ao sono
Não te furtes jamais em sonhar
Os mais lindos sonhos comigo”
O espetáculo ainda não terminou
Mas não se conteve a Solidão
E retirou-se da platéia
No momento mesmo em que saía
Viu que com as mãos entrelaçadas
Chegavam o distinto Cavaleiro Amor
E sua encantadora Senhora Alegria
III
Em presença do Amor e da Alegria
Algo de encanto aconteceu
Na encenação que se seguia
Em alva luz o Inverno se desfez
Enquanto a doce e gentil Primavera
Transformava-se em cores mil
Cor e luz se uniram no espaço
Com espetaculares movimentos
Executados em perfeita harmonia
Uma tela breve e fugidia se perfez
A resguardar tão magistral pintura
Como conceber pintor nenhum poderia
Ante o querer da fascinada Alegria
Ergueu-se o Amor de seu assento
E principiou a tocar seu violino
Um coral de anjos o acompanhou
E a eles veio logo se juntar
A eterna soprano Fantasia
Assomaram desse cenário celestial
Promessas de sempre amar declamadas
Juras de amor verdadeiro proferidas
Algo de mágico e belo restou no palco
Ao fim dessa jamais vista comunhão
Entre luzes invernais e cores primaveris
De um lado a alma de um Poeta
Do outro a alma de uma Cigana
De seus antigos corpos esquecidos
Ambos ostentam linda e radiante
A mesma rubra flor junto ao peito
E seguem em busca da mesma vida
Almas peregrinas em busca do mesmo amor
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