Usina de Letras
Usina de Letras
163 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 

Artigos ( 62228 )

Cartas ( 21334)

Contos (13263)

Cordel (10450)

Cronicas (22536)

Discursos (3238)

Ensaios - (10364)

Erótico (13569)

Frases (50622)

Humor (20031)

Infantil (5433)

Infanto Juvenil (4767)

Letras de Música (5465)

Peça de Teatro (1376)

Poesias (140803)

Redação (3305)

Roteiro de Filme ou Novela (1064)

Teses / Monologos (2435)

Textos Jurídicos (1960)

Textos Religiosos/Sermões (6190)

LEGENDAS

( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )

( ! )- Texto com Comentários

 

Nota Legal

Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Cronicas-->Sou uma sogra -- 20/07/2008 - 01:30 (Marcia Graça Graminhani) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
De repente, lá estava eu, de braços dados com o meu ex, obedecendo às coordenadas do fotógrafo: "Agora, os noivos com os pais da noiva" --, anunciou ele, inclinando o torso para frente, elevando o traseiro e nos apontando a poderosa objetiva. E lá fomos nós, pedaços de uma história do passado, alinhavados às pressas, sorrir para a posteridade.

A sessão de fotos se seguiu à minha ativa participação na cerimónia. Ninguém me disse que isso iria acontecer. Roubaram-me, portanto, os meses de antecipação e frio na barriga, o desespero para a escolha da roupa e os tortuosos pensamentos com o trilhão de acidentes que poderiam acontecer comigo durante o evento. E se eu tropeçar? E se a minha roupa for igual à da mãe do noivo? E se o meu topete ficar fora do lugar e estragar todas as fotos? Pega de surpresa, só me restou ficar ali, aparvalhada, entre estranhos, procurando compreender as orientações da jovem senhora, coordenadora do ritual, cujos gestos amplos e firmeza contrastavam com a silhueta franzina. Inseparável de uma prancheta, ela se inclinava para a fila de padrinhos e sussurrava frases, como se segredo de Estado fossem. Os ouvintes faziam assim com a cabeça, assentindo e sinalizando o entendimento. Fechando o cortejo, vínhamos eu e o meu par, o pai do noivo. Disse-nos ela que deveríamos entrar assim e assado e que, enquanto o pai do noivo iria para um lado do altar, eu deveria dirigir-me ao lado oposto, junto dos padrinhos da noiva. "Mas eu nem sei quem são", repliquei, com a voz em falsete, pelo menos uma oitava acima do que o bom-tom aconselharia. Todos os casais da fila se viraram para me olhar, inclusive o meu filho. Ah! sim! lembrei! Ele era um dos padrinhos da noiva! Senti alívio por saber a quem seguir, e a certeza me foi dada pela companheira dele: "A senhora segue a gente", disse-me ela, baixinho, com a condescendência de quem trata com uma criança.

Tudo cronometrado e devidamente anotado nos papéis da prancheta e a maestrina do evento pede para que andemos, dando oficialmente início à cerimónia. De braços dados com o pai do noivo, segui a fila, escada abaixo. E aquela era uma escada que convidava ao tombo: alta, irregular, em curva e feita com materiais diferentes. Eu a enfrentei bravamente, de salto alto - item de vestuário que uso bissextamente -, assustada e em plena crise de labirintite. Ao sinal da coordenadora, parei imediatamente no meio do último degrau, e o meu par deu mais um passo, parando no piso do salão. Então, ficamos assim: eu cá e ele lá. Com os braços dados, eu me via obrigada a entortar o corpo e, com o braço livre, afastava do meu topete uma prega de cortina que emoldurava o final da escada. Na minha frente, algo em torno de 150 pares de olhos e alguns fotógrafos. Eu debatia freneticamente com os meus botões: desobedeço à coordenadora e desço um degrau, ou puxo o pai do noivo para cima? Desço ou puxo? Desço ou puxo? Nisso, vem o sinal para entrarmos. Desci rapidamente, abri o meu melhor sorriso e segui diretamente para o altar formado por flores e folhas sobre uma passadeira solta. Solta? Ai! Seria agora a hora do tombo? Cheguei ao meu lugar com o sorriso congelado na cara e as pernas bambas, e passei o resto da cerimónia desviando de um enfeite pendurado nuns galhos, bem acima da minha cabeça. Realmente, se tratava de um compló cósmico contra o meu topete.

Se você acha que isto já estaria de bom tamanho, sente-se para ouvir mais esta: conheci o noivo - o meu futuro genro -- ali mesmo, no pé da tal escada, coisa de uma hora antes. Nós nos apresentamos, apertamos as mãos, trocamos sorrisos, devemos ter falado qualquer coisa banal, balançamos a cabeça em sinal de concordància com um sei-lá-o-quê e nos separamos com uma desculpa qualquer. Estávamos flagrantemente constrangidos com aquilo tudo.

E foi assim que debutei como sogra. Tenho repetido mentalmente o nome do meu genro várias vezes, para gravá-lo. Gostei do rapaz e pensei em mandar a ele um cartão, convidando-o e à esposa para virem a Brasília, em minha casa. Ou será mais elegante esperar pelo convite deles para o batizado do filho que um dia terão? Devo admitir: etiqueta nunca foi o meu forte.
Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui