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Cronicas-->Acho que vi um gatinho -- 12/09/2008 - 22:19 (Marcia Graça Graminhani) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Tarde da noite e toca o interfone. Sempre fico apreensiva, imaginando que o porteiro do prédio vai dizer que um dos meus gatos caiu da janela. Não importa que elas tenham tela de proteção. Eu sempre acho que um deles vai despencar, assim mesmo. Do outro lado da linha, a voz de uma vizinha com quem não tenho qualquer intimidade para conversas àquelas horas. "Tem um gatinho aqui embaixo e eu lembrei de você", disse ela, sem rodeios. Muito bem, pensei de imediato, quem seria o sujeito à-toa que estava desovando gatos por aqui? Esse seria o terceiro resgate em menos de quinze dias, o que significa dizer que a minha vida estava ainda mais complicada nestas duas últimas semanas.

Tirei o pijama, peguei a caixa-transporte, coloquei nela um punhado de ração e desci. Mal humorada. Sem prática no quesito resgate, o novo porteiro deixou de segurar o animal enquanto eu chegava. Pelo contrário. Ele falava alto, apontava para algo que eu não enxergava e andava para o lado do que deveria ser o apavorado animal, gesticulando. Esse comportamento afugentaria até a mim. Pedi um tanto ríspida para que ele voltasse ao seu posto de trabalho e iniciei a minha cruzada. Irritada. A última coisa que eu precisava naquelas alturas do dia, da semana, do mês, do semestre, seria passar uma noite atrás de um animal arredio.

A tal vizinha escafedeu-se. Claro. É sempre assim. Tem gente que acha que o mais difícil é encontrar um animal abandonado e apontá-lo para o incauto protetor mais próximo. Ela já deveria estar de volta ao aconchego da cama quentinha enquanto eu me lascava na noite gelada, pulando pelos canteiros alheios, rezando para pelo menos não pisar em nenhum montinho de dejeto de cachorro, que por ali existe às centenas.

Cadê o gato? Disseram que era branco, de `rabão´, mas eu ainda não o tinha avistado, o que tornava ainda mais ridícula a minha dança entre os arbustos, fazendo `nstch, nstch, nstch´ para tudo que fosse mais claro que o cenário. Assim é que eu já havia cuidadosamente chamado um vaso, um papel amassado e o pé de uma pequena árvore. "Preciso ficar menos no micro", murmurei para mim, desolada com a deterioração da minha visão.

Aonde vou colocar mais um gato? Quem conhece essa espécie sabe muito bem o samba que é introduzir um novo indivíduo em grupo já formado. A meia dúzia que considero minha vive solta pelo apartamento. Na realidade, eles quebram o meu galho e permitem que eu viva lá, com eles. No quartinho da empregada está um filhotão amarelo, resgatado há quatro dias, à espera de uma vaga na gaiola do Pet Shop, para doação. Esse branco de agora deverá ficar no meu quarto. Fazer o quê? Anotei mentalmente a necessidade de comprar uma gaiola para garantir uma vitrine para os meus `resgatinhos´ sempre que for preciso. Os pensamentos rodopiavam em minha mente exausta, enquanto eu chamava "chanim, chanim" ao léu, na escuridão fria da noite de outono.

Finalmente, avistei o bichano. Era um adulto, o que complicaria bastante a doação. Fui ao seu encontro, bem devagar, enquanto ele se escondia num jardim recém regado. Já conformada com o fato de que além do mais eu me molharia, vi o empregado daquele condomínio vir ao meu encontro, com a mangueira na mão. "Ai", disse para mim mesma, "ele vai espantar o gato!". Apressei-me em pular a cerca baixa e me antecipar ao desastre. "Acho que esse gato é o do 412", disse ele, emendando "eu disse para a dona ir falar com a senhora, no seu prédio, porque a senhora sempre pega os gatos..." Com ambos os pés na grama molhada, parei e olhei para ele, incrédula. Quem era aquele cara e como é possível que até ele soubesse desta minha sina? Não me admira que a minha vida fosse cheia de gatos. Tenho um exército, cidade afora, atento aos abandonados, dia e noite. Mesmo assim, senti vontade de beijar-lhe as bochechas. Então, afinal de contas, eu não precisaria dividir o meu quarto com um animal estranho! Na mesma hora ele ligou para a moradora, que se materializou no jardim. Agarrada a um ensopado e atónito quadrúpede, uma feliz senhorinha me agradecia enfaticamente por ter encontrado o seu querido. Voltei para o meu apartamento com a caixa-transporte vazia e o coração em paz, apesar de saber que eu havia acabado de adicionar mais uma criatura à legião de humanos que encontra gatos e os traz para mim.
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