Eu, presente, aluna do colégio das almas, trago sempre comigo meu caderno onde desenho, faço e anoto coisas de poetas que são poetas e de poetas que não acreditam nisso. Sentada no último banco do ônibus escolar, sem que ninguém veja, passo a borracha no céu e a noite fica banguela. Sem que ninguém ouça, atiro as estrelas pela janela junto com o papel de bombom. Fico olhando para aquelas gengivas. Será que nascerão outras? Os sapatos novos apertam os pés. Não tem ninguém aqui atrás. O banco é só pra mim, minha saia plissada, meias três quartos, blusa branca e cinto embrulhando o pacote. Ainda não uso sutiã. Tenho tetas de Dior e uma geografia incipiente. A menina no banco da frente está com caspa e esse ônibus não passa pela rua da praia. O motorista vai me deixar na porta de casa porque em algum lugar ele tem de me deixar. Na porta de casa não há ninguém à minha espera, e, se eu subir pelas escadas, tampouco encontrarei alguém no caminho. Por isso pego o elevador. No elevador há vizinhos entre um andar e outro, vizinhos que não sabem que vivo só porque meus pais não existem ou não vão voltar. Meus pais me deixaram aqui, porque em algum lugar eles tinham de me deixar.