Lucy Nada em janeiro de 2006, ao final do inventário dos bens deixados por tia Cris, adquiriu o mais famoso bar de Tupinambicas das Linhas. O Eflúvios foi reformado e seu estoque ampliado. A nova proprietária acrescentou mesas dentro e fora do boteco onde os clientes poderiam acomodar-se durante suas horas de lazer.
Van Grogue, Edbar B.I. Túrico, Edgar D. Nal, Alan Bança e os demais integrantes da turma, estranharam a princípio, aquela nova reformulação dada ao ambiente.
Durante uma tarde cálida de abril em que todos se reuniram para mais uma sessão de fluidificação das durezas da vida, com doses e doses de assovio-de-cobra, entrou afobado no recinto Ernesto Mail. Ele disse sem nenhuma cerimônia: "Jarbas está fazendo greve de fome!"
Quase ninguém lhe deu muita atenção. O governo do prefeito andava abalado pelas incoerências, inverdades e fatos ocultos. Os crimes cometidos durante sua administração eram revelados pela imprensa cotidiana, e chocavam a opinião pública.
E. Mail prosseguiu com o aranzel usando mais ênfase: "Disseram que ele criou empresas utilizando documentos de pessoas internadas, desaparecidas ou mortas. Essas firmas participavam e ganhavam algumas licitações da prefeitura. Somas imensas eram pagas a essas ONGs que davam então a grana toda para o Jarbas. O prefeito dizia ao fisco que a origem da bufunfa era doação para campanha política. Falam que a quantia foi imensa; mais de R$ 164 milhões e que o peso dessa montanha de notas era de três toneladas."
Edgar D. Nal engoliu um trago enorme da capote-de-pobre, sentiu o eriçar dos pêlos dos braços, abaixou a cabeça, e erguendo o olhar para o novidadeiro, soltou um arroto sonoro.
Van Grogue, que não era pirilampo mas emitia luz própria, considerado por muitos como o melhor filão do saco, disse: "Meu computador velho, não é intestino preguiçoso, mas também trava sempre"
E. Mail pasmo não conseguiu entender o nexo causal entre o que ele dizia e a resposta dada pelo Van. Então Grogue disse: "Sabe seu Mail, nós não estamos preocupados com isso não. Aqui nós só quer tomar nossos gole. Seu assunto é muito chato."
Lucy Nada enxugando o balcão com um pano tosco entrou na conversa: "Depois que começaram a publicar essas coisas da prefeitura o doutor Jarbas virou uma anta energúmena. Minha vizinha tem uma filha que trabalha no setor de cobrança dos impostos. Ela disse que o prefeito já confunde barroco com barraco, marceneiro com mercenário e que faz alguns dias que não toma banho; que virou um viveiro ambulante de bactérias. Ela conta que o Jarbas arrumou uma foto do promotor de justiça que denunciou o crime e que passa dias e dias xingando o retrato. Falam que parece criança animista."
Edgar D. Nal zonzo perguntou: "O que é animismo?" Ernesto Mail esperto explicou: "Alguns primitivos crêem que objetos inanimados têm alma; que coisas de uma pessoa têm a alma daquela pessoa, entende?". Lucy então concluiu: "Ah então é por isso que flagraram o prefeito falando também com uma cueca que trazia impressa, uma figura de balança e espada, na etiqueta. Era a cueca do promotor!"
De repente quebrando o tom, o ritmo e o tema da conversa Alan Bança atravessou: "Corinthians, paixão!"
Lucy Nada ao presenciar a manifestação disse: "Ih, olha como já está o outro ai. Não me diga que você também confunde algodão com algo dão. É ruim heim ô mano?" Rápido Alam Bança respondeu com malvadeza: "As barangas que me desculpem, mas beleza é fundamental!"
Van Grogue continuando a justificativa da alienação do grupo mandou ver: "Sabe seu Ernesto, o senhor não nos leve a mal, mas antigamente não se podia falar e nem escrever coisa alguma contra os governos equivocados. Hoje pode. Mas também não adianta nada. É por estas e outras razões que nós não ligamos pra isso que está acontecendo. Não faz diferença. Morou?"
Logo em seguida Grogue pagando sua conta convidou Alam Bança: "Vamos embora ô sapo cabeçudo?"
