O título vai provocar no leitor "jovem há mais tempo" um pouco de nostalgia. Os aparelhos de som três-em-um eram uma inovação, uma grande novidade, uma quase revolução em 1980. Era inacreditável que uma só super-vitrola tocasse os elepês do Raul Seixas, tocasse as fitas do Raul Seixas e sintonizasse as músicas do Raul Seixas nas recém inauguradas rádios em frequência modulada. E ainda era possível gravar em cassetes as melodias preferidas e ouvi-las no rádio-gravador durante o banho de sábado, sempre mais demorado. Quanta novidade de uma vez!
É bom mesmo sentir alguma saudade. A nostalgia, aliás, tem sido nossa companheira desde o início de 2009. As lebres que quero levantar hoje podem confundir um paciente que tenha entrado em coma há vinte e poucos anos e que agora acorde. Parece até aquele quadro do também saudoso programa Viva o Gordo!: "me tira o tubo!" Mas essa era a época em que o Jó Soares era feliz como humorista e não fingia ser entrevistador. Ah! Bons tempos. Por falar em tempo, embora pareça, não estamos na década de 1990. Mas que parece, parece. Três-em-um:
Toca-discos-riscados: Olha aí o Sarney presidente do Senado (nem sei por que escrevo Senado assim, com maiúscula...). A maior novidade de 1995 ocupou as manchetes dos principais periódicos das últimas semanas. É a terceira vez que essa novidade é nova, tudo bem. Agora a nostalgia vai ao máximo, porque a gente fica a lembrar da época em que a política partidária era mais ética, menos fisiológica, ao menos mais discreta. Ah! Desculpe-me. Essa época nunca existiu. Confundi nostalgia com ficção. Sarneyzão, com o mesmo bigodão que eu caricaturei em 1986, durante o plano Cruzado, ao lado do Funaro e do Sayad, quando desenhava na página 2 do extinto semanário Enfim-Evidência (é, Zé Mário...é, Manuel... vocês já foram sócios!). Lá está ele, conservado em água de azeitona, mais saudável que a filha dele, o que não é muito difícil. Cá estamos nós, atónitos, vendo Sarney eleito, com Renan Calheiros ao lado. O disco riscado da política continua tocando o mesmo trecho da mesma música da mesma bolacha. O desafino total, porém, estava por vir...
Fita-enrolada-no-toca-fitas: A eleição se Sarney abriu caminho para a volta dele, o vilão da minha juventude, aquele que me fez vestir preto e sair em passeatas cantando marchinhas bem-humoradas que pediam o impeachment dele. É ele mesmo, o novo presidente da comissão de infraestrutura do Senado, o amigo do PC: Fernando Collor de Mello. Não, não, não. Não estamos de volta ao início da década de 1990, a caça aos "maracujás" não foi re-estabelecida, mas o Collor está aí metendo os dedos nas questões de infraestrutura de todo o Brasil. Não tenho, confesso, a menor ideia do que representa ser presidente da COMISSÃO DE INFRAESTRUTURA. Não sei que poder ele vai ter, de fato. Terá poder, basta saber isso. E ainda precisamos ler esta manchete: Collor é eleito presidente. Estamos em 2009? Sarney presidente. Collor presidente. Enrolou a fita....
Rádio-fora-de-sintonia: Na última quarta, para esquecer a dor de cabeça que a volta de dois fantasmas do meu passado à presidência provocou, fui assistir ao jogo do Timão contra o Itumbiara, pela Copa do Brasil, lá no bar da Cláudia e do André. Foi o dia da estreia do Fenómemo. O quê? Sintoniza esse rádio direito! Como assim... "estreia"? É, lá estava ele: ansioso, motivado e... ainda gordo. Estamos em 2009? Tem certeza?
O três-em-um que eu tenho ainda funciona, lá no fundo de casa. De vez em quando, ouço uns elepês do Chico Buarque e fico surpreso com a capacidade que aquele bichinho tem de resistir e continuar tocando a vida. No final, podemos não gostar, podemos torcer a cara, torcer o nariz, torcer contra. Podemos até mostrar uma indignação pueril no jornal, mas não podemos negar: todo mundo tem o direito de tentar outra vez. Quando isso se aplica a um craque como o Rooooonaaaaldooo!, fico feliz, vibro com, dou meu apoio que não significa nada. Agora, Sarney mais forte que nunca, Collor dando a volta por cima? Me tira o tubo!! |
